Acórdão nº 1130/14.7TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ARAÚJO
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

PROC. N.º 1130/14.7TVLSB.L1.S1 REL. 17[1] * ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO Nesta acção declarativa de condenação que AA propõe contra BB, pretende o Autor fazer valer contra esta o direito a uma indemnização, que quantifica em 62.000,01 €, acrescida de juros, invocando que a Ré, como patrona oficiosa do demandante, violou ilícita e culposamente os deveres deontológicos e profissionais, ocasionando a improcedência da acção que aquele instaurara na 8ª Vara Cível, sob o n.º 561/11.9TVLSB.

Alega o Autor que a Ré nunca o contactou nem se deixou contactar, o que motivou pedido de substituição do patrono junto da Ordem dos Advogados, pedido esse que não foi aceite porquanto a Ordem lhe indicação de que o processo estava a ser devidamente acompanhado.

O Autor, após a realização da audiência prévia, veio requerer a notificação do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados para juntar aos autos “cópia dos esclarecimentos/exposições apresentadas pela Ré no âmbito do processo de nomeação de patrono n.º 13619/2010” - cfr. fls. 103.

Ordenada essa notificação pelo despacho de fls. 110, e após insistência para cumprimento do notificado, o Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados recusou a entrega da pretendida cópia, informando que os elementos solicitados se encontram abrangidos pelo sigilo profissional - cfr. fls. 110, 115, 130 e 131.

Insistiu o Autor pela apresentação dessa documentação através do requerimento de fls. 135/136.

O Mmº Juiz titular dos autos, antes de prosseguir o incidente visando o levantamento do sigilo profissional, determinou a notificação da Ré para informar se estaria disponível para solicitar ao Presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados o levantamento do sigilo profissional, tendo a mesma respondido negativamente – cfr. fls. 151 /152 e 156.

Os autos subiram à Relação de Lisboa a fim de ser apreciado o levantamento do sigilo profissional, no seguimento do despacho de fls. 187 a 191.

A Relação de Lisboa, por acórdão de 26.04.2017, decidiu ser ilegítima a recusa da Ordem dos Advogados, determinando que esta dê cumprimento à solicitação do tribunal, remetendo “cópia dos esclarecimentos/exposições apresentadas pela Ré no âmbito do processo de nomeação de patrono n.º 13619/2010”, com referência aos despachos do Conselho Distrital datados de 05.12.2012, 06.02.2013, 24.04.2013 e 11.09.2013.

A Ordem dos Advogados veio interpor recurso de revista deste acórdão, concluindo do seguinte modo: A) Mal andou a decisão sob censura ao considerar que os elementos em apreço não se encontram abrangidos pelo sigilo profissional do Advogado; B) Com efeito, tal decisão só pode partir de um pré-conceito errado acerca da essencialidade do sigilo para o exercício da Advocacia e para o correcto funcionamento do sistema de Administração da Justiça gizado pela nossa ordem jurídico-constitucional; C) Assim, ao considerar que entre o Advogado e a Ordem (o que inclui, naturalmente, os Advogados que integram os órgãos pelos quais se manifesta a vontade da pessoa coletiva) não existe segredo, que o procedimento de escusa ou de pedido de substituição do Patrono nomeado no âmbito do apoio judiciário é um procedimento administrativo igual a qualquer outro e que as informações aí reveladas e obtidas / reveladas não estão sob a alçada do segredo, coloca, com uma incompreensível displicência, em perigo a autorregulação profissional desejada pelo legislador e o regular funcionamento do sistema de acesso ao Direito (assegurado, em grande medida pela Ordem e pelos Advogados que compõem, que confiam e dependem do sigilo profissional), revelando uma insanável contradição; D) Não está em causa a defesa do sigilo como valor absoluto, está tão-só em causa reconhecer que no caso há sigilo, que poderá ceder de acordo com as regras próprias para o efeito – questão estritamente jurídica que deve ser dilucidada por este Colendo Supremo Tribunal; E) Assim, o erro que resulta da sentença é a incorrecta qualificação jurídica da matéria em apreço (como não sigilosa), a desconsideração da natureza especial do segredo em causa, do melindre das informações, das razões pelas quais as mesmas têm de ser protegidas; F) E é também a falta de compreensão em relação à natureza especial do procedimento em causa e, sobretudo, a falta capacidade para perceber que o segredo é estabelecido como conditio sine qua non para o exercício livre e independente da Advocacia, elemento estruturante do nosso Estado de Direito, e não apenas no interesse do cidadão, do particular que é representado pelo Advogado, existem, assim, razões de interesse público para a existência do segredo, que em muito excedem os interesses particulares daquele que é patrocinado; G) A argumentação do acórdão impugnado é quase inexistente, sendo, data maxima venia, a mera remissão para a existência de um processo judicial especial de natureza urgente na jurisdição Administrativa imprestável para o caso em apreço – por ser insusceptível de desqualificar a existência de segredo e, assim, sujeição às regras do seu levantamento na sede em que nos encontramos; H) Em suma, a decisão recorrida limita-se a dizer que em sede Administrativa (Jurisdição Administrativa), e portanto, como antecâmara de uma acção impugnatória e, eventualmente, de uma acção de responsabilidade da Ordem dos Advogados, enquanto entidade pública, pelo exercício dos seus poderes, o segredo tem cedido no âmbito de um procedimento urgente e especial previsto no CPTA e, como tal, não há na jurisdição civil qualquer segredo, devendo o tema ser tratado como uma mera junção de elementos na posse de terceiros.

I) É evidente o erro, mesmo que se concorde com as decisões da jurisdição administrativa, que não é o caso. Isto porque não se pode, sem mais, equivaler aqueles processos (os seus fins e a sua tramitação) a um mero pedido de cooperação de um Tribunal numa demanda que opõe dois privados. O argumento não colhe porque não há semelhança de situações e, assim, como erra, não permite fundamentar um juízo de que inexiste segredo; J)...

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