Acórdão nº 7353/15.4T8VNG-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelJOSÉ RAINHO
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção): I - RELATÓRIO Foi oportunamente declarada (Comarca do Porto - V.N. Gaia - Inst. Central - 2ª Secção de Comércio - J2) a insolvência de AA e mulher BB (doravante denominados Insolventes), na sequência do que teve lugar a abertura do incidente de qualificação da insolvência.

O Administrador da Insolvência apresentou parecer no sentido da qualificação da insolvência como culposa, sendo afetados por essa qualificação os dois Insolventes.

Concluiu, com base nos factos que aduziu, e aqui dados por reproduzidos, que os Insolventes levaram a efeito negócios fictícios com o intuito de prejudicar os credores da insolvência.

O Ministério Público pronunciou-se igualmente no sentido de a insolvência ser qualificada como culposa, sendo afetados por essa qualificação os dois Insolventes.

Os Insolventes deduziram oposição, sustentando, com base nos factos que alegaram, e aqui dados por reproduzidos, que a insolvência devia ser qualificada como fortuita.

Seguindo o procedimento seus termos, veio, a final, a ser proferida sentença que: 1. Qualificou a insolvência como culposa; 2. Declarou afetados pela qualificação da insolvência como culposa os Insolventes AA e BB; 3. Decretou a inibição dos Insolventes para administrarem patrimónios de terceiros pelo período de sete anos; 4. Declarou a inibição dos Insolventes para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa pelo período de sete anos; 5. Determinou a perda de quaisquer créditos dos Insolventes sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente, condenando-os na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos; 6. Condenou os Insolventes a indemnizarem os credores da Insolvente no montante dos créditos não satisfeitos após o término da liquidação do ativo, até às forças do respetivo património, valor a apurar em liquidação de sentença.

Inconformados com o assim decidido, apelaram os Insolventes.

Fizeram-no sem êxito, pois que a Relação do Porto confirmou, embora com fundamentação não coincidente, a sentença recorrida.

Mantendo-se inconformados, pedem os Insolventes revista.

Da respetiva alegação extraem as seguintes conclusões: A. O recurso é interposto do douto acórdão proferida nos autos a folhas 404 e seguintes, o qual, pesem embora as modificações decretadas relativamente à sentença de 1ª Instância, decidiu manter a qualificação da insolvência como culposa.

B. Um contrato-promessa de compra e venda, ainda que com eficácia real e tradição do objecto, não se reconduz a um ato de disposição de bens; C. A tradição da coisa consubstancia uma mera detenção, como foi aqui o caso, pelo que é precária, indexada, como é evidente, à sorte do contrato promessa, pelo que essa atribuição de detenção não constitui também um ato de disposição de bens; D. A lei - artigo 186.º, n.º 2, al. d) do CIRE - quando fala em disposição quer referir a ato de alienação; E. O contrato promessa do ponto 20 do provado foi resolvido pelo Sr. A.I. em benefício da massa, pelo que os efeitos de tal resolução operam, como é sabido ex nunc, ou seja, o contrato resolvido é “destruído” e tudo de passa como se nunca tivesse existido, o que torna inconsistente dizer-se que o contrato promessa em causa implicou uma diminuição efetiva do património dos insolventes; F. Ademais, não se verifica nos autos, que a diminuição da garantia patrimonial dos credores do insolvente seja correlativa de igual diminuição provinda o acto de disposição do património deste em favor do devedor ou de terceiro, pressuposto este exigível para a aplicação da norma que sustenta a decisão do douto acórdão.

G. Conclui-se que não se verificou in casu qualquer ato de efetiva disposição de bens, exigida pelo supracitado art. 186.º, n.º 2, al.

d) do CIRE, sendo também de concluir que, objetivamente, não houve qualquer prejuízo para os credores, visto que o imóvel prometido vender se manteve no património da massa insolvente, de cuja titularidade, aliás, nunca saiu e para a qual se mostra, de resto, apreendido; H. O nº 2 do art.186º do CIRE não se aplica em caso de insolvência singular, como o dos presentes autos, sem prejuízo do previsto no nº 4 do preceito, aqui inaplicável em virtude de os insolventes não serem uma empresa, ou seja, uma organização de capital e trabalho destinada ao exercício de qualquer atividade económica, como dispõe o art. 5º do CIRE., e também não serem comerciantes, ou seja e segundo o art. 13º do Código Comercial, não são pessoas que, tendo capacidade para praticar atos de comércio, fazem deste profissão; I. Não sendo de aplicar a presunção inilidível do nº 2 do art.186º do CIRE, a qualificação da insolvência como culposa carecia da demonstração do nexo causal entre a omissão dos deveres constantes das diversas alíneas e a situação de insolvência ou o seu agravamento, o que os autos não evidenciam; J. Destarte, o douto acórdão em crise deve ser revogado, qualificando-se a insolvência como fortuita.

+ O Ministério Público aLLu papel, onde, citando jurisprudência vária, se limitou a dizer que o recurso era inadmissível.

+ Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

+ Da questão prévia da inadmissibilidade do recurso Diferentemente do que pretende o Ministério Público, não se aplica ao caso o art. 14º, nº 1 do CIRE, mas sim o regime geral dos recursos tal como constante do CPCivil. De resto, o Ministério Público terá incorrido em lapso, visto que se estriba exclusivamente em jurisprudência produzida no âmbito no processo especial de revitalização (PER), quando a verdade é que não é desse tipo de processo que estamos...

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