Acórdão nº 160/09.5YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ROCHA
Data da Resolução28 de Maio de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1 AA, Imobiliária, S.A., intentou acção declarativa, com processo comum, sob a forma ordinária, contra Transportes BB, Lda., pedindo a condenação da ré:

  1. A reconhecer o direito de propriedade da autora sobre o Casal do ....., bem como a inexistência de título legítimo que sustente a manutenção da ocupação de uma parcela dessa propriedade por si e a entregar a mesma parcela devoluta de pessoas e bens; b) A pagar à autora a indemnização que se vier a liquidar em execução de sentença pelos prejuízos sofridos por esta e pelos benefícios que a autora deixar de obter em resultado da sua recusa a entregar a dita parcela.

Alega, para tanto e em suma, que adquiriu o aludido prédio por escritura pública de compra e venda de 4 de Janeiro de 2000, ocupando a ré uma parcela do prédio sem nunca ter exibido título bastante nem demonstrado, por qualquer forma, a existência do mesmo, mantendo-se naquele contra a vontade reiteradamente expressa pela autora, que, assim, se vê impedida de dispor do local como melhor entender e, designadamente, proceder à rápida operação de reconversão urbanística projectada para o prédio.

Contestou a ré por excepção, alegando que celebrou com o Sr. CC um contrato de arrendamento relativo ao local, com a área de cerca de 1000 m2, que ocupa no prédio, tratando-se, aquele Sr. CC, da pessoa que, ao longo de várias décadas, dos anos 60 até pelo menos à década de 90, era tida pela ré e pela totalidade das pessoas que frequentavam o local como o dono do prédio.

E era o "dono" por gerir os respectivos negócios e deter parte do capital da sociedade denominada DD & Ca, Lda., que, nessa mesma propriedade, possui um estabelecimento dedicado à indústria de pedras, madeiras e outros materiais. Ou, se não era ele o dono, era a referida sociedade, passando a ré, desde 1992, a ocupar o local e a pagar renda mensal, por último, no valor de 18.560$00, de que era passado recibo, figurando no contrato, como senhoria, a DD & ca, Lda.

A ré, entretanto, investiu largos milhares de contos em obras e na adaptação do local à sua actividade e, na sequência de notificação da Repartição de Finanças, passou a entregar o valor da renda ao Estado, de tudo isto sendo conhecedora a autora.

Pede a improcedência da acção e, em via reconvencional, que seja declarado: - ser válido o contrato de arrendamento referente ao local dos autos de que a ré é titular e celebrado em 23 de Abril de 1992; - ser a falta de pagamento da renda, no montante de 18.560$00, da responsabilidade da autora.

Foi proferida sentença, que julgou a acção procedente e, consequentemente, declarou ser a autora legítima proprietária do prédio dos autos e declarou nulo ou ineficaz em relação a ela o contrato de cedência do espaço que a ré ocupa, condenando-a a entregar o mesmo à autora de imediato, livre e devoluto.

Mais condenou a ré a pagar à autora a quantia que se liquidar em incidente posterior, correspondente ao valor locativo do aludido espaço, acrescida de juros à taxa legal, desde a data da citação e até efectiva entrega do aludido espaço.

Julgou, ainda, improcedente o pedido reconvencional.

Requerida pela autora a aclaração da sentença e a sua reforma quanto a custas, foi esta deferida, consignando-se, no âmbito da primeira, que "Na fundamentação da sentença passa a valer a referência à celebração do contrato de locação tal como resulta dos pontos E) e F) dos Factos Provados.

Inconformada recorreu a ré recorreu, sem êxito, para o Tribunal da Relação de Lisboa.

Ainda irresignada, pede revista.

Concluiu a alegação do recurso pela seguinte forma: A recorrente, nas suas alegações e conclusões, cumpriu o ónus imposto pelo artigo 690º-A do CPC.

A recorrente indicou claramente a parcela ou o ponto ou pontos da matéria de facto da decisão proferida que considerou viciada por erro de julgamento e quais os meios probatórios que implicavam decisão diversa pelo Tribunal.

Mas mesmo que assim se não entenda, sempre haveria lugar ao convite ao aperfeiçoamento dos mesmas, o que não aconteceu.

Uma vez que os Venerandos Juízes assim não determinaram, mantendo a decisão do Juiz Relator, encontra-se violado o disposto no artigo 690º, nº 4, 1a parte, do CPC.

O CC agiu em nome e representação da Sociedade da família FCC como seu gerente e não como "mero comproprietário".

Estes factos foram alegados na 1a Instância, não se tratando de quaisquer factos novos.

A decisão sob censura viola a prova documental/Documento escrito/Contrato de Arrendamento junto aos autos.

Este Documento/Contrato de Arrendamento consubstancia uma verdadeira e real relação obrigacional de arrendamento entre as partes, tal como especificados nas referidas alíneas.

A CC & Companhia, Lda, era uma Sociedade familiar de todos os Herdeiros e Interessados no Casal e na Herança Indivisa.

Esta Sociedade estava sedeada no Casal, tinha ali escritório e instalações e exercia no local a sua actividade.

Impugna-se, por isso, nos termos do disposto nos art. 690° e 690º-A do CPC a inversão da prova escrita produzida constante do Documento/Contrato escrito especificado, em violação do disposto nos arts. 655° e 659°, nº 3, do CPC.

A sentença da 1a Instância e o acórdão da Relação não fazem um exame crítico e prudente à prova documental junto aos autos.

O senhorio e proprietário do imóvel "Casal do .....", tratando-se de Herança indivisa desde a morte do seu primitivo proprietário DD (Sénior), em 21.03.1958, ficou legalmente representada no local pelo cabeça-de-Casal em cada momento existente e consentido pelos demais herdeiros ao longo do tempo.

Foi assim com a viúva, EE, que exerceu essas funções desde a morte do marido até 25.07.1965, data em que faleceu, foi assim com o filho varão mais velho, DD Júnior, que exerceu aquela função desde a morte da mãe até 14.08.1968, data em que veio a falecer; e foi assim com o filho varão mais novo, CC, desde a morte do irmão até1997, data em que faleceu também.

O CC administrava a Herança (e o "Casal do ....." que a integrava) naquela qualidade de cabeça-de-casal e também na qualidade de gerente da DD& Ca., Sociedade da família (todos os Herdeiros eram sócios) e que estava instalada e a laborar no local.

Nesta dupla qualidade, CC negociou, acordou e consensualizou com o R./ Apelante a relação jurídica de arrendamento e, portanto, com plena legitimidade de Senhorio, nos termos do disposto nos artigos 2079° e 2087º do C.Civil.

Os senhores Desembargadores, no entanto, ao confirmarem a sentença da la Instância, pronunciaram-se pela ilegitimidade deste Senhorio o que viola também aqueles procedimentos legais e o disposto nos arts. 1054º a 1056° do C. C.

De igual modo, quanto ao consentimento/assentimento dos demais Herdeiros e consortes/comproprietários, o acórdão decide ao contrário do que afirmaram e declararam as próprias testemunhas da A./Recorrida e contra a prática consuetudinária, os usos e costumes duma situação que se perpetuou no tempo durante anos e anos reiterados aos olhos de toda a gente e também dos interessados que nela consentiram. Nem após a partilha, em 1993, estes Interessados denunciaram a relação contratual estabelecida e constituída com o Recorrente. E também o não fizeram em 1997, após a morte do CC.

O acórdão conformativo viola, ainda, o disposto nos artigos 1046º e seguintes do CC, quanto à administração da coisa comum, na medida em que, desde 1958, data da morte do DD (Sénior) até 1997, data da morte do DD, nenhum dos herdeiros/consortes/comproprietários contestou a administração do referido cabeça-de-casal, não o obrigou a prestar contas da sua administração nem da gerência da Sociedade que recebia as rendas e as incorporava na sua contabilidade e a eles competia e incumbia fazê-lo.

O acórdão, ao confirmar a sentença da 1a Instância interpretou "a contrário" o disposto nos artigos 342º e 799°, nº 2 do C.C., quanto ao ónus da prova aplicado ao caso dos autos. O Senhorio, que foi o mesmo que negociou, que recebeu as rendas e as contabilizou na escrita da sociedade e as fez desta, só não teve legitimidade para outorgar o documento em causa.

A própria lei refere expressamente que, em caso de dúvida, os factos devem ser constitutivos do direito (ver o nº 3 do referido art. 342° do CC) e a culpa no incumprimento deve ser apreciada nos termos aplicáveis à responsabilidade civil (nº 2 do art. 799°) e a responsabilidade do Senhorio à altura dos factos e nas circunstâncias descritas nos autos, não podem restar dúvidas, estava do lado do Senhorio, que exercia não só a administração como detinha uma posição de domínio (principio da parte mais forte).

Não é legitimamente admissível sequer que o Senhorio, CC...

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