Acórdão nº 30378/11.4T2SNT-C.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelANTÓNIO SANTOS
Data da Resolução15 de Julho de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 6ª Secção CÍVEL Do Tribunal da Relação de LISBOA 1.- Relatório A [ Banco ...,S.A,] moveu em 27/12/2011 acção executiva contra B [ José ....], C [ Carla ...] , D [ Sofia.... ] e E [ Anabela..... ] , com vista à cobrança coerciva da quantia total de 126.662,27€ [ com fundamento em títulos executivos correspondentes a mútuos concedidos em Junho de 2004 - no exercício da sua actividade creditícia - , com hipoteca e fiança, e nos montantes de € 80.000,00 e de € 20.000,00 ].

1.2. - Prosseguindo a execução a respectiva e normal tramitação legal, veio em 10/2/2021 a executada E ( porque FIADORA ), e ao abrigo do disposto no artigo 723.º, n,º 1, alínea c) do Código de Processo Civil, deduzir incidente de reclamação, de liquidação datada de 27-06-2018, para tanto aduzindo em síntese os seguintes considerandos ; i) Relacionados com a FALTA OU INSUFICIÊNCIA DO TÍTULO EXECUTIVO.

Não podendo a interpelação autónoma do fiador ter-se como realizada com a sua citação para a acção executiva, então à executada/Fiadora E não pode ser exigido pela exequente os juros de mora peticionados no requerimento executivo, nem os juros vencidos antes da citação ; ii) Vedado está à exequente outrossim exigir da executada/Fiadora E a cobrança de quantia reclamada a título de sobretaxa de mora no valor de 4%, porque aplica-se a mesmo à mora que ocorre em contratos em vigor e não, como neste caso, a contratos resolvidos e em liquidação; iii) Relativamente ao VALOR RESPEITANTE A PROCESSAMENTO DA MORA, de € 4.149,60, não é ele também devido, porque não se mostra alegado qualquer facto como causa de pedir para o efeito, nem foram apresentados documentos justificativos de tal quantia, nem decorre do título executivo, sendo que é pelo título executivo que se «determinam o fim e os limites da acção executiva», nos termos do artigo 10.º, n.º 5, do CPC; iv) AS DESPESAS EXTRAJUDICIAIS PETICIONADAS, no valor de € 376,49, respeitante ao primeiro contrato, e de €95,12, relativo ao segundo contrato, não são também devidas, desde logo porque não apresentado qualquer título executivo a elas respeitante; v) Tendo a exequente, como credor e único proponente, adquirido metade da fracção pertencente a B, pelo preço de € 16.400,00 , e ficando dispensado de depósito do preço, nos termos do artigo 815.º,n.º 1, do CPC, certo é que a referida quantia não está contemplada na liquidação de 27-06-2018, para efeitos de amortização do crédito exequendo; vi) NO ÂMBITO DE NEGOCIAÇÕES havidas entre a exequente a executada, em 2019, à exequente foi entregue a quantia de € 5.000,00, através de depósito na conta de recuperação de crédito n.º 148228514, indicada pelo exequente, a qual também não está reflectida na liquidação ; vii) Relativamente aos JUROS GARANTIDOS PELA HIPOTECA e pela exequente reclamados, e ,tendo o mesmo Exequente fixado a data da entrada em mora em 25-03-2006 e 25.08.2006 , razão porque exige os vencidos e vincendos desde 25-03-2006, certo é que o artigo 693.º do Código Civil determina no seu nº 2, que “ Tratando-se de juros, a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os relativos a três anos “, logo, verificando-se que cerca de 15 anos após o início da mora, o exequente continua a liquidar juros, numa matéria onde o limite é estabelecido de forma imperativa por razões de interesse e ordem pública, então a liquidação de juros é também nula e de nenhum efeito, nos termos dos artigos 286.º e 294.º do Código Civil ; viii) Tendo a exequente , em 26 de Junho de 2019, vendido o imóvel hipotecado para garantia do crédito a José ......, pelo preço de € 73.000,00 - e cujas duas metades lhe foram adjudicadas pelos preços de € 16.400 e de € 30.839,52 – então o valor que deve ser atendido e considerado como pago ao exequente é o recebido pela venda do imóvel hipotecado, € 73.000,00, uma vez que foi adquirido por um preço substancialmente inferior ao seu valor de mercado, o que prejudicou os fiadores na proporção do enriquecimento ilícito do credor/exequente, nos termos do artigo 334.º do Código Civil; ix) A PRESENTE RECLAMAÇÃO é tempestiva, quer porque a liquidação do crédito exequendo bem como da nota discriminativa dos honorários e despesas do Agente de Execução é um ato material, que pode ser corrigido em qualquer momento, nos termos dos artigos 613.º e 614.º do CPC, sendo que as questões suscitadas, de indagação e aplicação do direito aos factos, tais como a sobretaxa, a violação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 25 de Março de 2009, n.º 7/2009, os juros garantidos pela hipoteca, o limite máximo desta, a nulidade da liquidação de juros até efectivo e integral pagamento, e o abuso de direito, são questões de conhecimento oficioso que só deixam de poder ser apreciadas e julgadas pelo juiz do processo a partir do momento em que sobre elas tenha recaído despacho judicial que já não possa ser impugnado mediante recurso ordinário; ou seja, a questão passou a estar a coberto de caso julgado.

1.3. - Pronunciando-se sobre o requerimento/RECLAMAÇÃO identificado em 1.2. veio o tribunal a quo a proferir – em 30/4/2021 - a seguinte DECISÃO ; “ Através de requerimento dirigido aos autos em 10.02.2021, vem a executada E “deduzir incidente de reclamação, da liquidação datada de 27-06-2018”, alegando que a reclamação é tempestiva.

Porém, analisados os autos, verifica-se que, contrariamente ao que afirma, a agora requerente foi regularmente notificada da liquidação, nos termos previstos no art. 249.º do Código de Processo Civil, através de carta registada que lhe foi remetida em 27.06.2018.

O prazo de que a executada dispunha para reclamar da liquidação era de 10 dias, pelo que é manifesta a extemporaneidade da reclamação apresentada, apenas, em 10.02.2021.

Acresce que, muita da matéria alegada visa atacar a própria execução e não a liquidação, pelo que teria de ter sido deduzida em sede de oposição à execução, que também não foi deduzida no prazo de 20 dias após a citação, como se impunha.

E, ao contrário do que a executada defende, nenhuma da matéria alegada é de conhecimento oficioso.

Impõe-se por isso indeferir o requerido por manifesta extemporaneidade.

Termos em que, face ao exposto, atenta a sua manifesta extemporaneidade, indefiro a reclamação apresentada pela executada em 10.02.2021 contra a nota de liquidação.

Custas incidentais pela executada E, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC (art. 7.º, n.º 4, do Regulamento das Custas Processuais, e tabela II quedo mesmo faz parte integrante), sem prejuízo do apoio judiciário de que a executada beneficia.

Notifique.” 1.4. - Inconformada com o teor do DESPACHO identificado em 1.3., do mesmo veio [ em 20/5/2021 ] a executada E [ amparando-se nos artigos 627.º, 629.º, n.º 1, 631.º,n.º 1, 637.º, 638.º, n.º 1, 639.º , 654.º, n.º 2, e 647.º, n.º 1, ex vi artigos 852.º e 853.º, todos do Código de Processo Civil ], interpor recurso de apelação, formulando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões : 1.ª Pelo presente recurso pretende-se impugnar o despacho proferido nos autos de execução em 30.05.2021, notificado à executada com a data de elaboração de 03-05-2021, e que indeferiu o incidente de reclamação, da liquidação datada de 27-06-2018, por manifesta extemporaneidade, registado no sistema com a referência 18294562.

  1. Sendo o patrocínio judiciário obrigatório, e tendo a executada constituído mandatária em 13 de Junho de 2018, e estando a carta de notificação da liquidação datada de 27 de Junho de 2018, deveria ter sido notificada à mandatária, ao abrigo dos princípios da boa fé e da cooperação, nos termos dos artigos 7.º, 8.º e 58.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, conforme os actos com as referências 12669548 e 12715293.

  2. A omissão na liquidação das quantias recebidas pelo Exequente, o valor de ½ do imóvel hipotecado e a quantia de € 5.000,00, configura um erro de escrita ou de cálculo, na medida em que a liquidação da execução é uma operação de simples cálculo aritmético, estando, por isso, a sua rectificação sujeita ao regime previsto nos artigos 249.º do Código Civil, 146.º, 613.º e 614.º do Código de Processo Civil.

  3. O erro em causa, deverá ser corrigido, por iniciativa da parte, ou oficiosamente, “a todo o tempo”, nos termos dos artigos 7.º, 8.º, e 614.º do CPC, conforme os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 05-09-2017, processo n.º 281/16.8T8CHV-AG1.S1, e de 30-06- 2020, processo n.º 5941/17.3T8CBR.C1.S1.

  4. Pretendendo o exequente aproveitar-se de tal erro, invocando a falta de reclamação oportuna, deve o juiz ordenar a rectificação, ao abrigo dos “grandes princípios enformadores do anterior CPC, como é o caso do processo equitativo, do direito à tutela judicial efectiva, da boa-fé processual, da adequação formal e da prevalência do fundo sobre a forma”, conforme o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 03-06-2015, processo n.º 3937/09.8TTLSB.L1.S1.

  5. Além disso, se a executada paga a dívida exequenda, total ou parcialmente, mas o pagamento não é considerado na liquidação do julgado, o exequente que invoca a falta de reclamação oportuna para fazer suas as quantias recebidas, age com manifesto abuso de direito, in casu, nas modalidades de venire contra factum proprium por violação do princípio da confiança, e na modalidade do desequilíbrio, nos termos do artigo 334.º do Código Civil.

  6. Acresce ainda que, a executada não foi notificada das certidões onde está registado o valor patrimonial tributário do imóvel, fixado em € 72.563,57, e cujo ½ indiviso foi adquirido pelo exequente pelo preço de € 16.400,00, contra o disposto no artigo 812.º, n.º 3, do CPC, o que pode determinar a nulidade da liquidação, nos termos do artigo 195.º, n.º 3, do CPC, consoante as referência 99236713 e 7632783.

  7. Tratando-se de juros, a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os relativos a três anos, por força do disposto nos artigo 693.º, n.º 2, do Código Civil, cfr., entre muitos, os...

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