Acórdão nº 08P589 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelARMÉNIO SOTTOMAYOR
Data da Resolução08 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

Pelo tribunal colectivo do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Espinho, apos acusação do Ministério Público, foram julgados, como co-autores de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelo arts. 21º nº1 e 24º als. b) e i) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às Tabelas I-A e I-B, anexas ao referido diploma, entre outros, AA, BB, CC e DD. E foram condenados, AA e BB como autores de um crime de tráfico de estupefacientes agravado p. e p. pelos artigos 21º nº1 e 24º b) e i) do Dec.Lei 15/93 de 22/1, nas penas de oito anos e seis meses de prisão e de oito anos de prisão, respectivamente; CC, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes agravado p. e p. pelos artigos 21º nº1 e 24º b) do Dec.Lei 15/93 de 22/1, na pena de seis anos de prisão e DD, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21º nº1 do Dec.Lei 15/93 de 22/1, na pena de quatro anos de prisão.

Inconformados, estes arguidos recorreram, de facto e de direito para o Tribunal da Relação do Porto, tendo suscitado as seguintes questões: - AA: impugnação de diversos pontos da matéria de facto; nulidade do acórdão por falta de exame crítico da prova; existência dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, alíneas a), b) e c), do C. P. Penal; violação do princípio "in dubio pro reo"; proibição de prova relativamente às escutas telefónicas realizadas no inquérito; qualificação jurídica dos factos, como integradores de um crime de tráfico de menor gravidade p. e p. pelo artigo 25º, do Dec. Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro; - BB: medida da pena; - CC: nulidade do acórdão, por força do disposto nos artigos 358º e 379º, nº 1, alínea b), do C. P. Penal; insuficiência da matéria de facto, por falta de relatório social; insuficiência da matéria de facto, por falta de investigação de certos factos relevantes; impugnação de pontos da matéria de facto; aplicação do regime especial do Dec Lei nº 401/82, com a consequente redução da pena, que deve ser suspensa na sua execução.

- DD: nulidade do acórdão, nos termos do disposto no artigo 379º, nº 1, alínea c), do C. P. Penal; existência dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, alíneas a) e c), do C. P. Penal; qualificação jurídica dos factos como integradores dos crimes do art. 25º, ou art. 26º, do Decreto-Lei n.º 15/93 ou mantendo-se a condenação nos termos do art. 21º, do mesmo diploma, com suspensão da execução da pena.

A Relação julgou todos estes recursos improcedentes.

Irresignados, recorrem, agora, ao Supremo Tribunal de Justiça.

A recorrente AA suscita as seguintes questões: - omissão de pronúncia da Relação sobre a questão da agravação do crime nos termos das als. b) e i) do Decreto-Lei n.º 15/93; - não verificação da agravante da als. b) do art. 24º - distribuição por grande número de pessoas; - falta de preenchimento da agravante da al. i) do art. 24º - colaboração de menor; - atenuação especial da pena; - violação do princípio da proporcionalidade na fixação do quantum da pena, a qual deve aproximar-se do mínimo da moldura abstracta do art. 21º do Decreto-Lei n.º 15/93.

O recorrente BB pugna por uma diminuição da pena de prisão, invocando o efeito atenuativo da confissão, a colaboração prestada para a descoberta da verdade, o arrependimento, as condições pessoais e o facto de se encontrar a trabalhar no estabelecimento prisional.

O recorrente CC invoca o vício do art. 410º nº 2 al, a) do Código de Processo Penal, - insuficiência da matéria de facto provada - atenta a inexistência do Relatório Social e a indeterminabilidade do número de consumidores para efeitos da circunstância da al. b) do art. 24º do Decreto-Lei n.º 15/93; a atenuação especial da pena por aplicação do Decreto-Lei n.º 401/82 O recorrente DD critica o tribunal a quo por não ter ido mais longe na investigação dos factos essenciais para a decisão, considera existir uma configuração factual insuficiente para alcançar uma solução jurídica sustentada e um erro notório na apreciação da prova, assentando a convicção do tribunal numa prova parcial e incompleta, tendo o tribunal feito única e exclusivamente uso das escutas telefónicas para relacionar o recorrente com o tráfico de estupefacientes. Defende que deve o seu comportamento ser enquadrado como traficante-consumidor (art. 26º) ou, a não se entender assim, como tráfico de quantidades diminutas do art. 25º. Advoga que houve violação do princípio da proporcionalidade na aplicação das penas, do princípio da igualdade de tratamento e do princípio in dubio pro reo.

Os autos foram a vistos e realizou-se a audiência para discussão oral dos diversos recursos.

Em alegações, o Ministério Público pronunciou-se especificamente acerca de cada um dos recursos, tendo referido - recurso da arguida AA: - as questões suscitadas pela recorrente são improcedentes, não se verificando a alegada omissão de pronúncia por parte da Relação, verificando-se a ocorrência das agravantes b) e i) do art. 24º do Decreto-Lei n.º 15/93, tal como o Supremo julgou verificadas quanto ao arguido EE e mostrando-se a pena calculada de harmonia com as regras, nãpo havendo motivo para a sua atenuação extraordinária; - recurso do arguido BB: uma vez que na matéria provada se inclui que "as declarações [do arguido] foram de excepcional importância para a descoberta da verdade, pelo que esclareceram em relação à actuação do arguido EE, em relação à actuação de outros arguidos (nomeadamente os que para si vendiam) e em relação a toda a sua movimentação e ao seu modo de actuação", mas não se deram como provadas as circunstâncias da dependência emocional relativa à arguida AA, nem o arrependimento, o recurso merece parcial provimento, devendo a pena sofrer ligeiro abrandamento; - recurso do arguido CC: a matéria dos autos não consente um juízo favorável ao recorrente para aplicação do regime especial para jovens delinquentes, mas admite que a pena aplicada possa ser reduzida para próximo do limite legal doo tipo pelo qual o recorrente foi condenado; - recurso do arguido DD: as dúvidas que a matéria de facto suscita quanto à real extensão da actividade delituosa devem ser interpretadas num sentido que seja favorável ao arguido pelo que a sua actividade se deve considerar como integradora do crime de tráfico de menor gravidade, do art. 25º, devendo a pena ser fixada a meio da moldura legal, sendo de prisão efectiva.

A defesa dos diversos recorrentes remeteu para as motivações apresentadas nos recursos.

Cumpre decidir.

  1. Os factos considerados provados são os seguintes: 1 - O arguido BB (nº3) é sobrinho da arguida AA (nº2), a qual durante período não concretamente apurado viveu em comunhão de mesa e habitação com o arguido EE (nº1); 2 - Pelo menos desde Setembro de 2003, os arguidos EE (nº1) e AA(nº2) concertaram entre si o plano de procederem à venda e distribuição de estupefaciente - heroína e cocaína; 3 - Em data não apurada, mas durante o mês de Setembro de 2003, os arguidos EE (nº1) e AA (nº2) acordaram com o arguido BB (nº3) que lhe forneceriam cocaína e heroína, a cuja venda este procederia na sua residência, sita na Trav. do Carvalhal, n.º ..., em Anta, Espinho, também conhecida como "fábrica", bem como no café "Quintã", sito na Rua do Cedro, n.º ..., em Mozelos, Santa Maria da Feira, que pertencia à arguida AA, mas que nessa data era explorado pelo arguido BB; 4 - Assim, o arguido BB, actuando na execução do planeado com os arguidos AA e EE, dedicou-se à venda de heroína e cocaína pelo menos desde o mês de Setembro de 2003 até 22.01.04, data em que foi detido para cumprimento de uma pena de prisão; 5 - Para o efeito, o arguido EE, através da arguida AA, fornecia cerca de 5 a 6 vezes por semana ao arguido BB heroína e/ou cocaína na quantidade de cerca de 20 gramas de cada vez, que este ia buscar à residência da arguida AA, bem como lhe emprestavam a balança de precisão ("contra-peso") e outros instrumentos necessários ao corte, pesagem e embalagem do produto estupefaciente, a fim de o colocar em doses individuais e, deste modo, permitir a sua venda; 6 - Os arguidos EE e AA, aquando daquele período temporal, não exerciam qualquer actividade profissional ou outra, remunerada ou não, para além da venda de produtos estupefacientes; o arguido BB, além desta actividade de venda de produtos estupefacientes, explorava o "Café Quintã" nos termos já referidos sob o número 3; 7 - Nenhum dos arguidos EE, AA e BB apresentou junto da Direcção-Geral de Impostos declaração de rendimentos, nem efectuou descontos para a Segurança Social, beneficiando a arguida AA de rendimento mínimo garantido desde Outubro de 1997, no valor mensal de 160,16 euros; 8 - Na execução do planeado entre os arguidos EE, AA e BB e para levar a cabo a actividade de venda de produtos estupefacientes a terceiros, o arguido BB procedia à venda directa aos consumidores que o procuravam, quer na sua residência, quer no café "Quintã", tendo ainda "recrutado" diversos indivíduos que, agindo sob as suas ordens e instruções, permaneciam na sua residência para esse efeito; 9 - Assim, o arguido BB procedeu ao aludido "recrutamento" de diversos indivíduos com o conhecimento dos arguidos AA e EE, tendo acordado com os arguidos FF (nº9), CC (nº6), GG (nº8), HH (nº13), II (nº14), JJ (nº15), LL (nº16), MM (nº19), NN (nº20) e OO (nº18), que estes procederiam à venda de estupefacientes na sua residência - Trav. do Carvalhal - a troco ou de droga para o seu consumo ou de dinheiro; 10 - Na sua actividade de venda de estupefacientes, o arguido BB contava ainda com a colaboração da sua namorada, a arguida PP (nº10), a qual encaminhava para aquele as encomendas de estupefaciente sempre que algum consumidor se lhe dirigia para o efeito, e com o menor QQ, nascido a 2/9/88, o qual, seguindo as instruções daquele, procedia à entrega de estupefacientes àqueles que se dirigiam à residência sita na Trav. do Carvalhal para os adquirir; 11 - Deste modo, e na execução do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
7 temas prácticos
7 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT