Acórdão nº 07S4100 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Junho de 2008

Data04 Junho 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. AA demandou, no Tribunal do Trabalho do Porto, mediante acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum, o Instituto Nacional de Estatística (doravante, INE), pretendendo a condenação deste a: - Atribuir-lhe a categoria de técnico superior (de informática), do grupo de qualificação de pessoal técnico superior, com efeitos a partir do ano 2000 (sendo o nível 10 da tabela salarial em 2001, o nível 11 em 2002 e 2003, e o nível 12 de 2004 em diante), ou no mínimo, a partir do ano 2001 (sendo, neste caso, o nível 10 da tabela salarial em 2002, o nível 11 em 2003 e 2004, e o nível 12 de 2005 em diante); - A pagar-lhe as diferenças salariais apuradas, no valor de € 29.234,31 e as vincendas, para o nível 12, a partir da data da entrada da acção, tudo com juros legais desde as respectivas datas de vencimento; - A compensá-lo, por danos não patrimoniais sofridos, mediante indemnização no valor de € 5.000,00, com juros a partir da citação.

Pediu, outrossim, a condenação do Réu na sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso no cumprimento da decisão, no valor de € 1.000,00.

Alegou, em síntese, que: - Foi admitido pelo Réu em 16 de Março de 1998 para exercer as funções de técnico-adjunto de estatística, da carreira de técnico profissional, tendo passado desde o ano 2000 a exercer as funções correspondentes à categoria profissional de técnico superior de informática; - A falta de habilitações para o ingresso na carreira, para o acesso à carreira e para a mudança de carreira, não obsta à procedência do pedido, já que a Direcção do Réu declarou a necessidade funcional ao atribuir-lhe o desempenho de funções atinentes à pretendida categoria, para o que detém o perfil adequado, designadamente quanto a uma experiência profissional relevante e ininterrupta, com desempenho avaliado positivamente, sendo que tem formação, experiência e competência exigíveis para a categoria.

Na contestação, o Réu impugnou, em parte, o alegado pelo Autor, quanto às funções que o mesmo vem exercendo e alegou que, não tendo ele habilitações que lhe permitam aceder à carreira de técnico superior, também nunca o Réu fez qualquer declaração expressa de necessidade funcional ou fixou as condições em que a falta de habilitações do autor poderia ser suprida por experiência profissional, pelo que a acção terá de ser julgada improcedente.

Proferido despacho saneador, com dispensa da condensação, veio a realizar-se a audiência de discussão e julgamento e, decidida a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo a Ré dos pedidos.

  1. Inconformado, o Autor interpôs, ao abrigo do disposto no artigo 725.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, o presente recurso, que foi admitido, no tribunal recorrido e, também, neste Supremo, para ser processado como revista per saltum.

    Oportunamente, veio o recurso a ser motivado mediante peça alegatória rematada com as conclusões redigidas como segue: 1.ª Nos termos do art.º 725.º, n.º 1, do CPC, uma vez que o recurso se limita a questões de direito, requer que seja admitido per saltum para a Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça; 2.ª A questão colocada no processo é a de saber se o A/recorrente, que está classificado pelo R. como técnico-adjunto de estatística, tem o direito a ser classificado como técnico superior de informática, nos termos dos Estatutos do Pessoal do INE, constantes da Portaria 441/95, de 12 de Maio; 3.ª Os factos: O A. foi admitido em 16.3.1998 como técnico-adjunto de estatística, após 2,5 meses de estágio, para funções de registo, processamento e validação de dados no Núcleo das Estatísticas do Comércio Internacional (factos 1 a 4); porém, a partir de 1999, por incentivo do seu Coordenador do Núcleo, o A. sofreu uma alteração nas suas funções, passando para a área informática, por causa da sua apetência por esta área e pela necessidade sentida pelo R. de construção de ferramentas de trabalho para o núcleo e pelo facto de no Porto não existir ninguém na área do desenvolvimento aplicacional (facto 5); em 2000, por instrução da chefia directa, passou a dar suporte técnico e formação no exterior a operadores económicos (facto 6) e em 2001 idealizou, desenvolveu e implementou uma aplicação informática Edimail (facto 7), que teve sucesso e foi proposta a prémio de qualidade (factos 8 e 9); em face desse êxito, a sua chefia solicitou-lhe a concepção de outras soluções aplicacionais, que depois desenvolveu e implementou sozinho (facto 10), redigindo os respectivos manuais de utilização (facto 11), a par de formação específica que foi recebendo (facto 13); reconhecendo a alteração de funções do A., o R., na sequência do seu processo de reestruturação, integrou o A. no Serviço de Desenvolvimento Aplicacional do Departamento de Sistemas de Informação, em 1.6.2005 (facto 18); 4.ª Como resulta, as funções do A. enquadram-se na categoria de técnico superior de informática, desde pelo menos 2001 (facto 7), segundo a noção do grupo de qualificação de pessoal técnico superior, prevista no art.º 14.º dos Estatutos, e da definição do «posto de trabalho padrão» da categoria de Técnico Superior de Informática efectuada pelo Departamento de Recursos Humanos do R. (facto 23); 5.ª Segundo os estatutos do R. INE, para o ingresso na carreira superior exige-se a necessidade funcional, declarada pela Direcção (art.os 3.º e 4.º do regulamento); 6.ª Essa declaração pode ser expressa ou tácita (art.os 217.º e 219.º do CC); 7.ª As funções do A. sofreram uma alteração (em termos de categoria e carreira) em relação ao que tinha sido contratado inicialmente, por instrução/solicitação expressa das chefias e por necessidade dos serviços (cf. factos 5 e segs.), que o A. aceitou; ou seja, a necessidade funcional foi declarada pelas chefias do A. (art.º 800.º, n.º 1, do CC), ao atribuir-lhe o desempenho das funções necessárias; 8.ª Trata-se de uma declaração expressa, como resulta dos factos 5, 7 e 10, ou, no mínimo, tácita (art.º 236.º, n.º 1, do CC), tendo o reconhecimento dessa necessidade passado pela colocação - sem mais (provas ou testes) - no Serviço de Desenvolvimento Aplicacional do Departamento de Sistemas de Informação, em 2005 (facto 18); 9.ª O Regulamento requer também que o candidato tenha perfil adequado (art.os 3.º e 4.º do regulamento), designadamente quanto a habilitações literárias e experiência profissional. A mudança de carreira é condicionada pela posse das habilitações exigíveis, sendo que a falta de habilitações literárias pode ser suprida por experiência profissional equivalente, nas condições que caso a caso sejam fixadas pela Direcção (art.º 5.º do regulamento); 10.ª O A. não possui uma licenciatura (habilitações literárias), daí a alegação que fez na p.i. visando demonstrar toda uma experiência profissional ininterrupta e relevante (que provou), experiência essa aliás que o R. logo confessou no art.º 12.º da contestação; 11.ª O desempenho do A. foi avaliado positivamente (facto 25), o que revela também que tem a formação, experiência e competências exigíveis para a categoria, e por isso o desempenho de funções com sucesso; 12.ª Nos termos do Regulamento, não tendo o A. as habilitações exigíveis (licenciatura), para poder ser suprida por experiência profissional equivalente, nos termos alegados, carece de que as condições sejam fixadas pela Direcção caso a caso (art.º 5.º do regulamento); 13.ª A omissão do R., quanto à (proposta de) promoção do A. ou à definição de condições para o A. ser promovido, não pode prejudicá-lo (muito menos no confronto directo com o seu colega de equipa - conclusão 16.ª); 14.ª O A. tem o direito a ser classificado na carreira em que se integra (informática) e à categoria normativa que o abrange (art.º 8.º, n.º 1, dos Estatutos), tendo ainda o legítimo direito à realização profissional e ao pleno desenvolvimento da respectiva carreira profissional, à igualdade de oportunidades e de tratamento, no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho (art.os 22.º, 23.º, 28.º e 29.º do CT); 15.ª Salvo o devido respeito, é ilegal e inconstitucional a aplicação estrita e a interpretação dada pela douta sentença recorrida ao art.º 5.º do Regulamento, por ofensiva do princípio da igualdade de oportunidades e de tratamento e das garantias constitucionais dos art.os 58.º e 59.º da CRP, segundo a qual não seria bastante o exercício continuado (anos a fio) e relevante (com sucesso) de funções a que corresponde uma carreira diferente da contratada ab initio, de natureza superior, como o R. definiu, por instrução das próprias chefias directas e a sua solicitação, com todo um esforço de formação por iniciativa e a expensas próprias, em benefício da instituição, que por acaso (!?) até é um instituto público, e, por mera formalidade estatutária e inércia administrativa própria da administração pública, denegar o acesso à carreira e à categorização; 16.ª E nem o A. pode ser prejudicado e discriminado face ao colega de trabalho (factos 18, 19, 21 e 22), nos termos da norma constitucional do trabalho igual, salário igual [art.º 59.º, n.º 1, a), da CRP], pelo que também por força deste regime o regulamento do R. devia ceder face à lei superior.

    NESTES TERMOS, DEVE O RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, A ACÇÃO PROCEDER.

    O Réu respondeu ao recurso, tendo concluído a sua alegação nos seguintes termos: A. Para que o Recorrente e qualquer outro trabalhador possam ingressar numa carreira profissional superior torna-se necessário que a Direcção do Recorrido tenha, não só declarado a necessidade funcional, como também definido as condições em que a experiência profissional do candidato possa ser considerada equivalente às habilitações superiores exigidas, não as tendo (artigos 3.º, 4.º e 5.º do Regulamento das Carreiras Profissionais e Grupos de Qualificação); B. Para além de a necessidade funcional nunca...

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