Acórdão nº 07S3381 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelBRAVO SERRA
Data da Resolução19 de Dezembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Pelo Tribunal do Trabalho de Aveiro intentou AA contra Companhia de Seguros Empresa-A, S. A.

, acção especial emergente de acidente de trabalho solicitando a condenação da ré a pagar-lhe a pensão anual e vitalícia, devida desde 15 de Outubro de 2003, calculada com base no salário anual de € 16.800, a quantia de € 97,19 a título de consultas e despesas com taxas moderadoras, e juros.

Aduziu, em síntese, que no dia 25 de Janeiro de 2003, quando o autor, que se encontrava a trabalhar ao serviço da sua entidade patronal, Empresa-B, Ldª, fiscalizando a montagem de chapas de cobertura de um posto de abastecimento de combustíveis sito na Avenida da Boavista, no Porto, uma delas cedeu, vindo o mesmo autor a cair ao solo de uma altura de cerca de cinco metros, o que lhe causou lesões que demandaram uma incapacidade temporária absoluta desde o dia do acidente até 15 de Outubro de 2003, uma incapacidade temporária parcial de 20% desde o dia 16 de Outubro de 2003 a 17 de Dezembro de 2003 e uma incapacidade permanente parcial não inferior a 20% desde então.

Após contestação daquela ré - que, em súmula, sustentou que a queda se ficou a dever ao facto de o autor ter caminhado sobre uma chapa de luminosidade feita em policarbonato, de frágil resistência, ao que acrescia que não foi utilizado algum dispositivo de protecção contra quedas, nomeadamente cinto de segurança, pelo que o acidente se havia de ter por descaracterizado face à actuação do autor, que agiu com negligência grosseira, ou, então, dever ser imputada a responsabilidade, em primeira linha, à sua entidade patronal - foi, por despacho de 10 de Março de 2006, determinada, por chamamento à acção, a citação da entidade patronal do autor, que também contestou, propugnando pela sua absolvição.

Em 14 de Novembro de 2006 foi proferida sentença que absolveu a ré seguradora e a chamada entidade patronal, dado que foi entendido que a ocorrência do acidente se ficou a dever à circunstância de o autor não ter utilizado quaisquer mecanismos de segurança.

Do assim decidido apelou o autor para o Tribunal da Relação de Coimbra, impugnando, inter alia, a matéria de facto, vindo aquele tribunal de 2ª instância, por acórdão de 17 de Maio de 2007, a decidir não conhecer da impugnação quanto à matéria de facto e a julgar procedente a apelação, condenando a ré seguradora a pagar ao autor o capital de remição, a calcular oportunamente e baseado numa pensão anual e vitalícia de € 11.760, e ainda a quantia de € 97,19 a título de taxas moderadoras despendidas pelo autor.

  1. É deste aresto que, pela ré seguradora, vem pedida revista, rematando a sua alegação com o seguinte quadro conclusivo: - "1º - Conjugando a matéria dada como provada, não podemos deixar de concluir que o A., enquanto sócio e superior hierárquico em obra, tinha obrigação (era-lhe exigível) de assegurar a existência em obra de todo o equipamento de segurança necessário, obrigação essa que, manifestamente, não cumpriu; 2º - Resulta igualmente da matéria de facto dada como provada que o A. conhecia a existência do equipamento de segurança necessário para aquele tipo de trabalhos e que sabia que, caso o utilizasse não sofreria o acidente que sofreu; 3º - E resulta que a montagem de tal equipamento era possível naquela obra concreta; 4º - Resulta, finalmente, que a obra em causa demorava dias ou meses, pelo que a opção do Autor não se pode considerar momentânea, no sentido de ser enquadrada em mera distracção ou esquecimento; 5º - Tudo o exposto, aliado à circunstância de a cobertura estar inacabada e, por conseguinte, dotada de perigos acrescidos, impõem que se conclua que, no caso, existiu por banda do autor intencionalidade, com culpa grave, na omissão da utilização do equipamento de segurança necessário, maxime do cinto de segurança e corda de vida; 6º - Está assente que o autor sabia que usando o cinto de segurança evitaria quedas em altura como a que sofreu.

    1. - E está assente que o autor não utilizava cinto de segurança de protecção contra queda em altura.

    2. - Está finalmente dado como provado que na obra em causa era possível criar condições para poderem ser usados cintos de segurança para protecção contra queda em altura, criando-se um ponto de fixação seguro, dotado de sistema de ligação ao qual seriam presos aqueles cintos, os quais estariam também dotados de sistema de preensão do corpo.

      1. - Ora, sendo o autor sócio e superior hierárquico responsável em obra, conhecia, atenta a citada matéria provada, sobejamente, o perigo que resultaria da omissão da utilização do equipamento de segurança.

    3. - As funções que executava eram diárias e, por conseguinte, repetidas, o que permite concluir que a decisão de omissão não foi momentânea ou irreflectida - o material, pura e simplesmente, não estava a ser utilizado naquela obra.

    4. - Por assim ser só se poderá concluir que o autor podia, mas não fez e sabia que se fizesse evitaria o acidente - O que leva a concluir pela ausência de causa justificativa.

    5. - À data do acidente, era já vasta a legislação aplicável ao caso dos autos, para além do preceituado no Dec. Lei n.º 155/95 e que, manifestamente, foi violada pelo autor, concretamente, Directiva n.º 92/57/CEE, Decreto n.º 41821, 11.8.1958 - artigos 44º e 45º, Portaria n.º 101/96, de 3.4 e Portaria n.º 988/93, de 6.10; 13º - Finalmente, pelas características da cobertura e a natureza da actividade desenvolvida pelo Autor, necessariamente se terá de concluir que, no caso, havia risco de queda em altura.

    6. - Termos em que, ao decidir de outro modo, o Tribunal ‘a quo' violou quanto dispõe o artigo 7º, n.º 1, al. a) da Lei n.º 100/97, ou caso assim não se entenda, violou os artigos 18º, n.º 1 e 37º, n.º 2 do mesmo diploma.

      " Respondeu o autor à alegação da ré seguradora, sustentando a improcedência do recurso e concluindo assim: - "Considerando que 1ª - A circulação do Autor por cima da cobertura não contendia sequer com o factor de resistência das chapas (incluindo as de policarbonato) para suportar o seu peso, pois este percorreu-as sobre a estrutura que as suporta, na zona de encaixe e aperto daquelas, onde são aplicados os parafusos, porcas e anilhas de fixação (que não ofereciam perigo de falta de resistência), e fazia-o lentamente, actuando, assim, com todo o cuidado e diligência, além de que a parte superior da cobertura, é plana e sem declive, não apresentando qualquer perigo especial de circulação sobre a mesma.

      1. - Não se vislumbra norma sobre a segurança na montagem de estruturas que, em situações como a que se nos depara nos presentes Autos, imponha o uso dos cintos de segurança ... Efectivamente estes apenas são exigidos - e verificado certo circunstancialismo - nas obras realizadas em telhados, conforme o determina o artº. 44º e seu parágrafo 2º do DL. 41.821, o que não é manifestamente o caso, nem vem alegado, nem provado.

      2. - Para que se pudesse concluir que o Autor violou os princípios programáticos que dispõem sobre a segurança no trabalho, era necessário desde logo saber qual a estrutura, características, em suma a forma como estava construída a cobertura do posto de combustível e a sua estrutura de suporte ... Só desse modo é que se poderia assentar em que o Autor, por si, ou enquanto legal representante da Entidade Patronal, omitira, culposamente, o cumprimento de normas essenciais para a segurança de quem trabalhasse sobre tal cobertura ...

        Mas a verdade é que neste ponto a fundamentação de facto não é incontroversa, nem sequer esclarecedora, 4ª - Do facto de a chapa de...

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