Acórdão nº 07S3657 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução22 de Novembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 22 de Junho de 2005, no Tribunal do Trabalho da Figueira da Foz, AA, com o patrocínio do Ministério Público, intentou a presente acção, com processo especial, emergente de acidente de trabalho, contra COMPANHIA DE SEGUROS Empresa-A, S. A., e Empresa-B - CONSTRUÇÃO CIVIL E OBRAS PÚBLICAS, L.da, pedindo que as rés fossem condenadas, conforme a sua responsabilidade, no pagamento das pensões, subsídios e indemnizações devidos pela morte de BB, que foi seu marido, resultante de acidente de trabalho, ocorrido em 13 de Março de 2004, quando aquele prestava a sua actividade profissional em favor da segunda ré, cuja responsabilidade infortunística estava transferida para a antedita seguradora.

A ré seguradora contestou, defendendo que o acidente se verificou porque o trabalhador, sem causa justificativa, violou as condições de segurança estabelecidas pela empregadora no processo de abate de árvores, sendo o acidente «exclusivamente imputável ao próprio trabalhador por insistência em não proceder ao abate com respeito por todas as cautelas exigíveis, o que se subsume num comportamento grosseiramente negligente», logo está excluído o direito à reparação do acidente, nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro.

A ré empregadora também contestou, alegando que o acidente ocorreu por culpa grave, grosseira e exclusiva do sinistrado.

Entretanto, o Instituto de Segurança Social (ISS), IP, sucessor do Instituto de Solidariedade e Segurança Social, no âmbito de actuação do Centro Nacional de Pensões (CNP) veio, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 55/89, de 22 de Fevereiro, deduzir pedido de reembolso de prestações da Segurança Social, contra as duas mencionadas rés, alegando que deferiu e pagou à autora, a título de pensão de sobrevivência, no período de Abril de 2004 a Novembro de 2005, a quantia de € 13.547,62, pedindo a condenação daquelas rés a pagarem-lhe a aludida importância, acrescida de juros de mora desde a data da citação até integral e efectivo pagamento.

Realizado julgamento, foi proferida sentença que absolveu a ré empregadora dos pedidos contra ela formulados e condenou a ré seguradora a pagar à autora: a) a quantia de € 4.387,20 de subsídio por morte, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos desde 13.03.2004 (data da morte do sinistrado) até integral pagamento; b) a quantia de € 20,00 de despesas de transportes acrescida de juros de mora vencidos e vincendos desde 26.10.2004 (data da tentativa de conciliação dos autos) até integral pagamento; c) pensão anual e vitalícia, no montante de € 2.919,00, desde 13.03.2004 até 01.12.2004, de € 2.986.13, desde 01.12.2004 até 01.12.2005, e de € 3.054,81 desde 01.12.2005, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos desde as datas dos respectivos vencimentos até integral pagamento.

A ré seguradora foi, ainda, condenada a pagar ao ISS, a título de reembolso, a quantia de € 16.267,78, sendo € 10.364,90 a título de pensões de sobrevivência e € 5.902,88 a título de subsídio por morte, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos desde as datas em que o ISS tiver efectuado tais pagamentos até integral pagamento, «podendo imputar o pagamento das importâncias respectivas a título de subsídio por morte e de pensões de sobrevivência no pagamento [d]as quantias que foi condenada a pagar à Autora, respectivamente a título de subsídio por morte e das pensões anual e vitalícias, entretanto vencidas, o que vale por dizer que ficará autorizada a descontar nas quantias a pagar à Autora, as importâncias que foi condenada a pagar ao Instituto».

  1. Inconformada, a ré seguradora interpôs recurso de apelação, defendendo que o acidente não dá direito a reparação, já que a causa do acidente se ficou a dever a omissão do sinistrado, que violou, sem causa justificativa, normas de segurança estabelecidas pela empregadora, situação prevista na parte final da alínea a) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 100/97, tendo a Relação julgado a apelação procedente e revogado a sentença recorrida, absolvendo a ré seguradora dos pedidos formulados.

    É contra esta decisão que a autora se insurge, mediante recurso de revista, em que pede a revogação do acórdão recorrido, com base nas seguintes conclusões: «1. O douto acórdão recorrido, ao considerar que o acidente de trabalho que vitimou o sinistrado BB não dá direito a reparação, efectuou incorrecta interpretação do disposto nos artigos 7.º, n.º 1, al. a), da Lei n.º 100/97, de 13-9, e 8.º, n.º 1, do DL n.º 143/99, de 30-4; 2. Com efeito, não resultando com clareza do circunstancialismo fáctico apurado que ao sinistrado tivessem sido transmitidos directamente e sem margem para dúvidas os procedimentos e regras de segurança instituídas pela entidade patronal relativos à actividade do abate florestal, dificilmente teria o mesmo sinistrado conhecimento do conteúdo exacto de tais prescrições; 3. Por conseguinte, existindo causa justificativa da violação por parte do sinistrado das condições de segurança estabelecidas pela entidade empregadora, não ocorreu a descaracterização do acidente a que alude o artigo 7.º, n.º 1, al. a), da Lei n.º 100/97 de 13-9; 4. Ainda que assim se não entenda, considerando o específico circunstancialismo da posição da árvore a abater, cuja inclinação era sugestiva da facilidade da respectiva queda e da consequente inexistência de risco de acidente, circunstancialismo esse conjugado com a grande experiência profissional do sinistrado, é lícito concluir que este agiu com limitado ou mesmo nulo conhecimento do perigo que poderia resultar da omissão dos habituais procedimentos de segurança, preenchendo tal situação o conceito de causa justificativa a que aludem os acima mencionados preceitos; 5. O douto acórdão recorrido violou as disposições constantes dos artigos 7.º, n.º 1, al. a), da Lei n.º 100/97, de 13-9, e 8.º, n.º 1, do DL n.º 143/99, de 30-4.» O ISS, ao abrigo do artigo 683.º, n.os 2, alíneas a) e b), e 3, do Código de Processo Civil, normas que se aplicam, subsidiariamente, aos processos de natureza laboral, por força do preceituado no artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho, aderiu ao recurso de revista interposto pela autora, fazendo «suas as doutas alegações de recurso subscritas pela Autora, pelo que adere e dá desde já por reproduzidas in totum, o que nelas se expende», concluindo que «deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, e, consequentemente, a douta [decisão] recorrida ser revogada e substituída por outra que condene a Recorrida a pagar ao ISS, IP/CNP o montante peticionado».

    A ré seguradora contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado.

  2. No caso vertente, a única questão suscitada reconduz-se a saber se não está excluído o direito à reparação do acidente, por existir causa justificativa da violação, por parte da vítima, das condições de segurança impostas pelo empregador.

    Corridos os vistos, cumpre decidir.

    II 1.

    O tribunal recorrido deu como provada a seguinte matéria de facto: 1) A Autora AA e BB contraíram casamento entre si [alínea A) dos Factos Assentes]; 2) BB faleceu no dia 13 de Março de 2004 [alínea B) dos Factos Assentes]; 3) No dia 13 de Março de 2004, pelas 16,50 horas, na localidade de Caceira, freguesia de Alhadas, Figueira da Foz, BB prestava as suas funções de trabalhador eventual para a Ré «Empresa-B - Construção Civil e Obras Públicas, L.da», sob [as suas] ordens, direcção e fiscalização, mediante remuneração [alínea C)...

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