Acórdão nº 06S4104 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Julho de 2007
Magistrado Responsável | VASQUES DINIS |
Data da Resolução | 12 de Julho de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.
"AA" propôs, em 2 de Abril de 2003, no Tribunal do Trabalho de Aveiro, acção como processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra "Empresa-A.", pedindo a declaração de nulidade do despedimento de que foi alvo e a condenação da Ré, - a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e em efectividade de funções ou no pagamento da quantia de € 21.867,78 euros a título de indemnização legal por antiguidade, se assim optar; - a pagar-lhe as retribuições intercalares desde o despedimento até à data da sentença; - a pagar-lhe a quantia de € 23.379,16 correspondente a diferenças de retribuição; - a pagar-lhe juros de mora sobre as importâncias devidas.
Alegou, em síntese, que: - Foi admitido ao serviço da Ré em Maio de 1993, inicialmente, para o exercício das funções de escriturário, tendo sido promovido a Chefe de Vendas/ Director Comercial.
- Auferia uma retribuição fixa, acrescida de uma parte variável.
- Por carta registada com A/R, que o Autor recebeu em 8 de Abril de 2002, a Ré comunicou-lhe que considerava cessado o contrato de trabalho por abandono...em virtude de o Autor, "há mais de vinte dias consecutivos se encontrar ausente do serviço, sem que a entidade empregadora haja recebido qualquer comunicação do motivo da ausência injustificada".
- A razão invocada para a cessação do contrato é, todavia, falsa, e uma vez que não foi precedido de processo disciplinar, o despedimento é nulo.
- Desde Janeiro de 2000 até à data do despedimento a Ré nunca lhe pagou o mínimo de retribuição mensal/base correspondente à sua categoria profissional, prevista no Contrato Colectivo de Trabalho para o sector (doravante, CCTV/ACAP), publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) n.º 4 de 29 de Janeiro de 1999.
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Na contestação, a Ré disse, em resumo, que: - Não são devidas ao Autor quaisquer quantias, a título de diferenças salariais, uma vez que fora acordado entre as partes a redução do seu vencimento, em virtude de ele trabalhar para a Ré, em tempo parcial, ao mesmo tempo que exercia a profissão de mediador de seguros.
- A partir de Novembro de 2001, o Autor deixou de exercer as funções que lhe estavam destinadas e raramente aparecia na empresa, passando a dedicar-se, exclusivamente, à actividade de mediador.
- A Ré foi tolerando a situação, esperando que o Autor repensasse o seu comportamento e retornasse à empresa, mas porque tal não aconteceu, a Ré fez cessar o contrato por abandono do posto de trabalho.
Concluiu pela total improcedência da acção ou, caso assim se não entenda, e venha a ser reconhecido algum crédito ao Autor, o mesmo deverá ser deduzido da quantia de € 1.466,46 correspondente à indemnização a que a Ré tem direito pelo abandono do trabalho, operando-se a compensação.
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Na resposta, o Autor impugnou o alegado abandono do trabalho, alegando, em síntese, que nunca deixou de prestar o seu trabalho por causa da contratação de seguros e que, até que foi despedido, compareceu diariamente no seu local de trabalho, dirigindo e coordenando a equipa de vendedores.
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Efectuado o julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, declarou ilícito o despedimento do Autor e condenou a Ré a pagar-lhe as quantias de € 13.844,09, a título de indemnização por antiguidade, € 55.699,40, a título de salários de tramitação, e € 25.391,18, a título de diferenças salariais, tudo acrescido de juros de mora contados desde a citação, à taxa legal de 7%, até 30 de Abril de 2003, e de 4% de 1 de Maio de 2003, até efectivo e integral pagamento.
Apreciando o recurso de apelação interposto pela Ré, a Relação de Coimbra deliberou conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, revogou a sentença, na parte em que condenou a Ré no pagamento ao Autor da quantia relativa a diferenças salariais no montante de € 25.391,18, condenando-a, simplesmente, a pagar-lhe a importância que, devida a esse título, vier a liquidar-se em execução de sentença, e rectificou o montante da condenação estabelecido a título de salários de tramitação, fixando-o na quantia global de € 70.605,00.
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Ainda inconformada, a Ré vem pedir revista, terminando a sua alegação com as conclusões assim redigidas: 1.ª A sentença da 1.ª instância é nula, dado que não especifica os fundamentos de direito na parte em que condenou a R., ora recorrente, no pagamento de € 1.728,12 relativos a actualizações salariais, contrariamente ao decidido pelo acórdão recorrido.
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O acórdão recorrido entende que a sentença proferida em 1.ª instância fundamentou de direito a decisão, ao aderir, implicitamente, aos fundamentos jurídicos consignados na petição. Além de que, 3.ª No seu douto entendimento, a nulidade invocada só existiria no caso de falta absoluta de fundamento, mas já não assim quando a fundamentação é apenas deficiente, medíocre ou não convincente.
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Com o respeito devido, não se pode considerar fundamentação de direito a que seja feita por simples adesão genérica aos fundamentos invocados pelas partes - como expressamente se consigna no art.º 158.º, n.º 2, e também no art.º 784.º "a contrario", ambos do C.P.C., e como se entende na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça.
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Também o entendimento de que a falta de motivação de facto e de direito só induz a nulidade da decisão quando é total ou absoluta, e não quando é apenas deficiente ou insuficiente, é uma solução que não se compagina com a redacção dos art.os 653.º, n.º 2, e 655.º, n.º 2, do C.P.C., desrespeitando-os frontalmente.
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A fundamentação da decisão, além de dar cumprimento a preceitos constitucionais e legais, visa permitir aos destinatários exercitar os meios legais de reacção postos à sua disposição, e assegurar a transparência e reflexão decisória.
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Ao decidir de modo diferente, o douto acórdão recorrido procedeu a uma errada interpretação e aplicação da lei, violando o disposto nos art.os 659.º-2, 668.º-1-b), 158.º-2, 653.º e 655.º-2 do C.P.C. e no art.º 205.º-1 da C.R.P., que deverão ser interpretados nos termos preditos, 8.ª Devendo, por isso, ser revogado e substituído por outro que declare nula a decisão proferida, nos termos preditos.
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O douto acórdão recorrido procedeu a uma errada interpretação e aplicação do disposto no art.º 13.º, n.º 1, als. a) e b), e n.º 2, al. b), do Dec.-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro.
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O A. pediu a condenação da R. a pagar-lhe as retribuições vincendas até à data da sentença.
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O douto acórdão recorrido, louvando-se na jurisprudência obrigatória do Supremo Tribunal de Justiça (Ac. de 20/11/2003), em cujos termos o momento a atender, como limite temporal final, para a definição dos direitos conferidos ao trabalhador é, não necessariamente a data da sentença em 1.ª instância, mas a data da decisão final do acórdão que confirme a ilicitude, alterou o valor, fixando-o agora em € 70.605,00.
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Não questionando a bondade do acórdão uniformizador da jurisprudência, o que nele foi decidido em termos substantivos não interfere com os princípios e normas que regulam o direito adjectivo.
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O A. pediu a condenação da R. a pagar-lhe as retribuições vencidas e vincendas até à data da sentença.
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O Tribunal, por não poder condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido - art.º 661.º do C.P.C. - tinha de se limitar na sua decisão a condenar a R. no montante pedido (como, de resto, se decidiu no douto acórdão do ST J citado).
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Ao decidir de modo diferente, o acórdão recorrido violou o disposto no art.º 661.º, n.º 1, do C.P.C..
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Sempre com o devido respeito e salvo melhor opinião, o acórdão recorrido procedeu a uma errada interpretação e aplicação do art.º 13.º, n.º 2, al. b), da L.C.C.T..
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A sentença recorrida condenou a R. a pagar ao A. os salários intercalares, sem que haja consignado que a tais valores deveriam ser deduzidas as importâncias eventualmente auferidas por este a título de rendimentos do trabalho após a data do despedimento.
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O acórdão recorrido decidiu que tal decisão não merece censura, pois o A. já exercia a actividade de mediador de seguros, e a lei só permite a dedução relativamente a actividade iniciada posteriormente ao despedimento, além de que incumbia à R. alegar e provar factos que obstassem ao reconhecimento de tal direito.
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É um facto que o A. exercia as funções de mediador quando trabalhava para a R. Mas, 20.ª Fazia-o em condições completamente distintas daquelas em que passou a exercer tal actividade após o despedimento, dado que até aí o fazia "nos tempos livres" (após a prestação do trabalho para R.) ou em "part-time" e como actividade complementar; a partir daí, passou a fazê-lo a tempo inteiro e em exclusivo.
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O A. só após o despedimento iniciou a actividade de mediador em exclusivo. Nessa medida e de acordo com as regras comuns da experiência, forçoso é concluir que, após o despedimento, iniciou uma nova actividade, e os rendimentos que da mesma entretanto auferiu, devem ser deduzidos aos salários intercalares (não sendo correcta a interpretação literal que a sentença e o acórdão fazem do vocábulo "iniciada". Por outro lado, 22.ª O A. devia ter alegado e provado que após o despedimento não exerceu qualquer nova actividade que lhe propiciasse rendimentos, e que, por isso, lhe assistia o direito ao recebimento de todos os salários intercalares - e não o fez, limitando-se apenas, no pedido, a pedir a condenação da R. no pagamento dos salários até à sentença.
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Só nessa hipótese impenderia sobre a R. o ónus de provar factos impeditivos, modificativos e extintivos do direito do A. - como decorre do art.º 342.º, n.º 2, do C.C. - a não ser que o A. beneficiasse de uma presunção (o que não se verifica).
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Além de que, como vem sendo entendido por parte da jurisprudência, dado que a dedução é imposta por uma norma de natureza imperativa, no caso "sub judice", tendo o A. passado a exercer a actividade de mediador de seguros em exclusivo, independentemente de ter ficado provado que o mesmo auferiu rendimentos, a...
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