Acórdão nº 02058/07 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelJOSÉ CORREIA
Data da Resolução14 de Outubro de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

3 Recurso nº 2058/07Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo: 1. - J........, SA, com os sinais identificadores dos autos, veio recorrer da sentença do TAF de Leiria que julgou parcialmente procedente a impugnação por si deduzida contra a liquidação de IVA dos anos de 1995 a 1997, no montante de 17.760.207$00, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui: "1) Vem o presente recurso interposto da douta decisão que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial, padecendo a mesma de erro de julgamento em matéria de facto e em matéria de direito.

2) Neste momento já se mostra prescrita a dívida de IVA e juros de 1995 face ao disposto no art. 34 do CPT, importando proceder à fixação da factualidade da alegação constante.

3) Importa declarar a prescrição da obrigação tributária, questão de conhecimento oficioso, como pressuposto da decisão sobre a não manutenção de utilidade no prosseguimento da lide, a implicar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide de harmonia com o disposto no artigo 287° alínea e) do CPC, assim se devendo dar provimento ao recurso jurisdicional, referente àquela dívida.

4) A remissão total para o relatório de inspecção não constitui forma adequada de fixação da matéria de facto, pelo que a decisão recorrida não satisfaz, em sede de especificação da matéria fáctica relevante, as exigências vertidas nos artigos 123° do CPPT e 659°, n° s 2 e 3, do Código de Processo Civil (aplicável ex vi artigo 2° do CPPT), sendo nula nos termos do disposto no artigo 125° do CPPT.

5) A norma do artigo 123°, principaliter, o seu n° 2, do CPPT, interpretado no sentido de admitir como adequadamente discriminada a matéria de facto dada como provada através de remissão/transcrição de documentos constantes dos autos, de per se e/ou em articulação com o artigo 125.° do CPPT, numa dimensão normativa de acordo com a qual a "discriminação" da matéria de facto dada como provada feita por mera transcrição/remissão para documentos constantes dos autos, não configure causa de nulidade da respectiva decisão atentam, de modo flagrante, contra o parâmetro jusfundamentaltipificado no artigo 20°, na dimensão de direito a um processo justo e equitativo - due process of law, com sentido material análogo ao inferido do artigo 6° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

6) Desde já se requerendo ao Tribunal que, após a correcta fixação da matéria de facto, ordene a notificação do recorrente para que este possa alegar o que tiver por conveniente em complemento ao constante da presente peça processual, maxime no que diz respeito a tal factualidade e respectiva valoração judicial, sendo inconstitucional, por violação das referidas exigências axiológico-normativas, o critério normativo inferido dos artigos 3.°, n.° 3, 712.° e 715.° do CPC, aplicáveis ex vi arts. 2.° e 281.° do CPPT, na interpretação segundo a qual é dispensada a audição do recorrente após a alteração/modificação ou fixação definitiva da matéria de facto peio Tribunal de 2.a instância, de modo a poder alegar, "complementando" o seu recurso/ o que tiver por conveniente em face de tal fixação.

7) A norma do artigo 282.°, n.° 3, do CPP, quando interpretada no sentido de o prazo aí previsto não se considerar aplicável ao alegado pelo recorrente após notificação da fixação definitiva da matéria de facto, também aqui por violação do direito a um processo justo e equitativo inferido dos arts. 2.° e 20.° da CRP e por violação do parâmetro tipificado no artigo 18.°, n.° 2, do diploma fundamental 8) O artigo 74° n° l da Lei Geral Tributária reparte assim o ónus da prova ente a Administração Fiscal e os contribuintes: os factos constitutivos dos direitos devem ser provados por quem os invoca. Trata-se de uma regra que, vertida em letra de lei, apenas, na LGT, já antes vigoraria entre nós, tal como entendeu o STA no acórdão de 14 de Novembro de 2001, proferido no recurso n° 26015, entre outros.

9) No caso sub judice, foi a Administração a invocar a existência do facto tributário em que fundou a sua actuação, donde incumbia-lhe a prova de que a ora recorrente não utilizou o método da afectação real e para tal apenas se podia recorrer da prova documental ou da prova testemunhal que confirmasse aquele facto e elencasse quais os documentos contabilísticos que tal confirmassem.

10) Só que a AF limitou-se a juntar algumas fotocópias de documentos relacionados com a obra construída em C...... e o lote AC na F............ (anexo 3 ao relatório), nem tão pouco referindo o mencionado anexo 8-A que serviu apenas de base à rubrica "Produtos e Trabalhos em Curso - Obras Efectuadas em Regime de Empreitada".

11) Cabe à AF o ónus de provar a existência dos pressupostos legais vinculativos da sua actuação, isto é, o encargo de provar que se verificam os factos que integram o fundamento previsto na lei para que seja ela a liquidar o imposto que o contribuinte deixou de liquidar, compete-lhe demonstrar a existência, conteúdo e quantificação do facto tributário e do mencionado anexo 3 nem mesmo do anexo 8-A resulta que a ora recorrente não tenha adoptado o método da afectação real nem tão pouco resulta quantificado os impostos em causa, acabando mesmo o Tribunal por inverter os critérios de repartição do ónus da prova.

12) O Tribunal errou ainda ao conhecer da legalidade do acto de liquidação fora dos pressupostos de direito e de facto sobre os quais os actos impugnados foram praticados, ou seja, por violação do que na lei se dispõe, pois que, sendo o contencioso de anulação, o Tribunal apenas poderá sindicar a legalidade do acto a partir da correcção jurídica dos pressupostos de facto e de direito sobre a consideração dos quais o mesmo foi praticado, pois, de contrário, o tribunal passa a ser um órgão da administração activa e viola o princípio constitucional da separação de poderes (art° 111° da CRP).

13) Face ao discurso argumentativo da AF, a única conclusão a retirar era a de que, pelo menos, existia a dúvida sobre a existência do facto tributário e, assim sendo, violou-se o princípio da legalidade tributária nos termos do qual «em caso de subsistir a incerteza, deve abster-se de praticar o facto tributário...» (Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, 1972, págs. 158), mais para mais quando é a própria AF a identificar documentos de compras e prestações de serviços, dos quais foi possível identificar a obra (fls. 13 do relatório).

14) Em parte alguma do relatório se afirma que "o modo de contabilização efectuada não permite a garantia de que não existem afectações indevidas de bens e serviços por inexistência de mecanismos de controlo, já que não existia qualquer suporte interno para esse efeito", o que a AF refere é uma impossibilidade da afectação ser impossível de concretizar no momento, sendo certo que, por força do preceituado no art. 266° CRP, a actividade da administração tem de ser levada a cabo em subordinação à Constituição e à lei e deve respeitar os direitos e interesses legítimos dos cidadãos e os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da boa fé.

15) O princípio do inquisitório justifica-se pela obrigação de prossecução do interesse público imposta à actividade da administração tributária (arts. 266° n ° 1 CRP e 55° LGT) e é corolário do dever de imparcialidade que deve nortear a sua actividade (arts. 266° n° 2 CRP e 55° LGT), impondo esta obrigação que a administração tributária não aguarde a iniciativa do interessado que formulou o pedido que deu origem ao procedimento, devendo ela própria tomar a iniciativa de realizar as diligências que se afigurem como relevantes para correcta averiguação da realidade factual em que deve assentar a sua decisão.

16) O acto tributário sofre de insuficiência de fundamentação, o que equivale a falta de fundamentação, sendo anulável.

17) Deveria, por um lado, o senhor agente da fiscalização concretizar invocando a razão ou as razões pelas quais a afectação real era impossível de concretizar no momento e, por outro lado, a decisão final da reclamação concretizar os factos e as razões focadas, de modo a que a impugnante pudesse contraditá-las convenientemente.

18) A recorrente utilizou o método da afectação real e, por conseguinte, não tem que ser aplicado o cálculo do Pró -Rata, apenas nos documentos indicados no anexo 3 do relatório foi deduzido o imposto sobre o valor acrescentado indevidamente e, por outro lado, quanto às quatro facturas indicadas a págs. 8 e 9 do relatório de fiscalização, do exercício de 1996, as mesmas dizem respeito a trabalhos feitos 19) Encontrando-se tal factualidade estribada no depoimento das testemunhas e nos documentos juntos com a p.i., aliás, não impugnados pela FP.

20) Sendo que se dúvidas existissem acerca da bondade e do exacto sentido daqueles, deveria o Tribunal, em respeito ao art° 99° da LGT ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados e não simplesmente a dar como reproduzido o teor de uma informação do processo de reclamação apenso constante que inclusivamente faz referência a um esclarecimento prestado pelo TOC da recorrente sem que o mesmo se encontre reduzido a escrito, como é de lei.

21) Existindo, como existe, fundada dúvida sobre a existência do facto tributário, impõe-se a anulação do acto de liquidação.

Termos em que e nos mais de direito, entende que deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogada a douta sentença recorrida, com todas as legais consequências." Não houve contra -alegações.

O EPGA emitiu o seguinte douto parecer: "1 - J....... - ............., LDA, veio interpor recurso da douta sentença proferida pelo M° Juiz do TAF de Leiria, na parte em que julgou improcedente a impugnação judicial que havia deduzido contra a liquidação adicional de IVA dos anos de 1994, 1995 e 1996.

Alega, em síntese:

  1. A prescrição da dívida; b) A nulidade da sentença por não...

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