Acórdão nº 00P3291 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Março de 2001

Magistrado ResponsávelCARMONA DA MOTA
Data da Resolução08 de Março de 2001
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

1- A oposição de julgados: 1.1 - No dia 4 de Fevereiro de 1998, a Relação de Lisboa, no recurso n.º 7741/97-3 (ver nota 1), «equiparou à entrega do requerimento de impugnação judicial na autoridade administrativa a efectivação do registo da sua remessa por via postal»: «É de 20 dias o prazo para a impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa aplicando coima, cujo termo inicial é marcado pelo conhecimento oficioso daquela sanção, preceitua-se no artigo 59.º, n.os 1 e 3, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro. Tal prazo suspende-se aos sábados, domingos e feriados, prescreve o artigo 60.º, n.º 1, do decreto-lei citado (lei quadro das contra-ordenações), regime que, parcialmente, se aproxima do modo de contagem dos prazos estabelecidos no artigo 72.º, alínea b), do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro. A questão que o recorrente coloca a este Tribunal é a de se saber se deve ou não equiparar-se à entrega do requerimento de impugnação judicial na autoridade administrativa a efectivação do registo postal se a remessa do requerimento se fizer por tal via. A lei quadro das contra-ordenações não resolve a questão, ao menos por via directa. Porém, quando ordena, no seu artigo 41.º, n.º 1, a aplicação, na forma subsidiária, dos preceitos reguladores do processo penal, se o contrário não resultar daquele diploma, fornece-nos um caminho de solução. Na verdade, dispõe o artigo 104.º, n.º 1, do Código de Processo Penal que se aplicam à contagem dos prazos para a prática de actos processuais as disposições da lei de processo civil. E o processo civil, particularmente o artigo 150.º, n.º 1, do respectivo Código, dispõe que, além do mais, os requerimentos podem ser entregues na secretaria judicial ou a esta remetidos pelo correio, sob registo, valendo, neste último caso, como data do acto processual a da efectivação do registo postal. O preceito, inovador na matéria, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, este alterando o Código de Processo Civil, pôs termo a uma velha querela, qual era a de saber se os atrasos verificados nos serviços de comunicações, designadamente nos correios, constituíam ou não, atenta a sua frequência, justo impedimento. A solução achada foi a de reputar praticado o acto sempre que a peça processual seja remetida pelos correios na data da certificação do registo postal, em conformidade com os regulamentos daqueles. É certo que o artigo 150.º, n.º 1, pré-citado, fala-nos em entrega na secretaria judicial ou remessa a esta, pela via postal, o que, à partida, numa interpretação puramente literalista, poderia levar-nos a excluir a sua aplicação, integrando a lacuna, porque o requerimento é apresentado numa repartição administrativa. Todavia, não se vê razão, sem ofensa do espírito do legislador, para se arredar a aplicação do preceito porque a prática do acto só poderá sê-lo perante uma autoridade administrativa, em princípio a genericamente competente para o efeito sancionatório do ilícito contra-ordenacional.» 1.2 - Mas, por Acórdão emitido em 21 de Junho de 2000 (no domínio, por isso, da mesma legislação) e transitado em julgado no dia 11 de Julho de 2000, a Relação do Porto (ver nota 2) viria, no recurso penal n.º 507/00-4, a decidir a mesma questão em sentido oposto, ou seja, no de que «na fase administrativa do processo de contra-ordenação não é possível, com base no disposto nos artigos 41.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 433/82 e 4.º do Código de Processo Penal, aplicar-se, subsidiariamente, o disposto no artigo 150.º, n.º 1, do Código de Processo Civil»: «A questão colocada é apenas de direito e consiste em saber se o disposto no artigo 150.º, n.º 1, do Código de Processo Civil é ou não aplicável ao prazo previsto no artigo 59.º, n.º 3, do Regime Geral das Contra-Ordenações, por força do estatuído nos artigos 1.º deste diploma e 4.º do Código de Processo Penal. De acordo com aquele normativo (artigo 150.º, n.º 1), a impugnação judicial ter-se-ia como feita na data do registo postal respectivo, no caso de o mesmo ser aplicável ao caso em apreciação. E no recente Assento n.º 2/2000 (Diário da República, 1.ª série-A, n.º 31, de 7 de Fevereiro de 2000) foi fixada jurisprudência no sentido de que o n.º 1 do artigo 150.º do Código de Processo Civil é aplicável em processo penal por força do artigo 4.º do Código de Processo Penal. Dispõe o artigo 41.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 433/82 que 'sempre que o contrário não resulte deste diploma, são aplicáveis, devidamente adaptados, os preceitos reguladores do processo criminal'. E estipula o artigo 59.º, n.º 3, do mesmo diploma que 'o recurso será feito por escrito e apresentado à autoridade administrativa que aplicou a coima no prazo de 20 dias após o seu conhecimento pelo arguido, devendo constar de alegações e conclusões', dispondo o artigo 60.º, n.º 1, que o prazo de 20 dias para impugnação da decisão da autoridade administrativa se suspende aos sábados, domingos e feriados. Pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 2/94, de 10 de Março (Diário da República, 1.ª série-A, de 7 de Maio de 1994), foi fixada jurisprudência obrigatória para os tribunais judiciais no sentido de que o prazo mencionado no n.º 3 do artigo 59.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, não tem natureza judicial, apesar da alteração nesse preceito introduzida pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro. E no Acórdão da Relação de Lisboa de 24 de Novembro de 1998 (Boletim do Ministério da Justiça, n.º 481, p. 527) diz-se que o postulado no artigo 60.º do Regime Geral das Contra-Ordenações demonstra que este importou ostensivamente as regras de contagem do prazo de impugnação judicial do Código do Procedimento Administrativo, designadamente do artigo 72.º, n.º 1, alíneas b) e c), concluindo pela inaplicabilidade, nesta sede, do disposto no artigo 107.º, n.º 5, do Código de Processo Penal. Atento o supra-referido, já pode concluir-se que o prazo de 20 dias, fixado pelo artigo 59.º do Regime Geral das Contra-Ordenações, é um prazo de natureza administrativa, aplicando-se-lhe o Código do Procedimento Administrativo, e não um prazo judicial, a que se aplicariam as regras do Código de Processo Civil. Tal conclusão resulta, cremos que claramente, do disposto no citado artigo 60.º, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 244/95, onde se definem as regras atinentes ao prazo de recurso, não havendo nesta matéria lacuna a integrar com recurso às normas do processo penal ou de processo civil, sendo certo que tem regras, de cariz administrativo, que são notoriamente divergentes das consagradas no Código de Processo Civil - v. Acórdãos desta Relação de 7 de Janeiro de 1998, processo n.º ......, e de 22 de Março de 2000, processo n.º ......, referindo-se neste último que 'na fase administrativa do processo de contra-ordenação não é possível, com base no disposto nos artigos 41.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 433/82 e 4.º do Código de Processo Penal, aplicar-se, subsidiariamente, o disposto no artigo 150.º, n.º 1, do Código de Processo Civil'. Quanto ao Assento n.º 2/2000, já citado, atenta a natureza administrativa do prazo para a impugnação da decisão da autoridade administrativa, não tem aplicação ao caso em apreciação, sendo certo que os argumentos nele vertidos têm cabimento também para o processo contra-ordenacional, mesmo em fase administrativa, e por isso cremos que o legislador não deixará de providenciar por criar norma adequada a tal efeito, ou seja, a contemplar o processo contra-ordenacional com a previsão constante do artigo 150.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.» 2 - O recurso: 2.1 - Perante tal oposição de julgados, a interessada vencida (...., A.... H....., Lda.)(ver nota 3) interpôs para o Supremo Tribunal de Justiça, em 14 de Setembro de 2000, recurso extraordinário para fixação de jurisprudência no sentido de que «o disposto na segunda parte do n.º 1 do artigo 150.º do Código de Processo Civil é aplicável ao envio às autoridades administrativas, pelo correio registado, de recurso de impugnação judicial»: «O acórdão recorrido contende com o Assento n.º 2/2000, de 7 de Fevereiro, que fixou jurisprudência no sentido de que 'o n.º 1 do artigo 150.º do Código de Processo Civil é aplicável em processo penal por força do artigo 4.º do Código de Processo Penal'. Na verdade, o regime subsidiário do Regime Geral das Contra-Ordenações é o Código de Processo Penal e não o Código do Procedimento Administrativo, como resulta bem claro do artigo 41.º daquele Regime Geral, pelo que o assento é aplicável ao processo contra-ordenacional. Da mesma forma que não existe no Código de Processo Penal nenhuma norma que se pronuncie sobre a possibilidade de actos processuais serem praticados por remessa, sob registo, para a secretaria competente, também não existe nenhuma norma no Regime Geral das Contra-Ordenações sobre a matéria, ou sequer no Código do Procedimento Administrativo, pelo que forçoso é aplicar o artigo 150.º, n.º 1, segunda parte, do Código de Processo Civil, ex vi artigos 41.º do Regime Geral das Contra-Ordenações e 4.º do Código de Processo Penal. O Assento n.º 2/94 do Supremo Tribunal de Justiça foi ultrapassado pela entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro, que alterou o Regime Geral das Contra-Ordenações no sentido de o aproximar e coordenar cada vez mais com o processo penal, conforme resulta do seu preâmbulo. De qualquer modo, aquele assento apenas versa sobre regras de contagem do prazo e não sobre regras da prática dos actos. Nada há, aliás, no Código do Procedimento Administrativo - dado que não disciplina a matéria da forma da...

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