Acórdão nº 2/08 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Carlos Fernandes Cadilha
Data da Resolução04 de Janeiro de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 2/2008

Processo n.º 1087/07

  1. Secção

    Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha

    Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

    I - Relatório

    A., preso preventivamente à ordem do Processo n° 547/04 da 3ª Vara Criminal de Lisboa, veio requerer, perante o Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do disposto nos artigos 31° da Constituição da República Portuguesa (CRP) e 222º do Código de Processo Penal (CPP), a providência de habeas corpus, alegando, em síntese, o seguinte:

    1. Foi inicialmente detido e constituído arguido, em 17 de Janeiro de 2005, e colocado em prisão preventiva, no dia imediato, após o primeiro interrogatório judicial, encontrando-se nessa situação, ininterruptamente, desde essa data.

    2. Foi pronunciado pelo crime de adesão a associação criminosa previsto e punido pelo artigo 299º, n.º 2, do Código Penal.

    3. Ainda na fase de inquérito, o procedimento foi considerado de excepcional complexidade, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do artigo 215º do Código de Processo Penal.

    4. Com a entrada em vigor da Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, o prazo máximo de prisão preventiva para a situação considerada (tendo em conta que o arguido foi pronunciado por um dos crimes a que se refere o n.º 2 do artigo 215º do Código de Processo Penal e o procedimento é de excepcional complexidade) foi reduzido para 2 anos e 6 meses, pelo que, tendo-se esgotado esse prazo no dia 18 de Julho de 2007, o requerente devia ter sido libertado em 15 de Setembro seguinte, data em que entrou em vigor a nova lei.

    5. No requerimento de abertura de instrução, o requerente arguiu, além do mais, a invalidade de um despacho proferido, em sede de inquérito, pelo magistrado do Ministério Público.

    6. Na decisão instrutória, o juiz de instrução criminal considerou essa arguição como intempestiva, por entender que devia ter sido apresentada no prazo de 3 dias a seguir à notificação da acusação, nos termos do artigo 123º, n.º 1, do CPP.

    7. Essa decisão foi mantida, em recurso, por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, pelo que o requerente impugnou o julgado perante o Tribunal Constitucional, solicitando que fosse apreciada, designadamente, a inconstitucionalidade da norma do artigo 123º, n.º 1, do CPP.

    8. Pelo acórdão n.º 42/2007, o Tribunal Constitucional julgou inconstitucional, por violação do artigo 32º, nº 1, da Constituição, a referida norma do artigo 123º, n.º 1, do CPP, interpretada no sentido de consagrar o prazo de 3 dias para arguir irregularidades contados da notificação da acusação em processos de especial complexidade e grande dimensão, sem atender à natureza da irregularidade e à objectiva inexigibilidade da respectiva arguição.

    9. O Tribunal da Relação de Lisboa, através do seu acórdão de 8 de Maio de 2007, veio então a reformar a decisão recorrida, considerando sanadas as irregularidades suscitadas, por entender que, não obstante a exiguidade do prazo de 3 dias previsto na norma do n.º 1 do artigo 123º do CPP, tinha já decorrido, no momento da arguição, o prazo geral de 10 dias, que era suficiente para a invocação de tais irregularidades.

    10. Dessa decisão, o requerente interpôs um novo recurso para o Tribunal Constitucional, com fundamento em violação de caso julgado constitucional, que, pelo acórdão nº 650/2007, foi julgado improcedente.

    11. À data da entrada em vigor, em 15 de Setembro de 2007, da Lei n° 48/2007 de 29 de Agosto, não se encontrava pendente qualquer recurso no Tribunal Constitucional e as decisões por este proferidas já há muito que haviam transitado em julgado.

    12. Os recursos para o Tribunal Constitucional foram interlocutórios e não interpostos da decisão final e nenhum deles suspendeu, interrompeu ou protelou os termos do processo.

    13. Assim, não existia razão para, por efeito desses recursos, se proceder ao prolongamento do prazo de prisão preventiva pelo período de 6 meses, a que se refere o n.º 3 do artigo 215º do CPP .

    14. Nestes termos, é inconstitucional por violação dos artigos 27º, 28º, n.º 2, e 18º, n.º 2, da CRP, a actual norma do n.º 5 do artigo 215º do CPP, quando interpretada no sentido de que todo o qualquer recurso interposto para o Tribunal Constitucional – interlocutório ou de decisão final – no decorrer de um processo crime à ordem do qual se encontra o arguido em situação de prisão preventiva determina necessariamente um acréscimo de 6 meses nos prazos referidos nas alíneas c) e d) do n.º 1 desse artigos, bem como nos correspondentemente previstos nos n.º 2 e 3 desse artigo, mesmo que tal recurso não tenha determinado efectivamente a suspensão ou retardamento do processo.

    O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 10 de Outubro de 2007, indeferiu a petição de habeas corpus, por considerar que o prolongamento de 6 meses no prazo de prisão preventiva, se tiver havido recurso para o Tribunal Constitucional, previsto no actual n.º 5 do artigo 215º do CPP, opera independentemente de se tratar de recurso interlocutório ou de decisão final, pelo que, sendo aplicável, no caso, o prazo de 2 anos e 6 meses, por efeito das disposições conjugadas do artigo 215º, n.ºs 1, alínea c), 2 e 3, do CPP, esse prazo foi acrescido de 6 meses, em virtude dos recursos interpostos para o Tribunal Constitucional, em conformidade com o n.º 5 desse artigo, e, assim, o termo da prisão preventiva só ocorre, se não houver entretanto decisão final, em 18 de Janeiro de 2008.

    Desse acórdão, o arguido veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n° 1 do art. 70° da Lei do Tribunal Constitucional, invocando pretender ver apreciada a constitucionalidade da norma do artigo 215°, n° 5 do CPP, na redacção que lhe foi dada pela Lei n° 48/2007 de 29 de Agosto (correspondente à do n.º 4 desse artigo na redacção anterior), interpretada no sentido de que todo e qualquer recurso para o Tribunal Constitucional - interlocutório ou da decisão final, com efeito suspensivo do processo ou meramente efeito devolutivo - interposto no decorrer de um processo crime à ordem do qual se encontra(m) arguido(s) em situação de prisão preventiva, determina sempre e necessariamente um acréscimo de 6 meses aos prazos referidos nas alíneas c) e d) do n° 1 do aludido artigo 215°, mesmo que tal recurso não tenha determinado a suspensão e ou sequer, o retardamento de tal processo.

    A inconstitucionalidade fora suscitada no requerimento de habeas corpus formulado perante o Supremo Tribunal de Justiça.

    Admitido o recurso, o recorrente apresentou as suas alegações em que formulou as seguintes conclusões:

  2. Nos termos do n° 5 do artigo 215º do CPP, na sua actual redacção, os prazos referidos nas alíneas c) e d) do n° 1, bem como os correspondentemente referidos nos n.ºs 2 e 3, sao acrescentados de 6 meses se tiver havido recurso para o Tribunal Constitucional ou se o processo tiver sido suspenso para julgamento em outro tribunal de questão prejudicial.

  3. São três, portanto, as situações previstas na lei que podem justificar uma prorrogação por mais 6 meses, dos prazos da prisão preventiva.

  4. Isso acontecerá, desde logo, quando o processo tiver sido suspenso para julgamento em outro tribunal de questão prejudicial - o que se compreende.

  5. E acontecerá também, nos termos conjugados do nº 5 do artigo 215º com a alínea d) do seu n.º 1, quando tenha sido interposto recurso para o Tribunal...

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