Acórdão nº 35/11 de Tribunal Constitucional (Port, 25 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelCons. José Borges Soeiro
Data da Resolução25 de Janeiro de 2011
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 35/2011

Processo n.º 206/10

  1. Secção

Relator: Conselheiro José Borges Soeiro

(Conselheira Maria João Antunes)

Acordam, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional I – Relatório

  1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, em que é recorrente o Ministério Público e recorrido A. foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), da decisão daquele tribunal de 5 de Fevereiro de 2010.

  2. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra recusou a aplicação da norma ínsita no artigo 8º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), “quando interpretada no sentido de que consagra uma responsabilidade subsidiária pelas coimas que se efectiva através do mecanismo da reversão da execução fiscal contra gerentes ou administradores da sociedade devedora”, por violação do princípio da intransmissibilidade das penas, consagrado no artigo 30º, nº 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP). E declarou, por isso, “extinta a execução por coimas”.

    A decisão recorrida, e no que ora importa, tem o seguinte teor:

    “ (…) No âmbito do actual regime vamos seguir de perto a jurisprudência mais recente do STA (…) em especial, o último Acórdão (…) que conhecemos, relatado pela Sr.ª Conselheira Dulce Neto, que por aderirmos na íntegra à fundamentação ali aduzida se transcreve parcialmente: « (…) no processo de execução fiscal só podem ser executados os devedores originários e seus sucessores das dívidas tipificadas no art. 148º do CPPT [tributos, coimas e outras sanções pecuniárias fixadas em processo de contra-ordenações tributárias (…)], bem como os garantes que se tenham obrigado como principais pagadores, até ao limite da garantia prestada. Por conseguinte, o processo de execução fiscal pressupõe a existência de uma dívida com a natureza prevista no art. 148º e que tem de estar titulada: certidão extraída do título de cobrança relativa a tributos e outras receitas do estado; certidão de decisão exequível proferida em processo de aplicação de coimas; certidão de acto administrativo que determine a dívida a ser paga; qualquer outro título a que, por lei especial, seja atribuída força executiva. Todavia, no âmbito da execução fiscal está previsto o posterior chamamento á execução de outras pessoas que não constem no título executivo, designadamente dos responsáveis subsidiários (previstos legalmente) pelo pagamento da dívida e que são chamados a pagar a totalidade da dívida do devedor originário, operando-se uma alteração subjectiva da instância executiva; compreensível no que concerne ás dívidas de natureza tributária face à noção de sujeito tributário (art. 18º, nº3 da LGT)».

    (…) a responsabilidade tributária subsidiária reporta-se sempre á dívida que se encontra certificada no título executivo, abrangendo a totalidade dessa dívida, os respectivos juros e demais encargos legais, sendo, assim, uma responsabilidade pelas dívidas que constam do título executivo e que têm de ter, necessariamente, a natureza de tributos, coimas ou demais dívidas ao Estado tipificadas no art. 148º do CPPT.

    É por essa razão que não é preciso outro título executivo para realizar coactivamente a prestação relativamente ao responsável subsidiário tributário e, é por isso que a LGT confere a este o direito de impugnar (graciosa ou contenciosamente), nos termos e com os fundamentos previstos no CPPT (art. 232º, nº4 da LGT). (…)

    Tudo isto para dizer, em síntese, que a reversão da execução provoca, inevitavelmente, a transmissão da responsabilidade pelas dívidas que constam no título executivo para aquele que a lei aponta como responsável subsidiário, dívidas que têm, obrigatoriamente, a natureza de tributos, coimas e dívidas ao Estado tipificadas no art. 148º do CPPT.

    Questão diversa é a de saber da natureza jurídica dessa responsabilidade tributária subsidiária, designadamente da responsabilidade dos gerentes e administradores das sociedades pelo pagamento das dívidas tributárias da sociedade, qual a causa de justificação para essa responsabilização.

    (…) qualquer que seja a posição que se acolha para compreender o fundamento jurídico desta responsabilização tributária subsidiária, não se pode confundir esse fundamento com o objecto dessa mesma responsabilidade. O objecto é a totalidade da dívida certificada no título, os juros de mora e demais encargos legais.

    A esta luz, e visto que o mecanismo da reversão está estruturado somente para a responsabilidade pelas dívidas tributárias que constam no título executivo, parece-nos totalmente indefensável sustentar que as dívidas que o responsável subsidiário é chamado a pagar após a reversão podem ter a natureza e proveniência diferentes daqueles que constam no título, fundada numa responsabilidade própria e autónoma deste.

    (…) ao aplicar a responsabilidade do art. 8º do RGIT, através do mecanismo da reversão, a A.T. não está a interpretar e aplicar o preceito no sentido de que a responsabilidade subsidiária nele prevista é por dívida distinta da que consta do título, designadamente de natureza civil e cariz indemnizatório, pois que assim não fosse não estaria, como está, a utilizar o mecanismo da reversão, o qual está estruturado apenas para os casos de responsabilização por dívidas de outrem e implica, necessariamente, a transmissão da obrigação de cumprimento da sanção que constitui a dívida exequenda.

    . Ora uma tal interpretação, concretizada na execução a que respeita a presente oposição, consubstanciada, necessariamente, numa transmissão de responsabilidade pelas coimas aplicadas à sociedade infractora, é proibida pela Constituição da República Portuguesa no n.º 3 do art. 30º.

    A intransmissibilidade das penas, embora previsto no n.º 3 do art. 30º da C.R.P. para a penas, deve aplicar-se a qualquer tipo de sanções, designadamente às coimas, por ser essa a única solução que se harmoniza com os fins específicos que justificam a aplicação das sanções, que são de repressão e prevenção.

    ‘Os fins das sanções aplicáveis por infracções são exclusivamente de prevenção especial e geral, pelo efeito ressocializador ou a ameaça da sanção levar o infractor a alterar o seu comportamento futuro e conseguir que outras pessoas se abstenham, em face da ameaça da sanção, de praticar factos idênticos aos por ele praticados.

    Por isso, a aplicação de sanção a pessoa a quem não pode ser imputada responsabilidade pela sua prática não é necessária para satisfação dos fins que a previsão de sanções tem em vista e, por isso, é constitucionalmente proibida a sua aplicação por força do art. 18º, nº2, do CRP que estabelece o princípio nuclear da necessidade de qualquer restrição de direitos fundamentais.’

    Por outro lado, porque os revertidos não intervêm no processo de contra ordenação e não têm qualquer possibilidade de contraditar os elementos trazidos pela acusação ou de impugnar ou recorrer do acto de aplicação de coima

    , acrescentando nós, desde logo por falta de legitimidade processual por não ter sido o sujeito passivo da contra ordenação e da aplicação da coima, «a mencionada interpretação é violadora dos direitos de audiência e de defesa que a...

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