Acórdão nº 577/11 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelCons. José Borges Soeiro
Data da Resolução29 de Novembro de 2011
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 577/2011

Processo n.º 415/11

  1. Secção

Relator: Conselheiro José Borges Soeiro

Acordam na 1.ª secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. A., Recorrente nestes autos em que é Recorrido o Ministério Público, foi condenada, por sentença proferida em 1 de Outubro de 2010 pelo 3.º Juízo dos Juízos Criminais do Porto, na pena de três meses de prisão e 170 dias de multa, à taxa diária de €5, tendo a primeira sido substituída pelo número de dias de multa correspondente (90 dias), igualmente à taxa diária de €5, pela prática, em autoria material, de um crime de aproveitamento de obra usurpada, previsto e punível pelos artigos 14.º, n.º 1, e 26.º do Código Penal, e 199.º, n.º 1, com referência aos artigos 195.º, n.º 1 e 197.º, n.º 1, todos do Código dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC). A pena única foi computada em 260 dias de multa, à taxa diária de €5, no montante global de €1.300 (mil e trezentos euros).

A arguida interpôs recurso desta decisão para a Relação do Porto suscitando, no que ora se apresenta com interesse, a inconstitucionalidade material do artigo 199.º, n.º 1 do CDADC, na parte em que remete para o artigo 197.º do mesmo corpo legislativo, por violação dos seguintes princípios constitucionais: princípio da menor intervenção do Direito Penal, princípio da subsidiariedade, princípio da dignidade penal, princípio da proporcionalidade (enquanto princípio da necessidade de incriminação) e princípio da culpa. Por acórdão de 16 de Março de 2011, a Relação negou provimento ao recurso tendo então decidido, relativamente à inconstitucionalidade suscitada, o seguinte:

“A inconstitucionalidade material ocorre quando o conteúdo de uma norma viola preceitos ou princípios constitucionais.

Dispõe o art. 199 do CDADC sob a epígrafe: Aproveitamento de obra contrafeita ou usurpada

1 - Quem vender, puser à venda, importar, exportar ou por qualquer modo distribuir ao público obra usurpada ou contrafeita ou cópia não autorizada de fonograma ou videograma, quer os respectivos exemplares tenham sido produzidos no País quer no estrangeiro, será punido com as penas previstas no artigo 197.

2 - A negligência é punível com multa até 50 dias.

Questiona o recorrente que num Estado de direito democrático o legislador opte por classificar tais condutas como ilícitos criminais e considera que tal opção representa uma desproporcionada limitação dos direitos individuais, mais especificamente da liberdade considerando que seria mais adequado sancionar tal comportamento como contra-ordenação.

Porém, do simples facto de criminalizar os descritos comportamentos em que se enquadra a conduta da recorrente, - cujos factos não são sequer discutidos por esta -, não resulta qualquer violação de normas constitucionais.

Ora, no caso concreto o legislador tomou a opção político-criminal de criminalizar os comportamentos descritos no citado art. 199, pelo que, a posição subjectiva do recorrente perante o preceito, não afecta a respectiva validade e eficácia, já que este não colide com qualquer artigo ou princípio constitucional.

Improcede, pois, este argumento do recurso.”

  1. A. interpôs, então, recurso de constitucionalidade desta decisão, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional (Lei n.° 28/82, de 15 de Novembro, com as alterações posteriores, adiante LTC), para apreciação da invocada inconstitucionalidade do artigo 199.º, n.º 1 do CDDADC, na parte em que remete para o artigo 197.º do mesmo código.

    Convidada a apresentar alegações, veio concluí-las nos seguintes termos:

    “a) a questão da inconstitucionalidade foi já suscitada nas alegações de recurso para o Tribunal da Relação do Porto, nas alíneas c) a i) das conclusões, invocando-se a inconstitucionalidade da concreta aplicação de dispositivos legais, mormente os normativos constantes do art.° 199.°, n.° 1, na parte em que remete para o art.° 197.° do Código dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos (doravante CDADC);

    1. reiteram-se as conclusões ali apresentadas, mormente quanto á violação do princípio da menor intervenção do Direito Penal, do princípio da subsidariedade (ou princípio da máxima restrição das penas), do princípio da dignidade penal e do princípio da proporcionalidade, também conhecido, como princípio da necessidade de incriminação (implícitos no art.° 2.º da CRP, que consagra directamente o principio do Estado de Direito Democrático ou mesmo do n.° 2 do art.° 18.°) ou ainda princípio da culpa (que se pode retirar do art.° 1.º e 25.° da Lei Fundamental);

    2. discorda-se, nos termos já expostos, do erróneo juízo quanto à conformidade constitucional dos art.°s 199.° e 197.° do CDADC;

    3. a Arguida foi punida pela prática de um crime de aproveitamento de obra usurpada, p. e p. pelo art.° 199.°, n.° 1, remissivo ao art.° 197.°, n.° 1, ambos do CDADC, em pena única de multa, no montante de € 1.300,00 (mil e trezentos euros);

    4. o referido normativo — art.° 199.°, n.º 1 do CDADC — consagra como ilícito criminal o aproveitamento de obras originais, sem o pagamento de preço aos respectivos autores, produtores e/ou legítimos representantes, pelos direitos de autor;

      Ora, importa reflectir, à luz da axiologia social reinante, bem como princípios estruturais do Direito Penal, consagrados na Constituição da República Portuguesa, se tal acto de aproveitamento deve ser punido como ilícito criminal;

    5. sendo que, do sopesar dos vários direitos em confronto (dito simplisticamente: a opção do Estado em punir versus o direito à liberdade, integridade pessoal), de acordo com o filtro dos princípios da menor intervenção do Direito Penal, principio da subsidiariedade (ou princípio da máxima restrição das penas), princípio da dignidade penal e princípio da proporcionalidade...

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