Acórdão nº 181/11. 8 PFSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA LEONOR BOTELHO
Data da Resolução07 de Março de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I – RELATÓRIO 1. 1. – Decisão Recorrida No processo comum singular nº --/11.8 PFSTB do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Setúbal, a arguida S.

, melhor identificada nos autos, mediante acusação do Ministério Público, foi submetida a julgamento pela prática, em autoria material, de um crime de aproveitamento de usurpação e/ou aproveitamento de obra usurpada, p. e p. pelos art.ºs 195.º e 199.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, a final, decidiu, para além do mais, nos seguintes termos: «

  1. Condeno a arguida S., pela prática, em autoria material de um crime de aproveitamento de obra contrafeita ou usurpada, p. e p. pelos artigos 195º, nº 1 e 199º, nº 1do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, ocorrido em 02.08.2011, na pena de 2 (dois) meses de prisão e na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à razão diária de € 6 (seis euros), por que vinha acusada nestes autos; b) Substituo a pena de 2 (dois) meses de prisão por 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 6 (seis euros); c) Condeno a arguida, ao abrigo do artigo 6º, nº 1 do DL nº 48/95, de 15/03, na pena única de 220 (duzentos e vinte) dias de multa, à razão diária de € 6 (seis euros), o que perfaz o montante global de € 1.320 (mil, trezentos e vinte euros);» 1. 2. – Recurso 1.2.1. - Inconformada com essa decisão, dela recorreu a arguida, pugnando pela sua revogação e substituição por outra que a absolva da prática do crime imputado, alegando ser inexistente o dano, a pena imposta violar o princípio da proporcionalidade e inexistir queixa do autor da música, o que se traduz na nulidade do processado, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões: «1 - o dano é inexistente nos autos; 2 - logo após a entrega do CD o mesmo foi apreendido e o valor de 5€ foi devolvido a C, o que representa inexistência de dano na esfera jurídica de C.

    3 - o CD foi apreendido e não entrou no mercado, nem sequer foi “consumido” pela referida C.

    4 - a pena aplicada no quantum de 1.320,00 € traduz violação do principio da proporcionalidade entre o alegado “ilícito” e o montante aplicado - violação do art 18- 2 da Lei Fundamental.

    5 - Acresce que o autor da música de nome LR não apresentou queixa pelo que o Estado carece de legitimidade para perseguir a arguida, o que traduz nulidade do processado.

    Foram violados os arts. 18-2 da Lei Fundamental, 195, 199 e 197 do Código de Direitos de Autor e dos Direitos Conexos e 1º do Código Penal.

    Revogando a Douta Sentença far-se-á a mais Lídima Justiça!» 1.2.2. - O Ministério Público respondeu, sustentando a improcedência do recurso, lavrando as seguintes conclusões: «1. A arguida S. veio interpor recurso da douta sentença proferida nos presentes autos que a condenou, como autora material, pela prática de um crime de aproveitamento de obra contrafeita ou usurpada, p. e p. pelos artigos 195º, nº 1 e 199º, nº 1do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, ocorrido em 02.08.2011, nas penas parcelares de 2 (dois) meses de prisão, substituída por 60 dias de multa, e na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa, e na pena única de 220 (duzentos e vinte) dias de multa, à razão diária de € 6, o que perfaz o montante global de € 1.320.

    1. Discorda a recorrente da sentença proferida nos presentes autos, mas sem que fundamente a sua discordância e alegando de forma conclusiva que: - deve ser absolvida, porquanto o «dano é inexistente(…) já que o CD foi apreendido e não entrou no mercado»; - a pena que lhe foi imposta traduz uma violação do princípio da proporcionalidade; - o autor da música, de nome LR, não apresentou qualquer queixa, pelo que o estado carece de legitimidade para perseguir a arguida, o que se traduz numa nulidade do processado.

    2. Estatui o art. 199º do CDADC que “1. Quem vender, puser à venda, importar, exportar ou por qualquer modo distribuir ao público obra usurpada ou contrafeita ou cópia não autorizada de fonograma ou videograma, quer os respectivos tenham sido produzidos no País quer no estrangeiro, será punido com as penas previstas no artigo 197º.» 4. É pacífico que o tipo objectivo deste ilícito criminal integra todas as formas de comercialização de cópias não autorizadas de fonogramas.

    3. O crime em apreço consuma-se com o acto de colocar à venda, à disposição do consumidor, para que se preencham os elementos objectivos do tipo legal do artigo 199º, nº 1, CDADC. Tal implica, como vem sendo entendido pela jurisprudência, a efectiva colocação à venda das cópias não autorizadas, não se exigindo contudo que se prove o próprio acto da venda em si, ou seja, não é necessário que o agente realize uma venda para que este tipo de crime se mostre consumado.

    4. Neste sentido, veja-se o Ac. RE de 19.11.2013, disponível in www.dgsi.pt, com o qual se concorda na íntegra, considerando-se aí que «ainda que não resulte provado nos autos, que nenhum consumidor adquiriu uma das cópias não autorizadas, o facto de o agente se encontrar em local de venda, com intenção de venda e, na posse de cópias ilegais, preenche os elementos típicos do crime em questão».

    5. No caso dos autos, resulta da matéria de facto dada como provada (e que não foi impugnada pela recorrente) que a arguida foi detectada num local público de venda, no caso, no recinto da Feira de Santiago, em Setúbal, expondo numa banca um fonograma, em formato Compact Disc Recordable ("CD-R"), que reproduzia um CD do autor LR, com a intenção e proceder à sua venda, o que efectivamente fez, já que se provou ainda que a mesma vendeu o aludido CD pelo preço de € 5, a C.

    6. Da factualidade dada como provada resulta assim manifesto que se mostram preenchidos todos os elementos objectivos e subjectivos do tipo legal de crime de aproveitamento de obra contrafeita ou usurpada, na sua forma consumada, previsto e punido pelo artigo 199º, nº 1 do CDADC, verificando-se a efectiva lesão ou dano do bem jurídico que o ilícito em causa visa proteger, e no caso, a obra do autor LR.

    7. No âmbito do direito penal português, a regra é a de que os crimes possuem natureza pública e não particular ou semi-pública.

    8. Com efeito, estatui o art. 48º do CPP quer «O Ministério Público tem legitimidade para promover o processo penal, com as restrições constantes dos arts. 49º a 52.».

    9. E preceitua o nº 1 do art. 49º do CPP que «Quando o procedimento criminal depender de queixa, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas deem conhecimento do facto ao Ministério Público, para que este promova o processo».

    10. Assim, sempre que o Código Penal, ou qualquer outro normativo penal preveja a existência de um tipo legal de crime, e nada disser quanto ao facto de o procedimento criminal depender de queixa ou de acusação particular, sabemos, de antemão, que o crime tem natureza pública.

    11. No caso sub judicie, e conforme resulta do disposto nos art. 197º e 199º, nº 1, do CDADC, os ilícitos criminais aí previstos não dependem de queixa, razão pela qual assumem natureza pública e o Estado detém total legitimidade para instaurar o respectivo procedimento criminal.

    12. O crime imputado à arguida é abstratamente punível com pena de prisão até 3 anos e multa de 150 a 250 dias (artigos 195º, nº 1, 199º, nº 1 e 197º, nº 1, todos do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos).

    13. No caso dos autos, considerou a Mmª Juiz, para efeitos de determinação da medida da pena que: - a culpa é elevada, face à resolução criminosa da arguida, que agiu com dolo direto; - o grau de ilicitude dos factos, atendendo em especial ao diminuto valor (de € 5) e que veio a ser livremente restituído à sua compradora.

      - a ausência de antecedentes criminais .

    14. Sopesando todas estas circunstâncias, considerou a Mmª Juiz a quo adequada a aplicação à arguida de uma pena de prisão e de multa situadas muito próximo dos limites mínimos da moldura penal abstractamente aplicável, e que ficou numa pena de 2 meses de prisão, substituída por 60 dias de multa e na pena de 160 dias de multa, à taxa diária de € 6 (atendendo à natureza da sua atividade – comerciante em feiras e conjugado com a sua idade – 39 anos, encontrando-se em idade laboral ativa).e, em cúmulo jurídico, numa pena única de 220 dias de multa, à taxa diária de €6,00.

    15. Em nosso entender, as penas parcelares bem como a pena única concretamente aplicadas à arguida, atenta a moldura penal abstractamente aplicável, mostra-se perfeitamente adequada, justa e equilibrada, respondendo cabalmente às exigências de prevenção geral e especial, não ultrapassando também a medida da culpa.

    16. Concluímos assim que a decisão do Tribunal não violou qualquer princípio da proporcionalidade na fixação do quantum da pena, por entender que se afigura justa e adequada a pena única que aqui lhe foi aplicada.

      Termos em que, e no mais que V. Exas. doutamente suprirem, deve manter-se na íntegra a sentença objecto de recurso! V. Exas. farão, porém, a habitual Justiça!» 1.2.3. - Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que se reporta o art.º 416.° do C.P.P., emitiu parecer pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso e da manutenção da sentença recorrida.

      1.2.4. - Cumprido o disposto no art.º 417.°, n.º 2, do C.P.P., sem resposta, procedeu-se a exame preliminar, após o que, colhidos os vistos, foram os autos a conferência, de harmonia com o preceituado no art.º 419.°, n.° 3, do C.P.P..

      * II – FUNDAMENTAÇÃO 2. 1. – Objecto do Recurso Dispõe o art.º 412º, nº 1, do C.P.P, que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.

      E no n.º 2 do mesmo dispositivo legal...

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