Acórdão nº 347/01 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Julho de 2001

Magistrado ResponsávelCons. Artur Maurício
Data da Resolução10 de Julho de 2001
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 347/01

Proc. nº 299/01

TC – 1ª Secção

Relator: Consº. Artur Maurício

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 – E..., identificado nos autos, foi pronunciado em decisão instrutória proferida em 22.05.1998 pelo Tribunal Judicial da Comarca de Cascais, como autor material de um crime agravado de tráfico de substâncias estupefacientes, p.p. pelos artigos 21º, nº. 1, 24º, alíneas b), c) e j) do Decreto-Lei nº. 15/93, de 22 de Janeiro e um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 275º, nºs. 1 e 2 do Código Penal.

No âmbito do inquérito, ao abrigo do disposto no artigo 187º do Código de Processo Penal, foi judicialmente ordenada a intercepção e gravação de comunicações telefónicas efectuadas ou recebidas em determinados postos, por períodos expressamente definidos e com sucessivas prorrogações, concedidas a requerimento do Ministério Público, tendo sido apresentada em 27/06/97 a transcrição dos registos efectuados e terminados em 15/11/96.

Da decisão instrutória recorreu o arguido, invocando a nulidade das intercepções telefónicas ordenadas e realizadas no âmbito do inquérito, por alegada violação dos artigos 187º e 188º do Código de Processo Penal, recurso a que não foi atribuído efeito suspensivo.

Por acórdão de 20.04.1999, o Tribunal de Círculo Judicial de Cascais absolveu o arguido E... pela prática de um crime de detenção de arma proibida, mas condenou-o pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p.p. pelos artigos 21º, nº. 1 do Decreto-Lei nº. 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 7 anos de prisão e, em cúmulo com a pena aplicada num outro processo, na pena única de 9 anos de prisão.

O ora recorrente deixou este acórdão condenatório transitar em julgado (cfr. fls. 317 a 318 e 247 a 248 dos autos).

Por acórdão de 20.03.2001 do Tribunal da Relação de Lisboa foi negado provimento ao recurso da decisão instrutória e julgada improcedente a questão prévia suscitada então pelo Ministério Público, no sentido da inutilidade do recurso por ter transitado em julgado o acórdão condenatório.

Inconformado, o arguido interpôs recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo do artigo 70º, nº.1, alínea b) da Lei nº. 28/82, de 15 de Novembro com as alterações que lhe introduziu a Lei nº. 13-A/98, de 26 de Fevereiro.

Admitido o recurso, apresentou o arguido as competentes alegações, tendo concluído do seguinte modo:

"1 – O douto Tribunal da Relação interpretou o inciso imediatamente contido no artº. 188º nº. 1 do CPP, com o sentido de que as intercepções telefónicas poderão ser juntas ao processo (e o juiz tomar conhecimento delas) decorridos meses após terminar o período de autorização da intercepção.

2 – Mais interpretou aquela expressão contida no artº. 188º nº. 1, com o sentido de que o juiz poderá autorizar, por várias vezes, a prorrogação dos prazos de intercepção, sem que, findo cada período de autorização, as intercepções não sejam dadas a conhecer ao juiz a fim de este avaliar da necessidade ou não da continuação da intercepção e em consequência ordenar a junção das transcrições com relevo para os autos e a destruição das que se mostrem sem interesse.

3 – Na verdade, nos presentes autos, foram interceptados os postos telefónicos com os nºs. 7609543 e 2123459, desde 3/11/95 a 7/11/96.

4 – Para além de o juiz não ter procedido a um adequado controlo no decorrer desse período (1 ano e 3 meses), as intercepções só lhe foram presentes no dia 27/6/97, ou seja, mais de 1 ano após o início das escutas.

5 – A total ausência de controlo jurisdicional é patenteada na circunstância de a P.J. a fls. 1096 ter referido o desinteresse na continuação da intercepção telefónica e não obstante se ter procedido à sua continuação.

6 – Acresce ainda que só após o Mº Pº, conforme fls. 907, ter solicitado a junção aos autos das intercepções é que a P.J., de imediato, procedeu à sua transcrição.

7 – A escuta telefónica envolve sempre uma intromissão na área dos direitos fundamentais dos cidadãos, devendo, em consequência, o julgador interpretar restritivamente as normas relativas a este meio de obtenção de prova.

8 – E assim sendo a interpretação a dar à expressão "imediatamente", no contexto das formalidades das operações telefónicas, terá de ser outra que não aquela que foi dada pelo Tribunal da Relação.

9 – Foi esta a interpretação que foi sufragada pelo douto acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional – recurso 407/97 de 21 de Maio.

10 – Foi também assim que decidiu recentemente o Supremo Tribunal de Justiça no processo nº 1145/98, da 5ª secção.

11 – Aliás, também se decidiu nesse douto aresto que as intercepções sempre seriam nulas porquanto o critério de selecção das transcrições foi da autoria da P.J. enquanto a lei impunha que fosse o juiz.

12 – Também por esta parte, ainda que por outros motivos, a interpretação dada pelo Tribunal da Relação sempre seria inconstitucional.

13 – Resulta assim claro que a interpretação dada pelo Tribunal da Relação à norma constante do preceituado no disposto no artº. 188º nº. 1 do CPP é inconstitucional por violação do disposto no artº. 32º nº 1 e 34º nºs 1 e 4 da CRP.

14 – E sendo assim como consequência deverá a referida norma, segundo aquela interpretação, ser declarada inconstitucional e em consequência declararem-se inválidos todos os actos que dependeram das intercepções telefónicas realizadas, conforme artigos 122º e 189º do CPP."

O Procurador-Geral Adjunto em exercício neste Tribunal apresentou também as suas alegações...

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