Acórdão nº 305/01 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Junho de 2001

Magistrado ResponsávelCons. Artur Maurício
Data da Resolução27 de Junho de 2001
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 305/01

Proc. nº 412/00

TC – 1ª Secção

Relator: Consº. Artur Maurício

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 – M..., com os sinais dos autos, foi pronunciada em decisão instrutória proferida em 1.06.1994, pelo Tribunal Judicial da Comarca de ..., como autora material de um crime de aborto, então p.p. pelo artigo 139º, nºs. 2 e 6 do Código Penal, na redacção dada pela Lei nº. 6/84, de 11 de Maio.

A fls. 194 a 196 vieram o viúvo e filho menor da ofendida, que faleceu na sequência das manobras abortivas praticadas pela arguida, deduzir pedido de indemnização civil alicerçado unicamente nos danos materiais e morais decorrentes do falecimento da ofendida por força das ditas "manobras".

O Tribunal de Círculo da ..., por acórdão proferido em 28.10.1994, veio a condenar a arguida como autora de um crime de aborto na pena de 18 meses de prisão, julgando ainda improcedente o pedido de indemnização civil, nos seguintes termos:

"Do pedido de indemnização civil:

Neste âmbito importa averiguar se os factos dados como provados integram os pressupostos da responsabilidade civil por facto ilícito.

Nos termos do artigo 483º, nº. 1, do Código Civil, os pressupostos de cuja verificação depende a existência da aludida responsabilidade são:

A acção, a antijuricidade, a culpa do agente, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.

Acontece que a total falta de prova de factos que integrem pelo menos o nexo de causalidade, tanto quanto é certo não se ter demonstrado que a septicemia tenha sido causada pelo aborto, conduz à improcedência desta acção".

"(...)

Na improcedência do pedido cível absolve-se a demandada dos pedidos contra ela formulados" (cfr. fls. 264 a 269).

Inconformada com a condenação penal, a arguida interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça que, por acórdão de 7.03.1996 ordenou "o reenvio do processo para novo julgamento relativamente à totalidade do seu objecto ..."

O Tribunal de Círculo de Coimbra procedeu a novo julgamento, tendo, por acórdão de 4.12.1998, condenado a arguida como autora material de um crime de aborto p.p. pelo artigo 139º do Código Penal, na pena de 2 anos e 3 meses de prisão efectiva, suspendendo-se a execução da pena pelo período de 5 anos, "com a condição de pagar a indemnização a seguir referida a J...:

1.000.000$00, até ao último dia do mês imediatamente a seguir ao trânsito da presente sentença;

50. 000$00, no final de cada um dos meses que, durante o período da suspensão de pena, se seguirem".

De novo inconformada, recorreu a arguida para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão de 19.01.2000, no que à questão da suspensão da execução da pena respeita, decidiu:

".........................................................................................................................

A fixação da indemnização na sentença surge como condicionante da suspensão da execução da pena.

A decisão foi proferida em 4/12/1998, como se verifica a fls. 496.

O art. 82º - A do Código de Processo Penal/rev. permite ao Tribunal arbitrar uma quantia a título de reparação. Tal preceito legal estava em vigor à data da sentença, atento ao disposto no art. 10º/2 da Lei nº. 59/98, de 25/8. Por seu turno o art. 50º/2 do Código Penal permite condicionar a suspensão da pena ao cumprimento de deveres. A suspensão da pena está justificada no acórdão designadamente quando se escreve "... a pena suspensa não repugna completamente, quer a prevenção geral quer a prevenção especial desde que, evidentemente, tal suspensão seja acompanhada de "algo" que ajude a reparar o "mal do crime" (lembrando à arguida que não pode nem deve reincidir) e que, simultaneamente satisfaça, embora num limiar mínimo, as supra referidas exigências de prevenção geral. E esse "algo" é claramente o pagamento de uma indemnização ao lesado.

Não se vê, consequentemente, que esteja violado o direito de propriedade privada, do art. 62º da Constituição da República Portuguesa, como vem invocado nem qualquer direito ou interesse legalmente protegido, como se alega invocando o art. 205º/2 da Constituição da República Portuguesa."

Em 14.02.2000, a arguida apresentou "reclamação por nulidade" do acórdão supra referido, reclamação indeferida por acórdão de 5.04.2000, tendo, seguidamente, interposto recurso para este Tribunal (cfr. fls. 618 e 619).

O recurso foi admitido, mas o objecto do recurso, nos termos do despacho de fls. 623 ficou "delimitado ao conhecimento da norma do artigo 51º nº. 1 do Código Penal, na interpretação que a recorrente atribui à decisão recorrida"

No requerimento de interposição do recurso e a propósito desta norma escrevera a recorrente:

"C – Alínea a) do nº 1 do artigo 51º do Código Penal por violação dos princípios fundamentais do Estado de direito Democrático, do direito de propriedade privada consagrado no artigo 62º da Constituição da República Portuguesa e do respeito e obrigatoriedade pelas decisões dos tribunais, consagrado no artigo 205º nº 2 da lei Fundamental na interpretação – acolhida, ainda que implicitamente, nas doutas decisões recorridas – segundo a qual se permitiria ao tribunal subordinar a suspensão da execução da pena de prisão ao pagamento pelo condenado de uma indemnização a alguém que a não pediu ou cujo pedido foi julgado improcedente por decisão judicial transitada em julgado."

A recorrente apresentou alegações que concluiu...

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