Acórdão nº 719/04 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Dezembro de 2004

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução21 de Dezembro de 2004
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 719/04

Processo n.º 608/03

  1. Secção

    Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

    Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

    A – Relatório

    1 – A. e mulher B. demandaram em processo de execução perante o Tribunal Judicial da Comarca de Amadora C. e mulher D., E., F., G., H. e I..

    2 – Todos os executados deduziram embargos à execução. O Tribunal de 1ª instância recebeu os embargos deduzidos pelos primeiros executados e rejeitou, por apresentados fora de prazo, os deduzidos pelos restantes cinco executados.

    3 – Do despacho que recebeu os embargos recorreram os exequentes/embargados para o Tribunal da Relação de Lisboa. Por seu lado, do despacho que rejeitou os embargos que haviam deduzido recorreram para o mesmo Tribunal de 2ª instância os respectivos executados/embargantes. O Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento a ambos os recursos.

    4 – Os exequentes A. e mulher, colocados perante a impossibilidade legal de recorrerem dessa decisão para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) decorrente dos artigos 734º, n.º 1, e 754º, n.º 2, do CPC, interpuseram então recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), pretendendo a apreciação da inconstitucionalidade do artigo 198º, n.º 3, do Código de Processo Civil (CPC), por violação do princípio da igualdade.

    5 – Por seu lado, os executados/embargantes, que viram rejeitados os embargos que deduziram (os últimos cinco executados acima identificados), recorreram daquele acórdão da Relação de Lisboa para o STJ, suscitando a questão de inconstitucionalidade material e orgânica do n.º 3 do art.º 816º do CPC, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, bem como a questão da ilegalidade material do mesmo preceito, por violação de lei com valor reforçado como era a lei de autorização sob invocação da qual fora emitido, tendo este Supremo negado provimento ao recurso.

    6 – Invocando o disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 70º da LTC, estes mesmos executados/embargantes recorreram deste acórdão do STJ para o Tribunal Constitucional, alegando quer a inconstitucionalidade do n.º 3 do art.º 816º do CPC, quer a sua ilegalidade, nos mesmos termos em que antes o fizeram nas alegações para o STJ, terminando, todavia, apenas a pedir o julgamento de inconstitucionalidade do n.º 3 do art.º 816º do CPC.

    7 – Na parte pertinente ao conhecimento do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade interposto pelos exequentes A. e mulher, o acórdão da Relação de Lisboa – que é, no seu recurso, a decisão recorrida - , para negar provimento ao seu recurso, abonou-se nas seguintes considerações:

    «Face ao disposto 710º do C. P. Civil, importa conhecer, em primeiro lugar, do agravo, interposto pelos embargados, do despacho do Sr. Juiz que considerou tempestiva a apresentação, em 3 de Dezembro de 2001, da petição dos embargos deduzidos por C..

    Nos termos do disposto no artigo 816º do C. P. Civil, os embargos podem ser deduzidos no prazo de vinte dias, a contar da citação, sendo motivo para a sua rejeição a dedução fora de prazo - art. 817°, n.º 1, al. a).

    Os executados ora embargantes foram todos citados na acção executiva em 2.11.2001 em localidades situadas fora da comarca.

    Face ao disposto no artigo 252°-A, n.º 1, b), do Código Civil tinham os executados uma dilação de 5 dias que acrescia ao prazo de 20 dias para deduzir embargos à execução.

    Tendo o embargante e executado C. sido citado em 2.11.2001, na sua própria pessoa, fora da comarca devia embargar a execução até 27-11-01 a que podiam acrescer os prazos indicados no art. 145º, desde que paga a multa aplicável.

    Dispõe, porém, o art. 252°-A, n.º 1, al. a, e n.º 4 do C. P. Civil que, quando a citação tenha sido realizada em pessoa diversa do réu, nos termos do n.º 2 do artigo 236º e dos n.º s 2 e 3 do art. 240°, ao prazo de defesa do citando acresce uma dilação de cinco dias, incumbindo à secretaria cumprir o disposto no art. 241º.

    O executado C. não teria, em princípio, esta dilação porque o aviso de recepção foi assinado por si. Porém, quanto ao mesmo, a secção cumpriu o disposto no art. 241º, indicando-lhe que tinha mais 5 dias para apresentar defesa.

    Errou, pois, a secretaria ao indicar ao executado que tinha mais 5 dias para deduzir embargos.

    Nos termos do disposto no artigo 161º, n.º 6, do C. P. C. os erros e omissões praticados pela secretaria judicial não podem em qualquer caso prejudicar as partes. Por isso, por aplicação do disposto no art. 198º, n.º 3, do Código de Processo Civil, podia o executado apresentar a petição de embargos até 3/12/02.

    Face ao exposto, improcedem todas as conclusões do agravante, não merecendo censura o despacho recorrido.».

    8 – Por sua vez, o acórdão do STJ que negou provimento ao recurso interposto pelos referidos recorrentes estribou-se na seguinte fundamentação:

    Como resulta das conclusões a questão suscitada no agravo é só uma e diz respeito a saber se o disposto no n.º 3 do art.º 816º do C.P.C. é inconstitucional, material e organicamente como pretendem os recorrentes.

    Situando a questão verifica-se que, embora todos os executados tenham sido citados em 2/11/2001, todos beneficiam da dilação de 5 dias em virtude de a citação ter ocorrido em área fora da comarca – art. 252º-A, n.º 1, b), do C.P.C.

    Parecer, só aos executados D. e C. acresce mais 5 dias de dilação, a 1ª por ter sido citada em pessoa diversa (art.º 252º-A, n.º 1, a), e n.º 4, do C.P.P.), o 2º porque, por lapso da secretaria foi notificado nos termos do disposto no art.º 241º, de que dispunha de mais 5 dias para sua defesa.

    Assim sendo e tendo em conta o prazo de 21 dias (+ dilações) a que se refere o art.º 816º, n.º 1, e que corre individualmente para cada executado, visto que não se aplica o disposto no n.º 2 do art.º 486º (n.º 3 do citado art.º 816º), o prazo para a dedução dos embargos terminava em 3/12/2001 para os 1ºs executados e em 27/11/2001 para os restantes.

    Como a petição de embargos, conjunta, deu entrada em 3/12/2001, tinha já decorrido o prazo quanto aos 5 últimos executados, embargantes, razão porque, quanto a eles, foram os embargos liminarmente rejeitados ao abrigo do disposto no art.º 817º, n.º 1, a), do C.P.C..

    Ora, à míngua de outra argumentação, vieram os 5 últimos executados/embargantes invocar a inconstitucionalidade orgânica e material do n.º 3 do art.º 816º do C.P.C., porquanto a autorização legislativa concedida pela Assembleia da República ao Governo através da Lei nº 33/91, de 18/8, não autorizar o executivo a alterar o art.º 816º da forma como o fez o D.L. n.º 329-A/95, de 12/12, acrescendo à referida inconstitucionalidade uma “ilegalidade material na medida em que existe violação da lei com carácter reforçado (lei de autorização), pois o citado D.L. infringe as determinações suplementares da lei de autorização”.

    Em primeiro lugar, nem se entende quais sejam as “determinações suplementares” da Lei nº 33/95, visto que não constam do texto de diploma e os agravantes não nos dizem quais sejam. Não existe, assim, tal ilegalidade material.

    E não existe também a alegada inconstitucionalidade orgânica como se vai tentar demonstrar.

    De facto, antes da reforma introduzida pelo D.L. nº 329-A/95, o art.º 816º do C.P.C. fixava o prazo de 10 dias para a dedução de embargos de executado, a contar da citação, e não continha o actual n.º 3. Discutia-se, então, na doutrina e jurisprudência se, no caso de serem vários os executados/embargantes, teria ou não aplicação o disposto no art.º 486º, n.º 2, do C.P.C., por força da remissão genérica contida no art.º 801º do mesmo diploma. Isto é, discutia-se se os embargos podiam ser apresentados em juízo por qualquer dos embargantes até ao termo do prazo que começou a correr em último lugar.

    Defendiam a aplicação do n.º 2 do art.º 486º o Prof. Alberto dos Reis (Processo II-46) e o Dr. Lopes Cardoso (Manual-295). Também na jurisprudência se defendia esta orientação como por exemplo no Ac. STJ de 27/7/45 (Bol. Of. V-330) ou no Ac. da R.L. de 28/11/91 (B.M.J. 411-641).

    Em sentido contrário pronunciaram-se Lebre de Freitas (Parecer publicado na Col. J. 1989-3-41 e Acção Executiva 1993-194) e Anselmo de Castro (A Acção Executiva Singular, Comum e Especial –1970-311 e 312), além do Ac. da R.C. de 25/6/96 (B.M.J. 458-409).

    Com a reforma do processo civil operada pelo D.L. nº 329-A/95, alargou-se o prazo para a dedução dos embargos de 10 para 20 dias e acrescentou-se ao art.º 816º do C.P.C. o seu n.º 3, onde expressamente se resolveu a questão doutrinária e jurisprudencial referida, optando-se pela corrente que entendia não ser aplicável aos embargos o que se dispunha no n.º 2 do art.º 486º do mesmo diploma legal.

    Portanto, visto que o novo número do preceito se destinou claramente a resolver o conflito assinalado, não coloca que se tenha o n.º 3 do art.º 816º como norma interpretativa, na medida em que interpreta como determinar o termo do prazo estabelecido no n.º 1 quando sejam vários os executados/embargantes, ou, se se quiser, na medida em que interpreta o n.º 2 do art.º 486º, no sentido de que não é aplicável à dedução de embargos de executado.

    Seja como for, o certo é que antes da introdução desse n.º 3 eram defensáveis as duas orientações acima referidas e eram aplicadas em concreto pelos Tribunais uma e outra, de modo que é pelo menos interpretativa a razão de ser da introdução do novo número.

    (Col. Ac. do STJ de 27/5/1999 – B.M.J. n.º 487-269, cujo sumário é o seguinte “É interpretativa a norma do n.º 3 do art.º 816º do C.P.C., introduzida pelo D.L. n.º 329-A/95, de 27/12”).

    No entanto, conforme alegam os agravantes, trata-se de preceito inovador e que contém matéria da competência reservada da Assembleia da República, conforme resultaria dos art.ºs 164º, l) e 169º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa. É todavia estranho, ou talvez não, a citação dos referidos dispositivos...

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