Acórdão nº 334/05 de Tribunal Constitucional (Port, 22 de Junho de 2005

Data22 Junho 2005
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 334/2005

Processo n.º 758/04

  1. Secção

Relatora: Conselheira Maria João Antunes

Acordam na 1.ª secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. Nos presentes autos de recurso, o Banco A. recorreu para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 25 de Março de 2004, que a condenou ao pagamento de uma coima no valor de 1 250 €.

    2. Por decisão da Delegada em Leiria do Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho (IDICT), a recorrente foi condenada ao pagamento de uma coima, no valor de 10 000 €, por infracção ao disposto no artigo 10º do Decreto-Lei nº 421/83, de 2 de Dezembro, conjugado com o disposto nos artigos 1º e 2º do Despacho, publicado no Diário da República, II Série, em 27 de Novembro de 1992, e no modelo publicado em anexo na mesma data e local.

      Interposto recurso desta decisão para o Tribunal do Trabalho de Leiria, esta instância absolveu a recorrente da infracção, por ter julgado inconstitucional a 2ª parte do nº 2 do artigo 10º daquele Decreto-Lei, o que justificou o recurso que o Ministério Público então interpôs para o Tribunal Constitucional.

    3. Reformulada a sentença do Tribunal do Trabalho de Leiria, de acordo com o juízo formulado pelo Tribunal Constitucional, a recorrente foi condenada ao pagamento de uma coima de 7 500 €, por aplicação conjugada do disposto nos artigos 10º, nº 2, e 11º, nº 1, 2ª parte, do Decreto-Lei nº 421/83, de 2 de Dezembro e no artigo 9º, nº 1, alínea d), da Lei nº 116/99, de 4 de Agosto.

      Desta decisão foi interposto recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra. Depois de notificada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, do parecer do Ministério Público junto deste Tribunal, a recorrente respondeu, levantando questões prévias e supervenientes, nomeadamente as seguintes:

      "Após a interposição do recurso pela ora recorrente, entrou em vigor o Código do Trabalho (cfr. artigo 3.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto).

      Ora,

      Estatui o artigo 3., n.º 2 do Decreto-Lei 433/82, aplicável ex vi do artigo 615.º do Código do Trabalho, que 'Se a lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido (...)'.

      No Auto de Notícia é imputada ao Banco A. uma infracção ao estatuído no artigo 10.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 421/83, de 2 de Dezembro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 398/91, de 16 de Outubro, com a alteração introduzida pelo artigo 14.º da Lei n.º 118/99, de 11 de Agosto.

      Tal infracção é classificada de muito grave, nos termos do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 421/83, com a redacção introduzida pela Lei n.º 118/99 de 11 de Agosto, a que corresponde uma coima de € 13.716,94 a € 44.891,81 em caso de dolo, nos termos do 7.º, n.º4. alínea d) da Lei 116/99, de 4 de Agosto.

      A referida legislação foi expressamente revogada pelas alíneas i) e aa) do n.º1, do artigo 21.º da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto.

      Importa, então, apurar se o novo regime se mostra mais favorável à mesma.

      Ora,

      Os mesmos comportamentos são agora previstos e punidos como contra-ordenação grave pelas disposições conjugadas dos artigos 204.º e 663.º, n.º2 do Código do Trabalho, a que corresponde uma coima, nos termos do artigo 620.º, n.ºs 1 e 3, alínea e), de 15 UC a 40 UC, ou seja, calculada com base no valor da Unidade de Conta fixado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de Dezembro (€ 79,81), entre € 1197,15 e € 3192,4.

      Verifica-se, deste modo, que a legislação agora em vigor é mais favorável à Recorrente, pelo que é esta aplicável (...).

      O Auto de Notícia que deu origem ao presente processo de contra-ordenação foi levantado em 4 de Dezembro de 2000, reportando-se os factos no mesmo imputados ao Banco A., a esse mesmo dia.

      À data dos factos, no que respeita ao regime da prescrição, encontrava-se em vigor a versão do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Fevereiro, anterior à alteração introduzida pela Lei n.º 109/2001, de 24 de Dezembro.

      Ora,

      É pacificamente entendido na doutrina e na jurisprudência que o instituto da prescrição (penal, contravencional e contra-ordenacional) assume natureza substantiva, pelo que, de acordo com o estatuído no artigo 3.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, terá que se aplicar a lei mais favorável ao arguido.

      Vejamos então:

      Nos termos do artigo 27.º do referido Decreto-Lei n.º 433/82 - versão anterior à Lei n.º109/2001, de 24 de Dezembro, o prazo de prescrição é de:

      - Dois anos, quando o máximo da coima é superior a 750.000$00;

      - Um ano, nos restantes casos.

      Como referimos supra, o artigo 663.º, n.º2, do Código do Trabalho qualifica a infracção imputada à arguida como contra-ordenação grave, à qual é abstractamente aplicável, no caso de empresa com volume de negócios igual ou superior a 10.000.000 de euros, coima entre 15 UC a 40 UC, ou seja, calculada com base no valor da Unidade de Conta fixado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de Dezembro (€ 79,81), entre € 1197,15 e € 3192,4.

      Nestes termos,

      De acordo com a moldura da coima aplicável ao caso sub judice, o prazo de prescrição é o da alínea b) do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º433/82 na versão anterior à Lei n.º 109/2001, de 24 de Dezembro, ou seja, um ano.

      Ora,

      A prescrição do procedimento por contra-ordenação pode suspender-se ou interromper-se nos casos expressamente previstos nos artigos 27.º - A e 28.º do Decreto-Lei n.º433/82.

      Há que ter igualmente em consideração o decidido nos Acórdãos n.º 6/2001 e 2/2002, ambos do Supremo Tribunal de Justiça para fixação de jurisprudência, publicados respectivamente nos Diários da República de 30/03/01 e de 05/03/02, que assentaram o seguinte:

      '(..) a regra do n.º 3 do artigo 121.º do Código Penal, que estatui a verificação da prescrição do procedimento quando, descontado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição, acrescido de metade, é aplicável, subsidiariamente, nos termos do art. 32.º do D.L. 433/82, ao regime prescricional do procedimento contra-ordenacional.'

      E

      '(..) o regime de suspensão da prescrição do procedimento criminal é extensivo, com as devidas adaptações, ao regime de suspensão das contra-ordenações, previsto no art. 27.º - A do D.L. 433/82 na redacção dada pelo D.L. 244/95, de 14/09.'

      O artigo 121.º do Código Penal estabelece os casos de interrupção da prescrição e, no seu n.º 3, estatui o seguinte:

      'A prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal acrescido de metade. Quando, por força de disposição especial, o prazo for inferior a dois anos o limite máximo da prescrição é de dois anos '.

      No caso sub judice a prescrição do procedimento interrompeu-se, pelo menos, nos termos da alínea c), do n.º1, do artigo 28.º do Decreto-Lei em análise.

      No entanto, a interrupção da prescrição é, neste caso, irrelevante, porquanto de acordo com a citada jurisprudência, a prescrição terá sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade.

      Ou seja, in casu, a prescrição do procedimento contra-ordenacional verificar-se-á, se desde a data da prática dos factos já tiverem decorrido um ano e meio e não haja lugar à suspensão.

      Tendo em conta que os factos ocorreram em 4 de Dezembro de 2000 (cfr. Auto de Notícia), a prescrição ter-se-ia consumado em 4 de Junho de 2002, a não ser que tenha havido suspensão, cujo tempo teria que ser ressalvado.

      No que respeita à suspensão, como já se referiu supra, por força do Acórdão 2/2002, o regime de suspensão da prescrição do processo criminal é extensivo, com as devidas adaptações, ao regime de suspensão das contra-ordenações, previsto no artigo 27.º - A do Decreto-Lei n.º 433/82, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro.

      Daí que tenha de se aplicar, com as devidas adaptações, o disposto na alínea b), do n.º 1 do artigo 120.º do Código Penal, nos termos da qual, o procedimento contra-ordenacional suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, 'a partir da notificação da acusação ou, não tendo esta sido deduzida, a partir da notificação da decisão instrutória que pronunciar o arguido ou do requerimento para aplicação de sanção em processo sumaríssimo; '.

      Ora, no caso dos autos, a Arguida foi notificada do despacho de admissão do recurso proferido pelo Ex.mo Sr. Doutor Juiz do Tribunal do Trabalho de Leiria em 23/01/2003.

      Nestes termos, verifica-se que o termo do prazo de um ano e meio da prescrição ocorreu em 4 de Junho de 2002, logo em data anterior à notificação ao arguido da apresentação dos Autos pelo Ministério Público ao Tribunal do Trabalho de Leiria, tendo decorrido o prazo de prescrição de um ano meio antes de ocorrer a suspensão do mesmo.

      Neste sentido veja-se o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 28 de Janeiro de 2004, proferido no âmbito do processo n.º1064 7/03-4, que ora se junta como Doc. 1

      O processo de contra-ordenação prescreveu em 4 de Junho de 2002.

      Prescrição essa que se invoca".

    4. Sobre estas questões pronunciou-se o Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Coimbra, considerando que:

      "(...) porque não ocorreu qualquer despenalização da conduta imputada ao arguido, apenas haverá que manter agora a condenação pela contra-ordenação praticada, e alterar, à luz do comando do art.º 3°, n.º 2 do Dec. Lei. n.º 433/82, 'ex vi' do art.º 615 do Cód. do Trabalho, o 'quantum' da coima em conformidade com o novo regime punitivo mais favorável ao arguido.

      Até porque também se não verifica a invocada prescrição do procedimento contra-ordenacional, quer à luz do regime vigente na data da prática dos factos (cfr. art.º 10º, n.º 2, 11°, n.º 1 do Dec. Lei n.º 421/83, de 2/12 e 9°, n.º 1, al. d) da Lei 116/99, de 4/8, anterior...

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