Acórdão nº 251/06 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Abril de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução04 de Abril de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

Acórdão n.º 251/2006

Processo n.º 33/06

  1. Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    AUTONUM 1.O Ministério Público intentou, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 9.º e seguintes da Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro (Lei da Nacionalidade), na redacção introduzida pela Lei n.º 25/94, de 19 de Agosto, e 22.º e seguintes do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (constante do Decreto-Lei n.º 322/82, de 12 de Agosto, na redacção do Decreto-Lei n.º 253/94, de 20 de Outubro), acção com processo especial de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa contra A., cidadão sérvio, melhor identificado nos autos.

    Por decisão de 7 de Junho de 2005, o Tribunal da Relação de Lisboa julgou procedente a oposição deduzida e, consequentemente, determinou o arquivamento do processo organizado na Conservatória dos Registos Centrais referente à aquisição da nacionalidade portuguesa, nos seguintes termos:

    Face à simplicidade da questão a resolver, tendo em conta o disposto nos art.ºs 25.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 322/82, de 12 de Agosto, e no art.º 705.º do CPC, proferir-se-á de imediato decisão sumária sobre a mesma.

    I – O Digno Magistrado do MP intentou a presente acção com processo especial de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa contra A., residente na Av. …, Portimão.

    Alegou, em resumo, que o requerido, cidadão sérvio, tendo casado em 22-5-2000 com a cidadã portuguesa B., veio em 7-4-2004, na Conservatória de Registo Civil de Portimão, a declarar que pretendia adquirir a nacionalidade portuguesa, com base nesse casamento, não tendo, porém, feito prova de factos que demonstrem a sua ligação efectiva à comunidade nacional.

    Requereu que se julgue procedente a oposição à aquisição da nacionalidade deduzida, ordenando-se o arquivamento do processo conducente ao registo pendente na Conservatória dos Registos Centrais.

    Devidamente citado o requerido não deduziu oposição.

    II – Encontra-se apurada a seguinte factualidade:

    A – O requerido nasceu em Balance, Vitina, então República Federal da Jugoslávia, actualmente República da Sérvia e Montenegro, em 25-9-61, tendo nacionalidade sérvia (fls. 86-87, 90-91 e 94).

    B – Em 22-5-2000, em Madrid, Espanha, o requerido contraiu casamento com a cidadã portuguesa B., natural de Lagos (fls. 72).

    C – O requerido reside na Av. …, Portimão.

    D – Em 7-4-2004, na Conservatória do Registo Civil de Portimão, o requerido declarou que pretende adquirir a nacionalidade portuguesa, com base naquele casamento (fls. 84), tendo na sequência sido instruído, na Conservatória dos Registos Centrais, o processo n.º 13712/04 (fls. 14).

    E – O requerido não tem antecedentes criminais em Portugal (fls. 103).

    F – Em 23-12-1996 nasceu em Hamburgo C., filho do requerido e de sua mulher B. (fls. 106).

    G – O requerido tem conhecimentos de português (fls. 112).

    H – O requerido está integrado no sistema fiscal, de saúde e de segurança social português (fls.25-26, 114-117 e 110).

    III – A nacionalidade portuguesa pode ser adquirida pelo estrangeiro que sendo casado há mais de três anos com nacional português, faça declaração nesse sentido durante a constância do casamento – art.º 3.º, n.º 1, da Lei n.º 37/81, de 3-10, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 25/94, de 19-8.

    Esta forma de aquisição da nacionalidade é determinada por efeito da vontade do interessado, verificado que seja o pressuposto essencial à sua relevância, ou seja o casamento há mais de três anos com cidadão de nacionalidade portuguesa.

    Porém, a declaração de vontade nesse sentido não tem como consequência necessária a aquisição da nacionalidade.

    Conforme decorre do art.º 9.º, al. a), da Lei n.º 37/81, constitui fundamento de oposição a não comprovação pelo interessado da sua ligação efectiva à comunidade nacional. E, segundo o art.º 22.º, n.º 1, al. a), do DL n.º 322/82, de 12-8 (na redacção introduzida pelo DL n.º 253/94, de 5-10), todo aquele que requeira registo de aquisição da nacionalidade portuguesa deve “comprovar por meio documental, testemunhal ou qualquer outro legalmente admissível a ligação efectiva à comunidade nacional”.

    A redacção originária daquele art.º 9.º – anterior à supra referida alteração – previa como fundamento à oposição “a manifesta inexistência de qualquer ligação efectiva à comunidade nacional”.

    Daqui resulta que o legislador com a alteração em referência pretendeu dificultar aquela aquisição da nacionalidade, impondo ao interessado o ónus da prova da “ligação efectiva à comunidade nacional”, quando anteriormente seria o MP quem tinha que provar que era manifesta a inexistência de qualquer ligação à comunidade nacional. Deste modo, actualmente a oposição procederá se o requerente não tiver feito prova daquela ligação efectiva à comunidade nacional, por tal equivaler à falta de verificação de um pressuposto legalmente exigido para a aquisição de nacionalidade.

    Entendeu o STJ no seu acórdão de 11-6-2002, Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do STJ, ano X, tomo 2, pág. 104, que se trata de uma ligação cujo conteúdo comunga dos valores e participa nos objectivos fundamentais da comunidade nacional, revelando propósito e seriedade no exercício de cidadania portuguesa, de forma interessada, consistente, prática, efectiva, operacional na directa relação cidadão/Estado e Estado/cidadão e entre cidadão do mesmo Estado; o que supõe, no mínimo, que o candidato esteja em condições normais e objectivas de o poder fazer, isto é, de relacionar-se na acepção indicada.

    Tudo implicando um sentido de integração efectiva no tecido nacional, identificável com uma relação de pertença à comunidade, usufruindo de direitos e cumprindo deveres, assumindo preocupações da sociedade portuguesa, enquanto juridicamente organizada em Estado e com objectivos essenciais a cumprir.

    A demonstração daquela ligação extrair-se-á de factores vários, tais como o domicílio em território nacional, o conhecimento da língua portuguesa, a existência de elos de natureza económica, social, cultural, familiar com o território nacional ou com a comunidade portuguesa.

    Ora, ter casado com uma portuguesa, com quem tem um filho, residir em Portugal, ter alguns conhecimentos da língua portuguesa, estar integrado no sistema fiscal, de saúde e de segurança social português, não basta para a verificação da existência da ligação efectiva à comunidade portuguesa a que nos reportamos.

    Assim, os factos apurados são insuficientes para que se possa concluir pela existência da ligação em referência, pelo que a oposição terá necessariamente de proceder.

    Notificado dessa decisão, o representante do Ministério, ainda que concordando que “outra não poderia ser a decisão face aos factos coligidos no processo especial”, requereu que, pelo mecanismo do artigo 700.º, n.º 3, do Código de Processo...

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