Acórdão nº 07B1731 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução14 de Junho de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I O Banco AA SA intentou, no dia 18 de Novembro de 2004, contraBB, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe € 23 441,03, acrescidos de juros de mora desde a citação, com fundamento no prejuízo derivado de factos ilícitos praticados pelo réu no exercício das suas funções de gerente na sua Dependência do Marquês do Pombal, no Porto.

Em contestação, o réu invocou a prescrição do direito de crédito afirmado pelo autor e impugnou os factos por este articulados na petição inicial e, no saneador, foi relegado para final o conhecimento daquela excepção.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 15 de Maio de 2006, por via da qual foi a excepção de prescrição julgada improcedente e o réu condenado no pagamento ao autor de € 20 141, 46 acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação.

Interpôs o réu recurso de apelação, também impugnando a decisão da matéria de facto, e a Relação, por acórdão proferido no dia 9 de Janeiro de 2007, negou provimento ao recurso.

Interpôs o apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - deduzido pelo recorrido na acção penal o pedido cível e declarada a prescrição do procedimento criminal, extinguiu-se aquele, não podendo ser deduzido em separado; - a Relação incorreu em erro de interpretação e de aplicação do artigo 72º, nº 1, alínea b), por referência ao artigo 71º, ambos do Código de Processo Penal; - deve ser declarada a extinção do direito de accionar e o recorrente se absolvido do pedido; - a Relação violou os artigos 71º do Código de Processo Penal e 306º, nº 1, do Código Civil, por eles não estatuírem sobre os efeitos da pendência do processo crime no decurso do prazo de prescrição do direito de indemnização civil por factos ilícitos objecto daquele processo; - como a recorrida não requereu a notificação do recorrente na qualidade de arguido para contestar o pedido cível, a prescrição não foi interrompida, por não se verificar a hipótese prevista no artigo 323º, nºs 1 e 2, do Código Civil; - os factos provados não revelam a suspensão nem a interrupção do prazo de prescrição; o caso julgado decorrente da decisão de extinção do procedimento criminal proferida no processo crime tem a força probatória prevista no artigo 674º-B, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, analogicamente aplicável; - a Relação violou, por erro de interpretação e de aplicação, os artigos 323º, nºs 1 e 2 e 498º, nºs 1 e 3, do Código Civil, 71º e 72º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Penal, 205º, nºs 1 e 4, alínea b) e 5 do Código Penal e 674º-B, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

- deve considerar-se não interrompida a prescrição, julgada procedente a excepção da prescrição e absolver-se o recorrente.

Respondeu o recorrido, em síntese de alegação: - o recorrente podia ser accionado como o foi porque o procedimento criminal se extinguiu antes do julgamento, por culpa dele - artigo 72º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Penal; - a prescrição do procedimento criminal é na espécie de dez anos, porque o recorrente foi pronunciado pela prática de um crime de abuso de confiança, previsto então no artigo 300º do Código Penal - agora 305º - cuja pena era de dez anos de prisão; - interrompeu-se a prescrição porque a recorrida exprimiu directamente a intenção de exercer o seu direito de indemnização através da dedução do pedido cível no dia 20 de Maio de 1997, começando então a correr novo prazo de dez anos - artigos 323º, nº 1 e 326º, nºs 1 e 2, do Código Civil; - a recorrida deduziu o pedido cível no processo crime, o tribunal dirigiu-lhe a notificação para contestar e, só o não foi, por virtude de ter optado por fugir à justiça; - é aplicável na espécie o disposto no artigo 323º, nº 2, do Código Civil, visto que a notificação não se realizou no prazo de cinco dias por causa não imputável ao recorrido, pelo que o prazo de prescrição se interrompeu decorrido aquele prazo; - o artigo 674º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil não se aplica ao caso vertente porque o recorrente não foi absolvido no processo crime, porque prescreveu o procedimento criminal antes do julgamento.

II É a seguinte a factualidade declarada assente no acórdão recorrido: 1. O réu foi funcionário do Banco Fonsecas & Burnay SA desde 1985 até Janeiro de 1993, exercendo as funções de gerente na Dependência do Marquês do Pombal, no Porto.

  1. É costume no comércio bancário, relativamente a clientes considerados interessantes, serem os próprios funcionários do Banco a deslocarem-se ao local de trabalho daqueles a fim de receberem deles as quantias destinadas a depósito nas respectivas contas.

  2. O réu, para além das funções de gerente tinha a incumbência de se deslocar ao consultório do Doutor .., no Largo .., nº 00, 2º andar, sala nº 000, Porto, a fim de receber as quantias resultantes da actividade profissional daquele cliente do Banco e efectuar o depósito na sua conta domiciliada no balcão do Marquês do Pombal, nº 0000000000000.

  3. Para o efeito, deslocava-se ao consultório do Doutor .., recebia a quantia a depositar, quer em numerário, quer em cheques, bem como o respectivo talão de depósito preenchido, conferia o total recebido com a declaração e, uma vez na posse das quantias recebidas, incumbia-lhe proceder ao seu depósito na conta bancária mencionada sob 3.

  4. O réu recebeu do médico ...4 038 000$, que lhe pertenciam, valor que lhe foi entregue em sete parcelas, de 636 000$, 592 000$, 517 000$, 589 000$, 521 000$, 654 000$ e 529 000$, em 21, 22, 23, 24, 27, 28 e 29 de Julho de 1992.

  5. O réu não depositou na conta mencionada sob 3 o dinheiro referido sob 4, aproveitando-se dele, e, no período entre Abril de Julho de 1992, efectuou, posteriormente à data das entregas, os depósitos das quantias que lhe eram entregues pelo Doutor Tallon, e este reclamou disso junto do autor por carta de 31 de Janeiro de 1993.

  6. No dia 3 de Maio de 1993, o Banco Fonsecas & Burnay SA apresentou uma queixa-crime contra o réu com fundamento na prática de um crime de abuso de confiança, previsto e punível, então, pelo artigo 300º do Código Penal.

  7. No dia 24 de Abril de 1997, o Ministério Público deduziu acusação contra o réu pela prática de um crime de abuso de confiança previsto e punível no artigo 205º, nºs 1 e 4, do Código Penal.

  8. No dia 20 de Maio de 1997, o Banco Fonsecas & Burnay SA deduziu contra o réu pedido de indemnização cível no valor de 6 494 450$, correspondentes a 4 038 000$ de capital e a 2 456 450$ de juros de mora.

  9. Recebida a acusação pela 1ª Vara Criminal do Porto, foi o réu pronunciado e o seu julgamento agendado para o dia 28 de Setembro de 1998, e declarado contumaz por despacho proferido naquela Vara no dia 28 de Janeiro de 1999.

  10. Já com o julgamento de novo agendado para o dia 2 de Fevereiro de 2004, o réu requereu a abertura da instrução, que culminou com a declaração de extinção do procedimento criminal, nos termos do artigos 118º, nº 1, alínea b) e 121º, nº 3, do Código Penal, e foi citado para a acção no dia 30 de Janeiro de 2005.

  11. O autor, que exerce a actividade bancária, resultou da denominação do Banco do Fomento Exterior SA que incorporou, por fusão, o Banco Fonsecas & Burnay SA e o Banco Borges & Irmão...

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