Acórdão nº 361/10.3GBLLE de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelMANUEL BRAZ
Data da Resolução31 de Março de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: No 2º juízo criminal da comarca de ..., em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, foi proferido acórdão que condenou o arguido AA a) pela prática de um crime de homicídio p. e p. pelas disposições combinadas dos artºs 131º e 86º, nº 3, da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 17 anos de prisão; b) pela prática de um crime de detenção ilegal de arma p. e p. pelo artº 86º, nº 1, alínea c), da Lei nº 5/2006, na pena de 1 ano e 4 meses de prisão; e c) em cúmulo jurídico daquelas duas penas, na pena única de 17 anos e 10 meses de prisão.

Foi ainda aplicada ao arguido a sanção acessória de interdição de detenção, uso e porte de armas pelo período de 17 anos.

O arguido interpôs recurso directo para este Supremo Tribunal, concluindo assim a sua motivação: «I – Vem o presente recurso da douta decisão proferida nestes autos, que condenou o Recorrente.

II – A discordância do Recorrente tem a ver com a medida concreta da pena e a sua aplicação.

III – A pena aplicada (17 anos e 10 meses de prisão) é uma pena demasiado severa para os factos em apreço e face ao que se passou na audiência discussão e julgamento.

IV – O Tribunal “a quo” para a determinação da medida da pena e a aplicação daquela pena concreta de (17 anos e 10 meses de prisão), considerou no seu ponto 5, (fls. 17 da decisão), que “Tendo em conta a legitimação do nosso direito penal a partir da ideia de necessidade social, com expressa consagração constitucional, e cuja função é a tutela de bens jurídicos, a aplicação de qualquer pena só ganha sentido se estruturada e aplicada em termos preventivos “, e mais à frente conclui: “Em casos como este, em que, relativamente a alguns dos crimes em causa, há alternativa entre a pena de prisão ou multa, de acordo com o art. 70º do Código Penal, o Tribunal deve dar prevalência à pena de multa, sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição — especiais e gerais “.

V – Ora, com o devido respeito por opinião contrária, afigura-se ao recorrente também aqui que a medida da pena única de (17 anos e 10 meses de prisão), ora aplicada é inquestionavelmente exagerada.

VI – Com efeito, o Tribunal “a quo” para aplicar aquela pena única de prisão, apesar de desqualificar o crime mais grave, (homicídio), por não se mostrarem “provados factos que possam levar à qualificação“, (fls. 13 da decisão), deu especial relevância aos factores agravativos relacionados com a prática do crime, (detenção ilegal de arma), dadas as (elevadas exigências de prevenção especial, situação de perigo e grau de culpa), sem atender – entre outros – à ausência de antecedentes criminais do aqui Recorrente.

VII – Nem tão pouco, considerou os factores atenuantes de especial importância, como sejam o da confissão parcial por parte do Recorrente, os sentimentos manifestados pelo recorrente no cometimento do crime e os motivos que o determinaram, as condições pessoais do Recorrente e a sua situação económica, e ainda a sua conduta anterior aos factos e posterior à prática destes, tendo demonstrado profundo arrependimento público, principalmente aos seus familiares.

VIII – Por outro lado, por diversas vezes durante o julgamento, o recorrente admitiu os factos mais relevantes para a descoberta da verdade.

IX – O Recorrente durante o julgamento admitiu os seus erros, demonstrando claro arrependimento através da confissão, pedindo perdão aos seus familiares, (mãe, cunhada e sobrinho), pelos actos cometidos.

X – Também foi com base nesses factos, admitidos pelo Recorrente, que o Tribunal “a quo” deu como provada parte da acusação como se pode ver a fls. 3 a 7 da decisão, em que o próprio Tribunal “a quo” refere que tais factos “...

não merecem qualquer controvérsia em julgamento“.

XI – Contudo, sublinhe-se, o Tribunal “a quo” refere “Que o arguido disparou a arma em direcção ao irmão (...) O próprio o admitiu (embora tentando apresentar uma outra versão) “(fls. 10 da decisão).

XII – Mais, confirmou a espingarda de caça, de canos de alma lisa e cumprimento de 71 cm, com o número de série 7017, “...era pertença de seu falecido pai e estava registada em nome de sua mãe, I...C...

” (fls. 6 da decisão).

XIII – Pela leitura da decisão se vê que o Recorrente é oriundo de um meio familiar de humildes condições, sem passado delituoso, onde lhe foram incutidas regras adequadas de convivência social (fls. 7 e 8 da decisão).

XIV – Aliás, o Tribunal “a quo” no ponto 1.15 da sua douta decisão (a fls. 6), refere que após o Recorrente ter cometido os crimes de que foi condenado, “...

dirigiu-se ao posto territorial da Guarda Nacional Republicana de ..., onde se entregou“, não dando em nosso entender, qualquer relevo a este facto que milita a favor do Recorrente na fundamentação da decisão/condenação, pois entende o Recorrente que o Tribunal “a quo“ tinha que considerar essa sua actuação em seu benefício aquando da aplicação da medida concreta da pena, e não o fez.

XV – Violando assim o artigo 71º do Código Penal.

XVI – Dada a elevada idade do Recorrente, a doença grave de que padece e a circunstância de ser ainda o único sustento da família, o Tribunal “a quo” não solicitou uma perícia sobre a sua personalidade, apesar de se observar no relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social, fls. 432, que, “Apesar de o arguido ser descrito como pessoa calma e responsável, parece apresentar alguma instabilidade emocional, que poderá estar ligada à sua actual situação de saúde e de que teve conhecimento pouco tempo antes da sua detenção “.

XVII – Violando assim os artigos 369°, n° 1, e 370°, n° 1, ambos do Código Processo Penal.

XVIII – Não sendo possível averiguar em concreto, qual o seu estado clínico e psicológico.

XIX – Atendendo que, poderia ser tido em consideração para a escolha da medida concreta da pena, podendo até consagrar uma diminuição da pena aplicada ao Recorrente, que não se concretizou.

XX – Sendo aplicada ao Recorrente (l7anos e 10 meses de prisão) por excessivamente gravosa.

XXI – Também por aqui, o Tribunal “a quo” violou o artigo 71° do Código Penal.

XXII – O Tribunal “a quo” não considerou ainda, para a medida concreta da pena, o facto de o Recorrente ter a seu cargo ainda duas filhas de 18 e 12 anos de idade, que estão a estudar, e devia tê-lo considerado.

XXIII – O facto de o Recorrente, apesar da sua elevada idade, estar actualmente ainda no activo e a trabalhar, como única forma de obter um rendimento mensal para garantir o único sustento da sua família, devia ter beneficiado de uma redução na medida concreta da pena, e não beneficiou.

XXIV – Também por aqui o Tribunal “a quo” violou o artigo 71° do Código Penal.

XXV – Por outro lado, e face aos factos e ao direito apurados no julgamento, a pena de prisão aplicada ao recorrente (17 anos e 10 meses) peca, por si só, por excessivamente gravosa, ultrapassando a medida da culpa.

XXVI – Pelo que foi violado o n° 2 do artigo 40° do CP.

Ao condenar o Arguido, ora Recorrente, atenta a moldura penal respectiva, o douto Tribunal de 1ª Instância não considerou, designadamente, o disposto do artigo 71° e n° 2 do artigo 40°, ambos do Código Penal e artigo 369°, n° 1, e artigo 370° n° 1, ambos do Código Processo Penal, pelo que foram violados estes mesmos preceitos legais.

Não devia o ora Recorrente ter sido condenado em pena tão elevada, podendo e devendo este Supremo Tribunal de Justiça, determinar a revogação do douto Acórdão ora posto em crise, na parte da aplicação da medida da pena, por outro, que tenha em consideração as circunstâncias atenuantes supra referidas, aplicando ao recorrente uma pena de prisão nunca superior a 10 anos».

Respondendo, o MP junto do tribunal recorrido defendeu a improcedência do recurso.

No Supremo Tribunal...

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