Acórdão nº 3875/03 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Abril de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelDR. FERNANDES DA SILVA
Data da Resolução15 de Abril de 2004
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I – 1 – O IDICT, Delegação de Leiria, a 18 de Julho de 2.000, aplicou à arguida ‘AA.’ a coima de 13.467,54 Euros, por infracção ao disposto no art. 10º do DL. 421/83, com as alterações introduzidas pela Lei 118/99, que, ao tempo, constituía infracção muito grave, punível, em caso de negligência, com a coima de 15.400.000$00 a 53.900.000$00 (11X1.400.000$00 a 11X4.900.000$00).

2 – Discordando, a arguida impugnou judicialmente a decisão da Autoridade Administrativa.

A sua pretensão foi indeferida – cfr. fls. 355 e seguintes.

3 – A instituição bancária arguida, ainda inconformada, recorreu para esta Relação, alegando e concluindo: 1. O recorrente é parte ilegítima no presente processo de contra-ordenação laboral, ilegitimidade que constitui uma excepção de conhecimento oficioso e que, por ter relevância para a apreciação e julgamento do recurso, deve ser apreciada pelo tribunal ad quem.

  1. O AA., arguido no presente processo, foi incorporado por fusão no BB 3. Com a inscrição da fusão no registo comercial, o arguido AA., extingui-se, nos termos do artigo 112°, alínea a) do Código das Sociedades Comerciais, facto que ocorreu em 23.06.2000.

  2. O AA., extingui-se, pois, por fusão no BB, antes do levantamento do Auto de Notícia que deu origem ao presente processo contra-ordenacional.

  3. De acordo como estatuído no artigo 14.º, n.º 2, do Código de Registo Comercial a fusão só produz efeitos contra terceiros depois da data da publicação.

  4. Porém, terceiros, para efeitos de registo, são todos aqueles que tenham adquirido e conservado direitos sobre a sociedade e que poderão vir a ser lesados nesses mesmos direitos se o acto registado mas ainda não publicado produzisse efeitos em relação a eles.

    Isto é, o legislador utiliza um conceito técnico e restrito de terceiro, que encontra plena aplicação no que respeita aos efeitos cíveis da fusão, não tendo, porém, aplicação no que respeita ao processo de contra-ordenação, uma vez que a aplicação de uma coima importa sempre responsabilidade penal e não civil.

  5. De facto, o IDICT, não pode ser considerado um terceiro, uma vez que não é titular de nenhum direito nem em relação à sociedade extinta nem à sociedade incorporante.

  6. Na verdade, ao levantar o Auto de Notícia o IDICT não se constitui na posição de titular de nenhum direito. É necessário ter em atenção que a aplicação de uma coima tem, em última análise e à semelhança das penas, objectivos de prevenção geral (para que eventuais infractores sejam desencorajados de praticar infracções contra-ordenacionais) e de prevenção especial (para que o infractor não cometa ou não volte a cometer infracções contra-ordenacionais ). Assim, apesar de os valores das coimas reverterem para o Estado, o que se visa essencialmente com a sua aplicação não é que este seja ressarcido de prejuízos que a prática da infracção tenha eventualmente causado, mas antes, atingir o sujeito de direito e consciencializá-lo da reprovação social do acto cometido, não o seu património.

  7. Desta forma, não se poderá considerar que o IDICT possa de alguma forma ver um seu direito prejudicado com o acto de fusão, daí que não possa ser considerado terceiro para efeitos do artigo 14, n.º 2 do Código de Registo Comercial.

  8. Primeiro, porque o levantamento do Auto de Notícia não representa nenhum facto constitutivo de um direito na sua esfera jurídica em relação à sociedade incorporada. Depois, porque tendo em atenção que o próprio fim da aplicação da coima, com a fusão e consequente extinção da pessoa colectiva deixa de haver personalidade a consciencializar, logo deixa de fazer sentido a aplicação da coima, uma vez que não poderão ser alcançados quaisquer fins de natureza preventiva geral ou especial.

  9. Assim, por ter sido levantado contra pessoa inexistente à data, deve o Auto de Notícia ser considerado nulo por falta de personalidade jurídica e consequentemente judiciária do Banco Português do Atlântico S.A. nos termos e para os efeitos do disposto no art. 5° do Código de Processo Civil aplicável ex vi dos artigos 41° do Decreto-Lei n.o 433/82 de 27 de Outubro e 4° do Código de Processo Penal.

  10. Ainda que assim não seja, o que por mera hipótese se admite, o R., Banco Português do Atlântico, não foi citado de acordo com o fixado no artigo 195°, alínea d) do C PC, nem poderá vir a sê-lo uma vez que se encontra extinto.

  11. A proceder a tese vertida na douta Sentença ora recorrida, isto é, que à data do levantamento do Auto de Notícia o arguido "AA.", "existia e poderia ser responsabilizado, designadamente quanto a ilícitos de mera ordenação social", sempre seria nula a decisão administrativa, uma vez que: 14. No Auto de Notícia levantado no dia 18 de Julho de 2000, foi imputada a prática de uma contra-ordenação ao AA., sendo que, na decisão proferida pelo Sra. Delegada do IDICT de Leiria, de 22 de Julho de 2002, é aplicada uma coima ao «"Banco Português do Atlântico. S.A ". ora "Banco Comercial Português. S.A ,,» 15. Com o devido respeito, esta expressão não faz qualquer sentido, uma vez que, ou a infracção é imputada ao Banco Português do Atlântico e é consequentemente nula, uma vez que é aplicada uma coima a uma pessoa colectiva juridicamente inexistente à data da decisão.

    Ou a infracção é imputada ao Banco Comercial Português, e nesse caso serão violados normas e princípios basilares de direito constitucional e criminal, nomeadamente o artigo 30º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa uma vez que, 16. Sendo certo que o auto de notícia, corresponde à acusação, nos termos em que se encontra redigido o art. 22.º da Lei 116/99, de 4 de Agosto, a admitir a tese versada na douta Sentença ora recorrida, estamos perante uma situação, em que a entidade jurídica condenada nem sequer tinha sido acusada no processo, o que viola os princípios basilares de direito constitucional e criminal. Na verdade, a responsabilizar-se o Banco Comercial Português, S.A, pela prática da infracção da autoria material da sociedade incorporada, estar-se-ia a admitir a possibilidade de sub-rogação no cumprimento das penas, o que é inadmissível face ao teor do artigo 30, n.º 3 da CRP , nos termos do qual a responsabilidade penal é insusceptível de transmissão.

  12. Com a extinção do AA. extinguiu-se também a responsabilidade contra-ordenacional a que os presentes autos se reportam.

  13. Nos termos do disposto no artigo 2° do Regime Geral das Contra-Ordenações Laborais, aprovado pela Lei n° 116/99, de 4 de Agosto, a estas contra-ordenações aplica-se subsidiariamente o regime geral das contra-ordenações que consta do Dec.-Lei n° 433/82, de 27 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo Dec.-Lei n° 356/89, de 17 de Outubro e pelo Dec.-Lei n° 244/95, de 14 de Setembro.

  14. De harmonia com o preceituado no artigo 32° do citado Dec.-Lei n° 433/82, as normas do Código Penal aplicam-se no que respeita à fixação do regime substantivo das contra-ordenações.

  15. Nos termos do artigo 127° do Código Penal a responsabilidade criminal extingue-se pela morte; 21. E nos termos do artigo 128° do mesmo Código a morte do agente extingue, tanto o procedimento criminal, como a pena ou a medida de...

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