Acórdão nº 03A418 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Março de 2003 (caso NULL)

Data11 Março 2003
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça "A" intentou acção com processo comum e forma ordinária contra o Estado Português, pedindo a condenação deste a pagar-lhe uma indemnização no montante de 25.900.000$00 (vinte e cinco milhões e novecentos mil escudos) com juros de mota à taxa legal desde a citação e até integral ressarcimento. Invocou ter sofrido danos decorrentes de prisão preventiva por crime de homicídio que não fora praticado por si mas por terceiros, no âmbito do processo de inquérito n.º 1588/90, danos que discrimina assim: a) - 400.000$00 a titulo de reparação do veículo automóvel que lhe foi apreendido nesses autos; b) - 500.000$00 relativos à perda de documentos e privação de circulação desse veículo desde 18.05.90; c) - 20.000.000$00 por danos morais por prisão e respectivas consequências e d) - 5.000.000$00 por privação da liberdade durante 5 meses e da liberdade de circulação, por lhe ter sido imposto limite de circulação nas freguesias de Canha e Poceirão. Alega, em síntese, que a prisão, além de ilegal, foi ilegítima e efectuada com a maior ligeireza, com erro grosseiro, sem qualquer tipo de prova. O R. contestou, concluindo pela sua absolvição do pedido, pois, a seu ver, não houve prisão ilegal, erro grosseiro, danos indemnizáveis pelo Estado nem estar prevista indemnização pela fixação de outras medidas de coacção, aliás aceites, sem recurso, pelo próprio autor. Replicou o A., deduzindo ainda incidente de intervenção principal de B - fiel depositário do seu veículo apreendido no âmbito daquele inquérito - e formulou ampliação do pedido e da causa de pedir contra aquele interveniente relativamente aos danos e reparação do veículo, no montante de 400.000$00. Tal incidente foi admitido e citado o depositário que não apresentou defesa. O Estado opôs-se à réplica por processualmente inadmissível, acrescentando que a prisão não foi ilegal, não foi impugnada, que a mancha de sangue foi analisada como sangue humano mas sem concludência quanto ao sexo, com resultado conhecido a 4.8.90, que a ampliação não era admissível face à inadmissibilidade da réplica mas aceitava o interesse do depositário em intervir na causa. Decidiu-se que a réplica era admissível e não existia uma verdadeira ampliação do pedido e da causa de pedir mas antes, a extensibilidade, por força da aplicação processual dos efeitos e consequências da intervenção principal, de parte do pedido de condenação dirigida ab initio contra o Estado Português. No saneador o réu foi absolvido de todos os pedidos: por um lado porquanto não houve prisão ilegal ou infundamentada, nem sequer erro grosseiro e a lei também não prevê direito a indemnização por fixação de medidas de coacção não detentivas. Por outro lado, porque não foram alegados factos suficientes para a prova de culpa do Estado em relação a danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da danificação do veículo, da perda de documentos e da privação de circulação com esse veículo. Apelou o A., mas a Relação de Évora confirmou o decidido. Novo recurso para o Supremo Tribunal que revogou o acórdão da Relação e ordenou a baixa dos autos para ampliação da matéria de facto, com novo julgamento de direito. A Relação determinou que o processo seguisse com especificação e questionário e, instruída e discutida a causa, foi na comarca proferida sentença que a) - Julgou o pedido parcialmente procedente, condenando o Estado Português a pagar ao autor, por danos não patrimoniais, o montante, actualizado à data da sentença, de três milhões de escudos (3.000.000$00), com juros de mora à taxa legal desde essa data, e b) - por danos materiais no veículo apreendido, solidariamente com o depositário, o montante de 400.000$00, com juros de mora à taxa legal desde a citação. No mais julgou improcedente o pedido do Autor. Da sentença, apelaram o R. Estado e o A., mas a Relação confirmou inteiramente o julgado. Daí as revistas do A. e do Estado, aquele a pedir a ampliação da indemnização arbitrada e este a defender a sua absolvição ou, ao menos, a redução dos montantes atribuídos a título indemnizatório, por exagerados. Como se vê das respectivas alegações que coroaram com as seguintes Conclusões: A - do Estado a) - Salvo melhor entendimento, no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18/11/98 ficou apenas afastada, e em definitivo, a hipótese de existência de "erro grosseiro" na avaliação dos pressupostos de facto que levaram à prisão preventiva do Autor, em sede de 1º Interrogatório Judicial de Arguido Detido. b) - Tendo tal questão (mas só ela) transitado oportunamente em julgado. c) - Tal "erro grosseiro" foi também afastado (e bem) pelo Acórdão ora recorrido, quanto à manutenção da prisão preventiva do Autor em qualquer outro momento. d) - Por outro lado, a matéria de facto assente não integra, salvo melhor opinião, nenhuma das situações que taxativamente possibilitam a atribuição de uma indemnização por prisão preventiva legal (artigos 225º do Código de Processo Penal e 27º, n.º 5, da Constituição da Republica Portuguesa), por ter sido afastado, em qualquer caso, o aludido "erro grosseiro e) - É que nesta matéria deve aplicar-se o disposto no n.º 2 do art. 225º do Código de Processo Penal, norma especial, de natureza substantiva e de aplicação imediata, aqui se não vislumbrando a aplicação de qualquer outra norma, de natureza constitucional ou avulsa. f) - Até porque, existindo tal norma especial, não só não estamos perante qualquer lacuna da Lei que haja que integrar, como não é legítima a aplicação analógica de qualquer outra norma, sendo certo que o art. 225º do Código de Processo Penal é a consagração legislativa correcta do princípio constitucional estabelecido no n.º 5 do art. 27º da Constituição da República. g) - Não sendo de aplicar-se, "in casu", o disposto no art. 9º do Decreto-Lei n.º 48.051, de 21/11/67, o qual não tem aplicação a actos materialmente jurisdicionais. h) - Em qualquer caso, o certo é que a obrigação de o R. Estado vir a indemnizar o A pela sua parcial privação de liberdade sempre dependeria da verificação do pressuposto de os prejuízos por ela causados e por ele sofridos serem "especiais e anormais" (art. 9º do D.L. n.º 48051) ou "anómalos e de particular gravidade" (art. 225º n.º 2 do C.P.P., na redacção em vigor à data dos factos). i) - Ora, da matéria de facto fixada pelas Instâncias (incluindo aquela a cuja ampliação se procedeu no novo julgamento) não resulta a existência de prejuízos, para o A, que sejam "hoc sensu" anómalos ou particularmente graves, isto é, que o tenham colocado numa situação muito mais danosa do que a suportada por outro detido em geral. j) - O mesmo é dizer que o A não sofreu os tais prejuízos em medida superior à de qualquer outro detido em idêntica situação, não sendo eles, por isso mesmo, especialmente graves ou particularmente anómalos. k) - Não lhe assistindo, pois, qualquer direito à respectiva indemnização. 1) - Sendo aliás certo que nem na Sentença proferida na 1ª Instância nem no douto Acórdão ora recorrido se avaliam e medem tais prejuízos em termos concretos e objectivos, pelo que, nesta parte, carecem de fundamentação bastante. m) - Relativamente aos danos puramente patrimoniais, o certo é que eles não decorrem da medida de prisão preventiva aplicada (inexistindo o necessário nexo causal entre uns e outra), mas da legalmente permitida e tramitada apreensão judicial do veículo, não se tendo provado que tivessem resultado de acto ilícito (e culposo) atribuível ao ora R. n) - Pelo que o ora Recorrente deveria ter sido absolvido do pedido o) - Sem conceder e para a hipótese de se vir a entender que o A deve ser indemnizado pelo R. Estado em virtude da aplicação e manutenção legais e lícitas da prisão preventiva ao A, sempre os montantes atribuídos a título indemnizatório. se deverão considerar como exagerados. p) - O douto Acórdão ora recorrido violou, consequentemente, o disposto nos artigos 9º do Decreto Lei n.º 48.051, de 21/11/67, 9º, 10º n.os 2 e 3, 483º e seguintes, 500º, 501º, 562º e seguintes e 1185º, todos do Código Civil, 225º do Código de Processo Penal e 27º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa. B - Do Autor 1ª - O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no âmbito do processo n.º 795/98 da 2ª Secção do STJ - no seio dos presentes autos - decidiu com força de caso julgado formal (nos termos dos artigos 671º, 672º e 673º do CPC) que, nos presentes autos assiste ao ora recorrente o direito à indemnização por força do acto do Estado que, embora lícito, se traduziu num acto lesivo dos direitos do recorrente, visto que se consubstanciou na medida de prisão preventiva injustificada a que esteve sujeito. 2ª - Todavia, o montante indemnizatório atribuído ao recorrente não é adequado ao sofrimento que lhe foi causado pela medida de prisão preventiva injustificada; 3ª - Por um lado, considera o douto Acórdão recorrido que existem danos que se deveram à "ampliação" dos factos pela comunicação social e pela população, e que tal ampliação é consequência normal, e até típica, da aplicação da medida de prisão preventiva; 4ª - E, por outro lado, o douto Acórdão recorrido afirma que "esta medida de agravamento da lesão do A., não imputável, obviamente, à medida de prisão preventiva aplicada, não pode, consequentemente, segundo as regras próprias do nexo de causalidade adequada, ser abrangida pela indemnização a arbitrar (artigos 496º, n.º 1 e 563º do Código Civil)." 5ª - Ora, quanto à primeira das conclusões do douto acórdão recorrido, cumpre-nos apenas dizer que nem todos os casos de presos preventivos são alvo da "ampliação" levada a cabo pela comunicação social e/ou pela população; 6ª - E por outro lado, foi o Estado, através das autoridades policiais e judiciárias quem ordenou a prisão preventiva e quem difundiu que teria sido o recorrente o autor do crime que levou a que tal medida lhe fosse aplicada; 7ª - Quanto à segunda das conclusões referidas (que aliás são contraditórias entre si) do...

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