Acórdão nº 04A1572 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Junho de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | AZEVEDO RAMOS |
Data da Resolução | 01 de Junho de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Em 7-7-99, "A" instaurou a presente acção ordinária contra o Estado Português, pedindo que este seja condenado no pagamento da quantia de 82.600.000$00 (sendo 25.000.000$00 por danos não patrimoniais e 57.600.000$00 por danos patrimoniais), acrescida de juros, como indemnização pelos danos que sofreu por ter sido mantido na situação de prisão preventiva durante 14 meses, que se revelou injustificada, e ainda por não ter sido julgado em prazo razoável. Para tanto, alega que foi detido em 11 de Maio de 1997, tendo sido ordenada a sua prisão preventiva pelo Juiz competente. Não obstante ter recorrido de tal decisão, o autor foi mantido na situação de prisão preventiva desde 13-5-97 até 13-7-98, só tendo sido libertado no decurso da audiência de julgamento, cuja sentença decretou a sua absolvição dos crimes de que estava acusado. O Ministério Público contestou, em representação do Estado Português, dizendo não se mostrar que a prisão preventiva tivesse sido manifestamente ilegal ou que não se justificasse em face dos elementos que os autos apresentavam quando foi ordenada ou que fosse excessivo o prazo para realização do julgamento. A acção foi julgada improcedente no despacho saneador, mas a Relação de Évora, na sequência de recurso interposto pelo autor, ordenou o prosseguimento dos autos, com selecção dos factos assentes e organização da base instrutória. Realizado o julgamento e apurados os factos, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu o réu do pedido. Continuando inconformado, o autor interpôs recurso de revista per saltum, pedindo que os autos subissem directamente a este Supremo, nos termos do art. 725, nº1, do C.P.C., onde conclui: 1 - Sempre se disse inocente e entendeu não estarem reunidos os pressupostos de facto que motivariam a aplicação da prisão preventiva. 2 - Ainda que a prisão preventiva pudesse ser justificada formalmente, o facto de ter sido absolvido da acusação que contra si impendia cria no Estado a obrigação de o indemnizar, por via da responsabilidade extracontratual, já que adveio um dano muito grave e especial ao lesado, por via do sacrifício dos seus interesses e direitos a favor dos interesses da comunidade expressados pelo Ex.mo Juiz da Instrução Criminal. 3 - O Estado responde pela administração da justiça, inclusivamente por actos lícitos e pelo risco. 4 - Os arts 22 e 27, nº5, da Constituição da República, concatenados com o art. 225 do C.P.C. e com o dec-lei 48.051, de 21-11-67, impõem a existência de responsabilidade directa pela privação da liberdade, contida em norma directa e imediatamente aplicável, pelo que qualquer interpretação do art. 225 do C.P.P. que reduza o âmbito de aplicação da responsabilidade estatal, como a declarada na sentença recorrida, é inconstitucional, violando o texto constitucional e ainda o art. 5 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 5 - Foi violada a obrigação de efectivar a justiça num prazo razoável, com infracção dos arts 20 da Constituição e 6º da C.E.D.H., o que acarreta a responsabilidade do Estado, nos termos conjugados dos arts 22 da C.R.P. e dec-lei 48051. 6 - A sentença deve ser revogada e condenar-se o Estado Português a pagar ao autor a pedida indemnização de 412.007,06 euros. O Estado contra-alegou, tabelarmente, em defesa do julgado. Corridos os vistos, cumpre decidir. Foram considerados provados os factos seguintes: 1 - Na sequência de queixas apresentadas contra a "B - Sociedade de Investimentos Agrícolas, L.da ", com sede na Rua José Relvas,..., em Alpiarça, e contra incertos, por factos relacionados com encomendas de bebidas e outros bens, ficticiamente realizadas através da B, tiveram início os autos de inquérito nº 812/D/97, da 4ª Delegação da Procuradoria da República, na comarca de Santarém, que depois deram origem ao processo comum colectivo nº 20/98, do 2º juízo Criminal de Santarém. 2 - No âmbito do referido inquérito nº 812/D/97, o autor foi detido pela G.N.R., pelas 14 horas, do dia 11 de Maio de 1997, em Alpiarça, no cumprimento de mandados de detenção emitidos pelo Ministério Público, por contra ele se indiciar a prática de três crimes da burla qualificada, na forma consumada, previstos e puníveis pelos arts 202, al. b), 217, 218, nº2, al. a), do Cód. Penal, e para ser submetido, no prazo máximo de 48 horas, a interrogatório judicial. 3 - No dia 13 de Maio de 1997, pelas 11 horas, o autor foi presente ao Ex.mo Juiz de Instrução Criminal para interrogatório judicial, tendo prestado as declarações constantes de fls 62 a 64, cujo teor aqui de dá por reproduzido. 4 - Após tal interrogatório, o Ex.mo Juiz de Instrução Criminal decretou a prisão preventiva do autor, por considerar que a prova carreada para o processo até àquele momento (designadamente, as declarações prestadas pelo co-arguido C, no interrogatório a que foi sujeito, e ainda a forma como o ora autor negou a prática dos factos, no seu próprio interrogatório) indiciava a prática pelo mesmo arguido A (aqui autor), em co-autoria material: - de três crimes de burla agravada, na forma consumada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts 217, nº1, 218, al. a) e 202, al. b), todos do Cód. Penal; - e ainda de um número não precisamente apurado de burlas agravadas, na forma tentada. 5 - No despacho judicial que decretou a prisão preventiva do ora autor, entendeu o Ex.mo Juiz de Instrução Criminal que existia perigo de fuga por parte deste, caso se mantivesse em liberdade, dadas as idas que o arguido fazia ao estrangeiro e as ligações profissionais que igualmente tinha no estrangeiro. 6 - Em 26-5-97, o autor requereu a revogação do despacho que determinou a sua prisão preventiva e a sua substituição por outra medida de coacção de menor gravidade, requerendo a sua restituição à liberdade. 7 - Por despacho de 27-5-97 e após o Ministério Público se ter pronunciado pela manutenção da prisão preventiva, o Ex.mo Juiz de Instrução Criminal decidiu-se pela manutenção da prisão preventiva, por entender que existia o perigo do autor se furtar à acção da justiça e de que aquela era a única medida de coacção capaz de evitar tal perigo. 8 - Deste último despacho judicial o autor recorreu para o Tribunal da Relação de Évora, por requerimento apresentado em 2-6-97. 9 - Por Acórdão datado de 8-7-97, cuja fotocópia constitui documento de fls 215 a 229, o Tribunal da Relação de Évora confirmou a decisão do Ex.mo Juiz de Instrução Criminal. 10 - Nesse Acórdão da Relação de Évora de 8-7-97 é...
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