Acórdão nº 1110/07.9TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Dezembro de 2013
Magistrado Responsável | GARCIA CALEJO |
Data da Resolução | 02 de Dezembro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- AA, propôs a presente acção com processo ordinário contra Companhia de Seguros - BB, SA pedindo que a R. seja condenada, a reembolsa-la de todas as perdas patrimoniais decorrentes do presente sinistro, a custear todos os tratamentos necessários para a sua recuperação total, ou parcial, nomeadamente a cirurgia à coluna a que terá de se submeter, a pagar-lhe a quantia de 250 000,00 euros pelos danos não patrimoniais já sofridos e a pagar-lhe todos os danos patrimoniais e não patrimoniais reclamados e só passíveis de liquidação em execução de sentença, tudo acrescido dos juros legais devidos desde a data da citação e até integral pagamento. Fundamenta este pedido, em síntese, dizendo que no dia 23 de Fevereiro de 2006 foi vítima de um acidente de viação e de trabalho, tendo a R. assumido a responsabilidade pelos danos dele decorrentes e tendo sido satisfeito o valor dos seus vencimentos até Setembro de 2006, mês em que o médico da seguradora do acidente de trabalho lhe deu alta. Ficou com uma incapacidade permanente total para o trabalho, uma vez que é enfermeira e sofreu lesões na coluna cervical que lhe inutilizam o membro superior esquerdo, tendo necessidade de ser submetida a uma operação cirúrgica à coluna, o que não resolverá completamente o problema, pois ficará sempre a sentir dor. Por via desta incapacidade para o trabalho, deixou de ter o rendimento de que dependia para suportar as suas despesas e as do seu agregado familiar, vendo-se obrigada a recorrer a um crédito pessoal pelo qual paga a mensalidade de 93,11 euros e a contratar uma empregada doméstica, tendo-se visto numa situação de grande insuficiência económica até ser arbitrada, em providência cautelar, a reparação provisória de 2.000,00 euros mensais, pelo que tem prejuízos patrimoniais de 160,49 euros em despesas com o crédito pessoal, os salários mensais de 4.000,00 euros que deixou de auferir, descontados os montantes que já lhe foram pagos, despesas com consultas, tratamentos e medicamentos a liquidar em execução de sentença e terá ainda de despender quantia, também a apurar em execução de sentença, com a operação à coluna, a que acrescem diversos danos não patrimoniais que avalia em 250 000,00 euros.
A R. contestou alegando, em resumo, que mantém a sua posição de assumir a responsabilidade pelos danos sofridos pela A., apesar de a petição inicial ser completamente omissa quanto aos factos danosos e respectiva imputação de responsabilidade. Impugna, por desconhecimento, os danos invocados na petição inicial, acrescentando que o perito do tribunal de trabalho atribuiu à A. uma IPP de 6% e que o valor pedido a título de danos não patrimoniais é excessivo.
O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido o despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes e se organizou a base instrutória, se realizou a audiência de discussão e julgamento, se respondeu à base instrutória e se proferiu a sentença.
Nesta julgou-se a acção parcialmente procedente condenando-se a R. a pagar à A. a quantia de 61.775,50 €, a importância necessária ao pagamento das despesas com a frequência, pela A., da consulta da dor e das consultas do foro psiquiátrico em que a mesma é seguida em consequência do acidente dos autos, a liquidar em execução de sentença, acrescidos dos juros de mora devidos sobre os montantes aludidos computados desde a data da sentença e até integral pagamento à taxa anual de 4% ao ano. Mais se condenou a A. a restituir à R. o diferencial entre o montante por esta pago àquela no âmbito do procedimento cautelar apenso a estes autos e o montante global liquidado da indemnização ora fixada em favor da primeira.
1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreram a A. e a R., esta subordinadamente, de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo-se aí, por acórdão de 7-3-2013, julgado parcialmente as apelações da A. e da R. e proferido a seguinte decisão: “a) fixar em 100 000,00 euros (cem mil euros) a indemnização a pagar pela ré a título de perda de capacidade de trabalho; b) condenar a ré a pagar à autora a quantia necessária ao pagamento das despesas da autora com futuras consultas da dor e futuras consultas de psiquiatria necessárias devido às lesões dos autos, bem como ao pagamento das despesas da autora com os tratamentos e medicamentos que aí sejam prescritos; c) manter o restante decidido na sentença recorrida e condenar a autora a restituir à ré a diferença entre o valor pago por esta no âmbito da providência cautelar de arbitramento de indemnização provisória e o valor da indemnização já liquidada em ambas as instâncias”. 1-3- Irresignadas com este acórdão, dele recorreram a A. e a R., esta subordinadamente, para este Supremo Tribunal, recursos que foram admitidos como revistas e com efeito devolutivo.
A recorrente principal alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões: 1ª- Dispõe a sentença do Tribunal a quo: "Dado que os montantes pagos até ao momento pela Ré se cifrarão nesta altura em € 126.000,00, a Autora deve a Autora ser condenada a restituir o diferencial (nº 2 do artigo 405º do Código de Processo Civil). Porém dado que uma parcela de condenação se mantém ilíquida, a efectivação de tal restituição apenas se revelará possível aquando da liquidação".
2ª- Decidindo nos seguintes termos: "Ainda pelo exposto condeno a Autora AA a restituir à Ré "BB - Companhia de Seguros S.A" o diferencial entre o montante por esta pago àquela no âmbito do procedimento cautelar apenso a estes autos e o montante global liquidado da indemnização ora fixada em favor da primeira" 3ª- Ora, dispõe a disposição legal invocada pelo Tribunal a quo na fundamentação da decisão de restituição a onerar a aqui Recorrente: "A decisão final, proferida na acção de indemnização, quando não arbitrar qualquer reparação, ou atribuir reparação inferior à provisoriamente estabelecida, condenará sempre o lesado a restituir o que for devido" 4ª- Interposto recurso de Apelação, pela aqui Recorrente, para o Tribunal da Relação de Lisboa, veio este último, por meio do Acórdão em crise, reiterar o entendimento sufragado na sentença do Tribunal a quo, mantendo inalterada a sentença deste último.
5ª- Entende a Recorrente que a "reparação atribuída" não se encontra liquidada à data da sentença do Tribunal a quo, uma vez que, parte da mesma ainda não se mostra líquida, conforme decidido na aludida sentença.
6ª- Assim, os termos da decisão proferida pelo Tribunal a quo, não permitem a subsunção à estatuição do artigo 405° nº 2 do CPC, uma vez que não se vislumbra i) da ausência de arbitramento de reparação; ii) da atribuição de reparação inferior à provisoriamente estabelecida; 7ª- Concluindo-se pela impossibilidade de preenchimento dos requisitos integrantes da estatuição do artigo 405° nº 2 do CPC, não se poderá ver aplicada a sua previsão, ie. a condenação da Recorrente à restituição da quantia devida à Recorrida.
8ª- Não obstante a ausência de razoabilidade legal da decisão, em clara violação ao estabelecido nos artigos 405º nº 2 e 661° nº 2, todos do CPC, padece a mesma de manifesta contradição com os seus fundamentos, nos termos e ao abrigo do artigo 668° nº 1 d) do CPC….
9ª- Devendo ser declarada nula, por não escrita, com as legais consequências.
10ª- Aguardando os autos a decisão a proferir na liquidação, com vista a indagar da existência do direito à restituição e respectiva quantificação.
11ª- Mal andando o Tribunal da Relação de Lisboa, por meio do acórdão em análise, ao manter na integra o entendimento sufragado na sentença do Tribunal a quo, à revelia dos artigos 405° nº 2, 661° nº 2, 668° nº 1 d), todos do CPC, padecendo de manifesto erro de julgamento.
12ª- No que concerne ao cálculo da indemnização arbitrada a título de diminuição da capacidade de ganho, analisando o cálculo da indemnização em consideração às variáveis consideradas pelo Tribunal a quo, não obstante, a análise do valor encontrado, com recurso exclusivo a critérios matemáticos, em apelo a juízos de equidade, entende a aqui Recorrente que o juízo de equidade deveria ter sido efectuado no apuramento do montante indemnizatório a atribuir, e não a final, como efectuado na sentença do Tribunal a quo e reiterado pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.
13ª- Pois que, na esteira da jurisprudência relevante, perfilha a Recorrente o entendimento que sufraga a falibilidade das fórmulas matemáticas no apuramento do montante indemnizatório a título de danos futuros.
14ª- De todo o modo, certo é que, com todo o respeito e consideração, a análise do montante apurado, com recurso à figura da equidade, nos termos em que é efectuado, pelo Tribunal a quo e Tribunal da Relação de Lisboa, é meramente formal, tudo se passando, na ausência de qualquer juízo de equidade.
15ª- Analisando a fórmula concretamente aplicada pelo Tribunal da Relação de Lisboa entende a Recorrente que o valor apurado não se encontra correcto.
16ª- Tal conclusão encontra fundamento, não apenas no recurso exclusivo a fórmulas matemáticas, como igualmente na divergência de valores encontrados, quando comparada factualidade semelhante nas decisões jurisprudenciais 17ª- Assim, recorrendo à fórmula corrigido, contida no acórdão nº 370/04.lTBVGS.Cl, de 2.3.2010, do Tribunal da Relação de Coimbra, temos uma indemnização apurada de 209.676.9€.
18ª- Termos em que, mal andou a Tribunal da Relação de Lisboa ao decidir como decidiu, em clara violação do disposto no artigo 562° do CC … 19ª- Uma vez que a indemnização atribuída, com fundamento no método de cálculo utilizado, não permite a cabal reconstituição da situação anterior, na esfera jurídica da Recorrente.
20ª- No que concerne à indemnização arbitrada a título de danos morais, entende a Recorrente que o montante indemnizatório se figura manifestamente irrisório.
21ª- De facto, é expressamente erigido a critério de fundamentação, na sentença...
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