Acórdão nº 0416668 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelLUÍS TEIXEIRA
Data da Resolução06 de Dezembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam em audiência de julgamento na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I.

Relatório 1.

Por sentença de 15 de Julho de 2004 do Tribunal Judicial de Santo Tirso, …..º juízo Criminal, foi o arguido B…………………., condenado pela prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art. 137.º, nº1, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos.

Foi ainda a demandada Companhia de Seguros C……………, SA, condenada: - A pagar aos demandantes D…………….. e E…………… a quantia de €947,72 (novecentos e quarenta e sete euros e setenta e dois cêntimos) a título de danos patrimoniais, quantia a que acrescerão juros de mora a contar da data da notificação do pedido cível, calculados à taxa legal de 7% até 30/04/2003, e de 4% desde 01/05/2003, até efectivo e integral pagamento; - A pagar aos demandantes D………………… e E…………….. a quantia de €48.000 (quarenta e oito mil euros) a título de danos não patrimoniais relativos à perda do direito à vida, quantia a que acrescerão juros de mora a contar da data da sentença à taxa legal de 4%, até efectivo e integral pagamento; - A pagar a cada um dos demandantes D……………… e E………… a quantia de €24.000 (vinte e quatro mil euros) a título de danos não patrimoniais relativos ao sofrimento com a morte da vítima, quantia a que acrescerão juros de mora a contar da data da sentença, calculados à taxa legal de 4% até efectivo e integral pagamento; - A pagar aos demandantes D…………… e E……………… a quantia de €12.000 (doze mil euros) a título de danos não patrimoniais relativos ao dano sofrido pela vítima antes de morrer, quantia a que acrescerão juros de mora a contar da data da sentença, calculados à taxa legal de 4% até efectivo e integral pagamento; - Absolver a demandada do demais pedido.

*2.

Não se conformando com o teor desta sentença, dela recorreu a demandada COMPANHIA DE SEGUROS C………………, para este Tribunal da Relação do Porto, sintetizando assim as suas conclusões: 1.ª É de repartir em partes iguais pelo arguido e pelo F…………. as culpas concorrentes de um e outro nas causas do acidente; aquele pelo excesso de velocidade a que circulava e este por, com desrespeito do disposto no nº. 1 do art. 101º do Cod. Estrada, ter iniciado o atravessamento da faixa de rodagem, metendo-se à frente do LP quando era iminente o seu atropelamento e saindo da dianteira de uma viatura estacionada, que o encobria dos olhos do arguido; 2ª. De igual modo, deve considerar-se em partes iguais a contribuição de um e outro para os danos, já que, pela sua súbita interposição à frente do LP, fez com que padecesse lesões gravíssimas pela violência do embate; 3ª. Não se justifica indemnização superior a 30.000,00€ pelo dano da morte, a repartir em partes iguais, com a consequente obrigação da ré de indemnizar apenas em relação a metade desse valor; 4ª. Não se justifica indemnização autónoma por o F……………. ter ficado privado das suas faculdades físicas, em virtude de ter ficado inconsciente e em coma, entre o acidente e a morte; 5ª. Assim não se entendendo, deve ela ser reduzida para não mais de 2.000,00€, a repartir nos termos referidos; 6ª. É de reduzir para não mais de 15.000,00€ a compensação aos pais pelos danos próprios sofridos com a morte do F..................... a repartir nos termos referidos; 7ª. A douta sentença recorrida, ao decidir como decidiu, violou o disposto no art. 101º, nº. 1, do Cod. da Estrada e o disposto nos arts 505º, 496º, nº. 2, e 566º,3, do Cod. Civil.

*3.

Os demandados não responderam.

  1. Colhidos os vistos, teve lugar a audiência de julgamento.

    II Delimitação do objecto do recurso: Nos termos das disposições conjugadas dos arts. 412º, nº 1, do Código de Processo Penal, 684º, nº 3 e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil, são as conclusões extraídas pela recorrente da respectiva motivação que delimitam o objecto do recurso e os poderes de cognição do tribunal, sem prejuízo das questões de que o tribunal pode conhecer oficiosamente.

  2. Assim, de acordo com a 1ª e 2ª conclusões, a recorrente suscita a questão da graduação de culpas no acidente, entendendo que a culpa deve ser graduada em partes iguais pelo arguido e vítima, com a consequente repercussão na fixação dos danos.

  3. Na conclusão 3ª entende que a indemnização pelo dano morte não deve ser fixado em montante superior a € 30 000.

  4. Na conclusão 4ª, que não se justifica indemnização autónoma da vítima, em virtude de ter ficado inconsciente e, a fixar-se, não deve a mesma ser superior a € 2000.

  5. Finalmente, deve ser reduzido o montante dos danos próprios dos demandados para o valor de não mais de € 15 000, com a morte do F......................

    III.

    Fundamentos: De facto: São os seguintes os factos que resultaram provados na sentença recorrida: 1. Pelas 18h45m do dia 02.Março.2002, na Rua Dr. Arnaldo Coelho, em Santo Tirso, ocorreu um atropelamento em que intervieram o veículo ligeiro de passageiros matrícula ..-..-LP, conduzido pelo arguido, e o menor F………………. (nascido a 27.06.1992 e filho de D………………. e de E……………….).

  6. Assim, na data dos factos, o arguido circulava sobre a Ponte do Rio Ave, no sentido Santo Tirso - Famalicão, e no início da Rua Dr. Arnaldo Coelho, ao ultrapassar uma viatura estacionada do lado direito, atento o seu sentido de marcha, junto a um estabelecimento comercial aí existente, surgiu-lhe pela frente o F………………., da direita para a esquerda atento o sentido de marcha do arguido e tentando atravessar a rua para o outro lado.

  7. O F………………. provinha de um estabelecimento comercial que marginava a estrada pela direita, atento o sentido de marcha do veículo LP, tendo surgido na travessia da faixa de rodagem após passar pela frente da viatura que se encontrava estacionada do lado direito da estrada.

  8. Enquanto passou pela frente da referida viatura estacionada, a vítima não podia ser vista pelo arguido ou por qualquer outro condutor que circulasse no sentido Santo Tirso-Famalicão.

  9. A vítima iniciou a travessia da estrada sem verificar se o podia fazer.

  10. A viatura estacionada ocupava parcialmente a faixa de rodagem por onde circulava o arguido.

  11. O arguido, que conhecia o local em causa, embateu de forma frontal no F…………….., não tendo travado antes do embate, mas após este.

  12. O F………….., após ter passado a viatura estacionada e até ser embatido pelo arguido, deu pelo menos dois passos na faixa de rodagem.

  13. Com a força do embate, o F……………… foi projectado a uma distância de 30 metros, deixando o veículo conduzido pelo arguido um rasto de travagem no asfalto de cerca de 22 metros após o embate.

  14. A via pública onde se deu o sinistro tem uma largura de 6,30 metros, o local é uma recta com inclinação ascendente, atento o sentido de marcha do arguido, o estado do tempo era bom e os travões e os pneus do ..-..-LP estavam em bom estado.

  15. No local do embate a velocidade máxima de circulação de veículos automóveis é, segundo a sinalização aí existente, de 40 km/h, além de, nesse mesmo local, existir um outro sinal de informação h7 - passagem para peões.

  16. Além disso, existe um sinal de informação h7 - passagem para peões - sobre o lado esquerdo da via, para lá do local do acidente, destinado a ser visto pelos condutores de veículos que circulam no sentido contrário ao do arguido.

  17. O arguido circulava a uma velocidade superior a 70 km/h, facto este que o impediu de travar em tempo e em segurança e assim evitar o embate no F……………...

  18. O sinistro provocou no F……………., directa e necessariamente, as seguintes lesões físicas: 1- na cabeça: a) paredes: infiltração sanguínea de toda a face interna do couro cabeludo; b) meninges: hemorragia subdural difusa em toalha sobre todos os lobos cerebrais; c) encéfalo: anemia e edema muito acentuados, amolecimento da massa encefálica e extensas zonas de contusão no tronco cerebral; 2- no raquis: a) paredes: luxação atlanto-occipital com infiltração sanguínea ao mesmo nível; b) medula: contusão no tronco cerebral e medula cervical alta e amolecimento marcado em zonas liquefeitas; 15. Tais lesões, resultantes de violento traumatismo de natureza contundente, provocaram a morte do F……………, passados seis dias do embate.

  19. Estas lesões foram provocadas pelo embate do veículo ..-..-LP, conduzido pelo arguido, e originaram a morte do F....................., sendo a sua causa directa e necessária.

  20. O arguido sabia que não podia conduzir no local do embate a uma velocidade superior a 40 km/h, uma vez que a sinalização de trânsito aí existente, e bem visível, não lho permitia.

  21. Sabia ainda que esse local era de passagem de peões, conforme a sinalização aí existente, e bem visível, lho indicava.

  22. Sabia também que devia tomar em consideração o estado da via, as condições de tráfego e a sinalização aí existentes.

  23. Actuou da forma descrita sem prever a possibilidade de poder um peão atravessar a rua de repente, comportamento que tinha o poder de observar.

  24. Sabia, por fim, ser tal conduta punida por lei.

  25. Junto do local onde o F..................... iniciou a travessia da via, mas do lado contrário a tal local, existe um entroncamento.

  26. O arguido, por força da ultrapassagem que efectuou, circulava, aquando do embate, em parte na faixa destinada aos veículos que rodavam em sentido contrário - Famalicão/Santo Tirso -, onde ficaram marcas dos rastos de travagem, não se tendo apercebido se junto ao acima aludido estabelecimento comercial se aproximava ou circulava, ou não, algum peão.

  27. O arguido, após a travagem, desviou o seu veículo para a direita, vindo a embater num muro situado 25 metros à frente do lado direito no sentido da marcha do arguido.

  28. O veiculo conduzido pelo arguido era, na ocasião do acidente, propriedade de G……………., irmão do arguido, sendo conduzido habitualmente pelo arguido.

  29. A responsabilidade civil emergente de acidente de viação relativamente a terceiros, pela circulação do veículo LP, no momento do sinistro, encontrava-se transferida para a Companhia de Seguros C………….., SA, pelo contrato de seguro titulado...

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