Acórdão nº 0725/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelADÉRITO SANTOS
Data da Resolução22 de Junho de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, na Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A…, melhor identificado nos autos, veio intentar acção administrativa especial contra o Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), de 22 de Abril de 2008, que, indeferindo recurso hierárquico, manteve decisão do Conselho os Oficiais de Justiça (COJ), que lhe impôs a sanção disciplinar de demissão, nos termos do disposto no art. 18, nº 3, do Estatuto Disciplinar (ED), aprovado pelo DL 24/84, de 16.1.

Alegou, em suma, que a deliberação impugnada padece de inconstitucionalidade de vícios geradores de nulidade e anulabilidade.

O Réu (R.) CSMP contestou, a fls. 48., ss., dos autos, sustentando a improcedência da acção, por não se verificar qualquer das ilegalidades invocadas pelo Autor (A) e por ser o acto impugnado perfeitamente legal.

O Autor apresentou alegação (fls. 61 a 99, dos autos), na qual formulou as seguintes conclusões: A.- Por acórdão do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público de 22 de Abril de 2008 foi negado provimento ao recurso hierárquico interposto pelo ora recorrente e decidido manter-se a decisão recorrida na parte em que aplicou ao recorrente a pena de demissão, com os efeitos previstos no n.º 3 do artigo 15º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 228/84 de 16 de Janeiro, B.- Sendo que a decisão recorrida era o acórdão do Conselho dos Oficiais de Justiça, proferido em 19 de Setembro de 2002, nos autos de processo disciplinar n.º ../96, onde foi aplicada ao recorrente a pena de demissão, nos termos dos artigos 11º, n.º1, al. f), 12º, nº 8, 26º, n.º 1 e 28º, com os efeitos previstos no artigo 15º, n.º 3, todos do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/84 de 16 de Janeiro, C.- Por naquele processo ter sido considerado provado o seguinte: 1- O fls. 9 do livro de registo de inquéritos n.º 12 da Delegação dos Serviços do Ministério Público do Tribunal da … foi registado em 24/6/92 o inquérito n.º ..., por emissão de cheque sem cobertura, sendo denunciante B… e denunciada C…; 2- Em 18/6/96 a mandatária da denunciante apresentou um requerimento a solicitar informação sobre o estado daquele inquérito; 3- Nessa altura e após buscas, o inquérito .../92 não foi localizado, encontrando-se extraviado; 4- Do livro de inquéritos consta que o mesmo fora remetido à Comarca de Odemira, em 16 de Maio de 1995, sendo que este último algarismo foi escrito sobre a rasura do algarismo 3; 5- O processo não foi recebido no Tribunal de Odemira, nem tal remessa foi ordenada; 6- A anotação referida nº 4 é da autoria do arguido, que exercia as funções de técnico de justiça adjunto nos Serviços do Ministério; 7- Em 28/10/98, deu entrada no Tribunal Judicial da … o ofício n.º 45627 do INGA, dirigido ao M.º P.º, no qual se solicitava informação sobre o estado do processo n.º …/91 da Polícia Judiciária, que tinha sido remetido ao tribunal através do ofício n.º 3322 de 16/11/94, com proposta de acusação pelo crime de fraude na obtenção de subsídio e burla, contra D…, E… e F…; 8- Aquele processo deu entrada no Tribunal em 18/11/94 e foi entregue ao arguido; 9- Feitas buscas tal processo não foi localizado nem o arguido o registou no competente livro de registo de inquéritos; 10- No decurso das diligências com vista à localização do processo verificou-se que existia contra os mesmos arguidos do inquérito n.º …; 11- Este processo não foi localizado nem entregue no arquivo, embora do livro de registo de inquéritos conste que fora arquivado em 15/1/94; 12- Tal anotação e também da autoria do arguido; 13- Do certificado do registo disciplinar do arguido consta a aplicação da pena de aposentação compulsiva, por acórdão de 11/3/96 do COJ.

D.- Naquele processo disciplinar foi, ainda, considerado que se verificava a agravante prevista no artigo 31.º, n.º1, al. b) do Estatuto Disciplinar uma vez que o arguido sabia que a falta de movimentação dos processos conduziria a prescrição do procedimento criminal, como aconteceu.

E.- E foi, também, considerado não se verificar qualquer das atenuantes enumeradas no artigo 29.º do Estatuto Disciplinar, F.- E que depunha a favor do arguido o seguinte: "O arguido era o único funcionário da Delegação do Ministério Público e executava todas as tarefas inerentes à mesma. Era um funcionário dedicado ao serviço, que trabalhava em regra para além do horário normal e executava bem as suas tarefas. Vivia com dificuldades económicas, que se agravaram após o falecimento do pai no início dos anos 90, facto este que lhe trazia alguma perturbado. Tem duas filhas que à data dos factos estudavam".

G.- Sendo que da decisão do Conselho dos Oficiais de Justiça, recorreu o ora recorrente para o Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público.

Alegando que...

H.- 0 Conselho de Oficiais de Justiça carece de atribuições para exercer a acção disciplinar relativamente ao recorrente, I.- Pelo que a deliberação punitiva proferida pelo Conselho de Oficiais de Justiça, teria de ser considerado nula, por falta de atribuições e competência daquele órgão.

J.- E que, como consta da fundamentação do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 73/2002, publicado em 16 de Março de 2002, na I Serie A do Diário da República, a paginas 2503 a 2505, "a norma do n.º 3 do artigo 218º da C.R.P é o parâmetro de aferição da constitucionalidade das normas infraconstitucionais que criam o Conselho de Oficiais de Justiça e fixam a respectiva competência, L.- E da norma do n.º 3 do artigo 218.º da C.R.P decorre, indiscutivelmente, a competência do Conselho Superior de Magistratura em matérias relacionadas com a apreciação do mérito profissional e com o exercício da função disciplinar relativamente aos funcionários de Justiça", M.- Pelo que são materialmente inconstitucionais as normas que atribuem ao Conselho dos Oficiais de Justiça a competência para apreciar o mérito profissional e para exercer a função disciplinar relativamente aos funcionários de justiça, N.- Não sendo, por isso, o Conselho de Oficiais de Justiça competente para proferir o acórdão, proferido em 19 de Setembro de 2002, nos autos de processo disciplinar n.º .../96 o acto ora impugnado.

O.- Aliás, pelo Acórdão do Tribunal Constitucional, anteriormente referido, foi declarada a inconstitucionalidade, com força obrigatória e geral, das normas constantes dos artigos 98º e 111º, al. a) do Estatuto dos Oficiais de Justiça, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 343/99, de 26 de Agosto, e das normas constantes dos artigos 95º e 107, al. a) do Decreto-Lei n.º 376/87 de 11 de Dezembro, na parte em que delas resulta a atribuição para apreciar o mérito e exercer a acção disciplinar relativamente aos oficiais de justiça, P.- Sendo certo que nos termos do disposto no artigo 282º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa aquela declaração de inconstitucionalidade produz efeitos "ex tunc", Q.- E acórdão do Conselho dos Oficiais de Justiça, proferido em 19 de Setembro de 2002, nos autos de processo disciplinar n.º …/96, ainda, não havia transitado em julgado.

R.- Pelo que aquele acórdão do Conselho dos Oficiais de Justiça, proferido em 19 de Setembro de 2002, nos autos de processo disciplinar n.º …/96 seria, assim, um acto nulo, nos termos do disposto no artigo 133º, n.º 1 do C. Proc. Administrativo, S.- Constituindo nulidade, por violação dos princípios constitucionais, nomeadamente por violação do disposto no artigo 218º, n.º 3 da C. R. Portuguesa, T.- Estando, pois, a decisão proferida pelo Conselho dos Oficiais de Justiça proferida em 19 de Setembro de 2002 ferida de nulidade.

U.- É que na sequência daquele juízo de inconstitucionalidade foi repristinada a norma do artigo 24º, al. b) da Lei n.º 47/86, de 15 de Outubro (Lei Orgânica do Ministério Público) segundo a qual é o Conselho Superior do Ministério Público quem tem competência para apreciar o mérito profissional e exercer a acção disciplinar relativamente aos funcionários de justiça do Ministério Público, V.- Pelo que o Conselho de Oficiais de Justiça carecia de atribuições para exercer a acção disciplinar relativamente ao recorrente, X.- Estando, assim, a referida decisão ferida de nulidade.

Z.- Sendo que, e salvaguardando melhor e mais douta opinião, as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 96/2002 de 12 de Abril ao Estatuto dos Oficiais de Justiça, aprovado pelo Decreto-Lei 343/99 de 26 de Agosto, em nada alteraram aquele julgamento de inconstitucionalidade, AA- Pelo que as normas constantes dos artigos 98º e 111, al. a) do Estatuto dos Oficiais de Justiça, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 343/99, de 26 de Agosto, na parte em que delas resulta a atribuição ao Conselho de Oficiais de Justiça para apreciar o mérito e exercer a acção disciplinar relativamente aos oficiais de justiça continuam a ser inconstitucionais, apesar da alteração que lhes foi imposta pelo Decreto-Lei n.º 96/2002 de 12 de Abril.

AB.- Alegou, ainda, o recorrente que a pena aplicada que lhe foi aplicada é demasiado severa, já que toca o topo da escala das penas disciplinares, AC.- Não tendo sido considerado o curriculum profissional do recorrente, que por si só deveria ter sido um sério obstáculo a aplicação daquela pena.

AD.- Pois que conforme consta do processo disciplinar em cerca de 30 anos de serviço, o respondente teve apenas sete faltas por greve, e...

AE.- E durante as cerca de três décadas foi classificado de: - Regular, como escriturário de 2.ª classe; - Bom, como escriturário-dactilógrafo de 2.ª classe; - Bom, com distinção, na mesma categoria; - Bom, com distinção, como ajudante de escrivão; - Bom, com distinção, como escrivão adjunto; - Muito Bom, como técnico de justiça adjunto; - Suficiente, na mesma categoria; - Suficiente, ainda, na mesma categoria; - Bom, também na mesma categoria.

AD.- Tendo nomeadamente um Inspector do COJ, em inspecção realizada ao...

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