Parecer n.º 35/2016
Data de publicação | 03 Novembro 2017 |
Seção | Parte D - Tribunais e Ministério Público |
Órgão | Ministério Público - Procuradoria-Geral da República |
Parecer n.º 35/2016
Inspeção-Geral da Educação e Ciência - Inspetor - Contacto Regular com Menores - Certificado de Registo Criminal - Idoneidade para o Exercício de Funções - Medidas de Prevenção - Direitos da Criança - Proteção de Menores - Crimes contra a Autodeterminação Sexual e a Liberdade - Sexual de Menores - Registo de Identificação de Condenados.
1.ª - Por força do disposto no artigo 2.º, n.º 2, da Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, a entidade empregadora está obrigada, relativamente a profissões públicas ou privadas cujo exercício envolva contacto regular com menores, a pedir anualmente ao trabalhador a apresentação de certificado de registo criminal e a ponderar a informação constante do mesmo na aferição da respetiva idoneidade para o exercício de funções.
2.ª - A Inspeção-Geral da Educação e Ciência (IGEC) tem por missão, no âmbito do Ministério da Educação, designadamente, o controlo, a auditoria e a fiscalização do funcionamento do sistema educativo (educação pré-escolar e educação escolar, compreendendo os ensinos básico e secundário e integrando as modalidades especiais de educação e a educação extraescolar) - artigo 2.º, n.º 1, do Decreto Regulamentar n.º 15/2012, de 27 de janeiro.
3.ª - No cumprimento de tal missão, a IGEC prossegue as atribuições previstas no n.º 2 do mesmo artigo, entre elas, as de:
- Contribuir para a qualidade do sistema educativo no âmbito da educação pré-escolar, dos ensinos básico e secundário e da educação extraescolar, através de ações de controlo, acompanhamento e avaliação, propondo medidas que visem a melhoria do sistema educativo e participando no processo de avaliação das escolas do ensino básico e secundário e das atividades com ele relacionadas;
- Zelar pela equidade no sistema educativo, salvaguardando os interesses legítimos de todos os que o integram e dos respetivos utentes, nomeadamente registando e tratando queixas e reclamações, e procedendo às necessárias averiguações;
- Assegurar a ação disciplinar e os procedimentos de contraordenação previstos na lei, nomeadamente, através da respetiva instrução.
4.ª - A prossecução de tais atribuições junto das escolas por parte dos inspetores da IGEC envolve o contacto regular destes com alunos menores.
5.ª - Deverão, consequentemente, os inspetores da IGEC que assegurem a prossecução dessas atribuições considerar-se abrangidos pela disposição legal referida na 1.ª conclusão.
Senhor Ministro da Educação,
Excelência:
Dignou-se Vossa Excelência solicitar a emissão pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República de parecer sobre a aplicabilidade da Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, aos inspetores em exercício de funções na Inspeção-Geral da Educação e Ciência (IGEC)(1).
Cumpre elaborar tal parecer, ao abrigo do disposto no artigo 37.º, n.º 1, alínea a), do Estatuto do Ministério Público(2).
1
Em anexo ao ofício em que se solicitou o parecer foi remetida uma informação(3) elaborada no âmbito da Direção de Serviços Jurídicos da Inspeção-Geral da Educação e Ciência, com o seguinte teor(4):
«Assunto: REGISTO CRIMINAL - INSPETORES DA IGEC
A presente análise versa sobre a eventual aplicabilidade da Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, alterada pela Lei n.º 103/2015, de 24 de agosto, aos inspetores em exercício de funções na IGEC.
ENQUADRAMENTO
1 - A Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, estabelece medidas de proteção de menores em cumprimento do artigo 5.º da Convenção do Conselho da Europa contra a Exploração Sexual e o Abuso Sexual de Crianças (artigo 1.º), através da aferição da idoneidade no acesso a funções que envolvam contacto regular com menores (artigo 2.º), aferição de idoneidade na tomada de decisões de confiança de menores (artigo 3.º) e, normas específicas, no que se reporta à identificação criminal (artigo 4.º). Com a entrada em vigor da Lei n.º 103/2015, de 24 de agosto, os artigos 2.º, 3.º e 4.º da Lei n.º 113/2009 foram alterados.
2 - Inicialmente, a Lei n.º 113/2009 respondia estritamente a tais exigências (cf. os n.os 1 e 2 do artigo 2.º, na sua redação original), mas com as alterações introduzidas em 2015, o legislador português optou por impor a apresentação do certificado de registo criminal, não apenas no momento do recrutamento e seleção dos trabalhadores, mas durante toda a vigência da relação jurídico-laboral ou da relação de colaboração em regime de voluntariado.
3 - Para tal, impôs às entidades empregadoras e afins a obrigação de requerer anualmente o certificado de registo criminal e de «ponderar a informação constante do mesmo na aferição da idoneidade para o exercício das funções» (vide o n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 113/2009, na sua redação atual). Esta obrigação abrange as relações constituídas antes da entrada em vigor da Lei n.º 103/2015 que perdurem (artigo 6.º), e o seu incumprimento constitui contraordenação punível com coima, podendo também ser aplicadas sanções acessórias (nos termos do n.º 8 do artigo 2.º da Lei n.º 113/2009).
4 - Em conclusão, a Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, com a redação da Lei n.º 103/2015, de 24 de agosto, visa não apenas consagrar medidas de prevenção da reincidência e da exposição de menores ao abuso e exploração sexuais, mas também satisfazer as exigências que nesta matéria emanam do direito internacional e do direito da União Europeia.
ANÁLISE:
5 - Importa, agora, debruçarmo-nos sobre o disposto nos n.º 1 e n.º 2 do artigo 2.º daquele normativo:
Medidas de prevenção de contacto profissional com menores
"1 - No recrutamento para profissões, empregos, funções ou atividades, públicas ou privadas, ainda que não remuneradas, cujo exercício envolva contacto regular com menores, a entidade recrutadora está obrigada a pedir ao candidato a apresentação de certificado de registo criminal e a ponderar a informação constante do certificado na aferição da idoneidade do candidato para o exercício das funções.
2 - Após o recrutamento a entidade empregadora ou responsável pelas atividades está obrigada a pedir anualmente a quem exerce a profissão ou as atividades a que se refere o número anterior certificado de registo criminal e a ponderar a informação constante do mesmo na aferição da idoneidade para o exercício das funções."
Decorre, desde já, do n.º 2 um ónus de controlo anual sobre a idoneidade dos trabalhadores referidos em 1.
6 - Coloca-se, pois, a questão de saber se os inspetores da IGEC estão abrangidos por aquele diploma, isto é, devem os inspetores da IGEC apresentar o seu certificado criminal anualmente, de forma a se aferir da sua idoneidade para o exercício das suas funções?
7 - A fim de responder a esta questão importa ter presente que a lei exige um contacto regular com menores, entendendo-se tal expressão:
Contacto: Relação de proximidade ou de frequentação; relação de convívio ou de comunicação (cf. Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea - Academia das Ciências, p. 944).
Regular: que é feito periodicamente, com regularidade; que é constante, que não sofre de variações; que tem um caráter permanente; o que é usual, habitual (cf. Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea - Academia das Ciências, p. 3163)(5).
8 - Iniciaremos, pois, a presente análise pela missão e atribuições desta Inspeção-Geral, de forma a podermos aferir se a atividade prosseguida pelos inspetores se enquadra naquele âmbito:
A Inspeção-Geral da Educação e Ciência é um serviço central da administração direta do Estado dotado de autonomia administrativa, tendo por missão assegurar a legalidade e regularidade dos atos praticados pelos órgãos, serviços e organismos do Ministério da Educação, ou sujeitos à tutela do respetivo membro do Governo, bem como o controlo, a auditoria e a fiscalização do funcionamento do sistema educativo no âmbito da educação pré-escolar, da educação escolar, compreendendo os ensinos básico, secundário e superior e integrando as modalidades especiais de educação, da educação extraescolar, da ciência e tecnologia e dos órgãos, serviços e organismos do Ministério.
9 - As suas atribuições vêm consagradas no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 15/2012, de 27 de janeiro, entre as quais se destacam, no que aqui interessa (por serem aquelas onde existe um efetivo contacto com menores):
[...]
"c) Contribuir para a qualidade do sistema educativo no âmbito da educação pré-escolar, dos ensinos básico e secundário e da educação extraescolar, designadamente através de ações de controlo, acompanhamento e avaliação, propondo medidas que visem a melhoria do sistema educativo e participando no processo de avaliação das escolas de ensino básico e secundário e das atividades com ele relacionadas;
[...]
f) Assegurar a ação disciplinar e os procedimentos de contraordenação previstos na lei, nomeadamente, através da respetiva instrução."
10 - Quanto ao estabelecido na alínea c) do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 15/2012 - "ações de controlo, acompanhamento e avaliação" destacamos a atividade de acompanhamento que visa observar e acompanhar a ação educativa desenvolvida pelas escolas e pelos agrupamentos de escolas, de modo a obter um melhor conhecimento dos processos de implementação das medidas de política educativa.
Pretende-se efetuar um acompanhamento regular e contínuo do trabalho dos jardins de infância e das escolas dos ensinos básico e secundário, desencadeando uma constante reflexão sobre as práticas, com vista a uma efetiva melhoria da qualidade das aprendizagens e dos resultados escolares dos alunos.
Esta ação desdobra-se em: i) Acompanhamento da Ação Educativa; ii) Educação Especial - Respostas Educativas; iii) Gestão do Currículo - Ensino Experimental das Ciências e iv) Jardins de Infância e Rede Privada.
Em relação às alíneas ii) a iv) verifica-se um contacto efetivo do inspetor com os alunos. Contudo, tal é efetuado em contexto de sala de aula, sendo que o inspetor encontra-se sempre acompanhado dos docentes e restantes alunos. No caso da "Educação Especial - Respostas Educativas" a respetiva professora de educação especial também se encontra...
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