Acórdão n.º 336/86, de 24 de Dezembro de 1986

Acórdão n.º 336/86 Processo n.º 313/85 Acordam no plenário do Tribunal Constitucional: 1 - O Provedor de Justiça requer ao Tribunal Constitucional a declaração, com força obrigatória geral, das normas dos artigos 21.º (condição 3.'), 28.º (condição 6.') e 32.º (condição 3.') do Estatuto dos Sargentos e Praças da Armada, aprovado pelo Decreto n.º 44884, de 18 de Fevereiro de 1963, e bem assim do n.º 1.º, n.º 2, alínea c), da Portaria n.º 263/77, de 13 de Maio.

Admitido o pedido, foi notificado o Primeiro-Ministro para se pronunciar, querendo, o que fez, remetendo, com despacho de concordância, fotocópia do parecer n.º 11/86 da Auditoria Jurídica da Presidência do Conselho de Ministros, contestando a existência de inconstitucionalidade das normas referidas no pedido.

Vejamos os fundamentos, tanto do pedido como da sua contestação.

II - As normas postas em causa no pedido são as seguintes: 1) Artigo 21.º (condição 3.') do Decreto n.º 44884, de 18 de Fevereiro de 1963; 2) Artigo 28.º (condição 6.') do mesmo decreto; 3) Artigo 32.º, ainda desse decreto, que é o que contém o Estatuto dos Sargentos e Praças da Armada; 4) N.º 1.º, n.º 2, alínea c), da Portaria n.º 263/77, de 13 de Maio.

Todas as normas do Decreto n.º 44884 respeitam ao Estatuto dos Sargentos e Praças da Armada e a da Portaria n.º 263/77 regulamenta a admissão de voluntários para as especialidades de pessoal militar não permanente privativo da Força Aérea e dispõem como segue: Art. 21.º De harmonia com a Lei do Recrutamento e Serviço Militar, os mancebos para serem alistados na Armada devem satisfazer às seguintes condições: [...] 3.' Ser solteiro e não ter encargos de família.

Art. 28.º A admissão por voluntariado é feita mediante concurso, devendo os indivíduos que ao mesmo desejem ser admitidos satisfazer às seguintes condiçõesgerais: [...] 6.' Ser solteiro e não ter encargos de família quando tenha menos de 25 anos deidade; [...] Art. 32.º As condições de preferência na admissão por concurso são as seguintes: [...] 3.' Ser órfão de militar da Armada; [...] N.º 1.º, n.º 2, alínea c), da portaria: 'São condições de admissão a concurso, a comprovar por meio de documentos legais: [...] c) Ser solteiro, viúvo ou divorciado, sem encargos de família; [...]' III - O Provedor sustenta o seu pedido assim: É fora de dúvida que os preceitos atrás transcritos infringem o disposto no artigo 13.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), na medida em que, sem qualquer razão plausível, por um lado privilegiam os cidadãos solteiros, viúvos ou divorciados sem encargos de família e, correlativamente, prejudicam os que não se encontram nessa situação e por outro lado cria-se um privilégio, injustificado também, a favor dos órfãos de militar da Armada.

A não admissibilidade imposta a quem seja casado ou tenha encargos de família constitui ilegítima discriminação, atenta contra o princípio da livre constituição de família, como factor impeditivo do acesso a uma profissão, o que infringe o preceito do artigo 36.º, n.º 1, da CRP.

IV - A Auditoria Jurídica da Presidência do Conselho de Ministros contraria a tese sustentada pelo Provedor de Justiça, argumentando de essencial: Os preceitos postos em causa não violam o artigo 13.º da CRP porque nesse artigo se reconhece o direito à diferença, desde que esta não ultrapasse os limites da tolerabilidade ou da discricionariedade.

Qualquer dos diplomas que inserem as normas postas em causa tem por objecto regular a admissão, a preparação e a prestação de serviço de pessoal militar não permanente, tendo, pois, como finalidade disciplinar uma matéria bem específica da integração nos corpos militares e, sendo esse o ponto que concretamente interessa, a admissão de cidadãos naqueles corpos por via do voluntariado.

E afirma: A filosofia subjacente aos dois diplomas é a da disponibilidade para o exercício de funções específicas, a que está inerente a necessidade de ausências duradouras e frequentes treinos intensivos, etc. Esta exigência de disponibilidade total do candidato não é compatível com indivíduos casados ou com encargos de família.

Face ao condicionalismo do exercício da função, a não admissibilidade de casados não é uma discriminação entre casados e entre solteiros, viúvos ou divorciados, mas antes a imposição de uma condição legítima.

Quanto à condição de preferência na admissão aos que forem órfãos de militar da Armada, é apenas uma preferência, enumerada em terceiro lugar, que só entrará em apreciação em caso de igualdade das condições anteriores. E não pode perder-se de vista que a própria CRP prevê discriminações positivas, legitimadoras de tratamento diferenciado, a fim de se alcançar a igualdade substancial, como é precisamente o caso dos órfãos e abandonados (n.º 2 do artigo 69.º), e não ultrapasse os limites da tolerabilidade, antes é uma discriminação pela positiva.

Há que decidir.

V - O pedido abrange quatro disposições - três delas relativas ao Estatuto dos Sargentos e Praças...

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