Assento n.º DAS7/92, de 06 de Agosto de 1992

Assento Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto do Tribunal da Relação de Coimbra vem recorrer extraordinariamente - ao abrigo do disposto nos artigos 437.º, n.º 2, e seguintes do Código de Processo Penal, a que pertencerão todas as demais disposições legais que venham a referir-se - do acórdão da mesma Relação tirado a 8 de Maio de 1991 no processo n.º 402/89, com base nas razões que de seguida e em síntese se passam a indicar: Relativamente à mesma questão de direito, no domínio da mesma legislação, está em oposição o ali decidido com a solução a que se chegou no aresto da Relação do Porto de 7 de Novembro de 1990, publicado na Colectânea de Jurisprudência, ano XV, 1990, t. V, pp. 151 a 152 (em fotocópia, de fl. 16 a fl.

17), que aqui se toma como acórdão fundamento.

Consiste semelhante oposição em se ter entendido, no acórdão posto em crise, constituir nulidade insanável a omissão total da indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, a que alude o n.º 2 do artigo 374.º, em diverso sentido tendo julgado o acórdão fundamento.

II - A legitimidade do recorrente encontra-se garantida pelo despacho de admissão do recurso, a confirmar o prazo em que foi interposto, a espécie e o regimeadequados.

Observado o estabelecido nos artigos 439.º a 440.º, procedeu-se ao exame preliminar e, em seguida à conferência, em que se concluiu pela oposição de julgados.

III - Havendo, por conseguinte, os autos prosseguido e tendo-se colhido o visto simultâneo, a que se refere o n.º 3 do artigo 442.º, cumpre agora decidir.

E é inquestionável que qualquer dos dois citados acórdãos, mantendo-se inalterada a legislação, chega a diversa solução quando se debruça sobre a mesma questão de direito.

Ambos apreciam, na verdade, o problema da falta de indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, no relatório por que sempre se inicia a sentença, e que se nomeia na parte final do n.º 2 do já aludido artigo 374.º Só que o aresto recorrido considera tratar-se de nulidade insanável, de que deve oficiosamente conhecer-se e como tal deve declarar-se, enquanto no acórdão fundamento se entende que essa omissão constitui nulidade dependente de arguição e que se pode invocar na motivação do recurso.

Qualquer das decisões em conflito transitou em julgado, nada obstando ao conhecimento deste pelo plenário.

  1. O ilustre procurador-geral-adjunto neste Supremo Tribunal começa, todavia, por suscitar o problema de saber se, neste momento, poderá proceder-se como que a um segundo exame preliminar, à semelhança do que sucedia quando, em caso como o dos autos, era aplicável o Código de Processo Civil.

    É consabido que o anterior Código de Processo Penal não dispunha de normas a regularem, como agora, o recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência, assim havendo que lançar mão daquele outro diploma legal, prescrevendo o § único do seu artigo 668.º que deviam observar-se as regras para idêntico recurso em matéria cível.

    E hoje não há nenhuma disposição como o n.º 3 do artigo 766.º do Código de Processo Civil, que estabelece: O acórdão que reconheça a existência da oposição não impede que o tribunal pleno, antes da solução de fundo do conflito de jurisprudência, ao apreciar o recurso, tivesse de novamente verificar se a oposição dos acórdãos se confirmava.

    Parece que o problema perdeu actualmente toda a acuidade, uma vez que, como já se afirmou, no vigente Código de Processo Penal está totalmente regulado um tal recurso extraordinário e o legislador não teria deixado de formular idêntica regra se esse fosse seu propósito.

    Isto, porém, não significa que o plenário das secções criminais, se porventura se apercebesse de que a falada 'oposição de acórdãos' não se verificava, não pudesse isso mesmo decidir, mais uma vez aplicando o n.º 3 do citado artigo 766.º, ex vi do que estatui o artigo 4.º Aliás, refere o Exmo. Procurador-Geral da República, conselheiro Cunha Rodrigues, nas Jornadas de Processo Penal, do Centro de Estudos Judiciários, que 'salvo pormenores de regulamentação que devem procurar-se, por via analógica, no Código de Processo Civil [artigo 4.º deste Código], os recursos penais passam a obedecer a princípios próprios, possuem uma estrutura normativa autónoma e desenvolvem-se segundo critérios a que não é alheia uma opção muito clara sobre a necessidade de valorizar a atitude fundamental do juiz.

    O Código rompe abertamente com a tradição que há quase um século germinou os recursos penais e cíveis'. (P. 384).

    E na nota 3 ao artigo 441.º, na 4.' edição do seu Código Anotado, escreve Maia Gonçalves: E, embora o prosseguimento seja para decidir o fundo, ou seja, o sentido em que a jurisprudência deve ser uniformizada, cremos que, tal como sucede em processo civil, o plenário das secções não está vinculado pelo que em conferência foi decidido sobre questões preliminares. O Código nada nos diz sobre esta questão: trata-se de um caso omisso em que o processo civil se harmoniza com o processo penal, em que, portanto, e nos termos do artigo 4.º, nos devemos socorrer da analogia.

    Aliás, parece-nos impensável proceder de outro modo, pois estaria o plenário das secções a fixar jurisprudência, quando de antemão se tinha apercebido da inexistência de acórdãos contraditórios, o âmbito do estabelecido no artigo 437.º, e da falência, por conseguinte, de um dos requisitos essenciais justificativos da sua actividade.

  2. Resolvida a primeira questão aflorada pelo Exmo. Procurador-Geral-Adjunto neste Supremo, passemos àquela que este plenário é chamado a solucionar.

    Toda a problemática se resume a decidir se a omissão, na sentença criminal, da indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal constituirá nulidade insanável, ou não.

    É que, como já se referiu, no acórdão recorrido entendeu-se que a falta de indicação das provas que serviram para fundar a convicção do tribunal constituía nulidade insanável da decisão, que desse modo tinha decidido, e, desse jeito, de conhecimento oficioso.

    Julgou-se, ao contrário, no acórdão fundamento que a aludida omissão, constituindo embora nulidade, não era daquela espécie, não sendo, por conseguinte, do conhecimento oficioso, podendo arguir-se na motivação do recurso.

    Deve dizer-se que neste sentido tem vindo este Tribunal a pronunciar-se uniformemente, como nos acórdãos que de seguida se transcrevem: 1 - As nulidades da sentença são nulidades dependentes de arguição, que podem ser arguidas na motivação dos recursos e, portanto, dentro do prazo da motivação.

    2 - A obrigatoriedade de indicação, na sentença, das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, estabelecida no artigo 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, destina-se a garantir que na sentença se seguiu um processo lógico e racional na apreciação da prova, não sendo, portanto, uma decisão ilógica, arbitrária, contraditória ou notoriamente violadora das regras da experiência comum na apreciação da prova [cf. O artigo 410.º, n.º 2, alíneas a), b) e c), do Código de Processo Penal].

    3 - Sendo a indicação de tais provas feita sucinta e dispersamente (fora do local indicado no artigo 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal), não se tratará de nulidade, mas de irregularidade processual, a submeter ao regime do artigo 123.º do Código de Processo Penal, suposto que a indicação, como é feita, ainda satisfaz a finalidade indicada no n.º 2. [Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Junho de 1989, no Boletim do Ministério da Justiça, n.º 388, p. 364, processo n.º 40023].

    No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Fevereiro de 1991, no processo n.º 41200...

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