Acórdão nº 65/19.1T9TCS.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2023-12-13

Ano2023
Número Acordão65/19.1T9TCS.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA – JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE TRANCOSO)
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2. Realizada a audiência de julgamento, com intervenção do Tribunal Singular, veio nela a ser proferida sentença, em 15.05.2023, na qual se decidiu:

- Condenar a arguida … Lda. pela prática, em autoria material e execução continuada, de um crime de abuso de confiança à Segurança Social, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 6.º, 7.º, n.º 1, 12.º, n.ºs 2 e 3, e 107.º, n.º 1, por referência ao artigo 105.º, n.ºs 1, todos do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 05 de Junho e 11.º do Código Penal, na pena de 360 (trezentos e sessenta) dias de multa, à taxa diária de €5,00 …

- Condenar o arguido … pela prática, em autoria material e execução continuada, por referência aos artigos 30.º, n.º 2 e 79.º, ambos do Código Penal, de um crime de abuso de confiança à Segurança Social, p. e p. pelas disposições conjugadas do artigo 6.º, 7.º, n.º 1, 107.º, n.º 1, por referência ao artigo 105.º, n.º 1, todos do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 05 de Junho, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de €5,00 …


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3. Inconformados com tal decisão dela interpuseram recurso ambos os arguidos extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões que se transcrevem:

7. A notificação da Arguida, para proceder ao pagamento do tributo em divida (paragrafo 11 dos factos provados), datada de 19/03/2019, foi praticada por pessoa que não tinha competência funcional para o ato;

8. Acrescendo que predita notificação enferma de vicio de forma, por não apresentar, de forma expressa, o valor em divida, acrescido de juros de mora;

9. Em face do que, tal notificação é nula;

10. Devendo, consequentemente, considerar-se que a Arguida não foi notificada nos termos e para os efeitos do artigo 105º / 4 do RGIT;

11. Faltando assim uma condição objetiva de punibilidade;

12. O que deverá determinar a sua absolvição.

17. Acresce que, os arguidos vieram acusados da prática, na forma consumada e em continuação criminosa, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social;

18. Acusação que o Tribunal a quo julgou provada.

19. O crime continuado, carateriza-se por advir de resoluções plurimas da atuação delituosa;

22. O agente do crime, face à ausência de meio que lhe permitam solver o tributo fiscal, toma a decisão de se abster de pagar a quotizações devidas à segurança social;

23. Renovando tal decisão sempre que se debate com a circunstância de não dispor de meios que lhe permitam pagar tal tributo fiscal;

24. Ao invés de produzir uma nova resolução de não pagar tal tributo, sempre que não dispõe de meios para o fazer, mas antes, reitere-se, uma decisão que já se encontra tomada e se renova a cada momento.


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6. Colhidos os vistos, foram os autos apresentados a conferência.

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II- Fundamentação

A) Delimitação do objecto do recurso

Assim sendo, estando a apreciação do recurso balizada pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, as questões a decidir no recurso em apreciação são as seguintes:

- A incorrecta decisão proferida sobre a matéria de facto, por erro de julgamento e por contradição insanável da factualidade provada entre si e com a fundamentação;

- A nulidade da sentença por falta de fundamentação;

- A nulidade da notificação da arguida para o pagamento integral dos montantes de quotizações retidas e não entregues à Segurança Social no prazo de 30 dias, por ter sido feita por quem não tinha competência funcional para o acto e por não indicar o valor exacto em dívida, acrescido de juros;

- A inverificação da condição objectiva de punibilidade prevista no art. 105º, nº4, alínea b) do RGIT;

- O incorrecto enquadramento jurídico-penal relativo à actuação dos arguidos na figura do crime continuado.


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B) Da decisão recorrida


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C) Apreciação do recurso

Sendo, como são, várias as questões suscitadas no presente recurso, procederemos à apreciação das mesmas pela ordem que, em termos sistemáticos, melhor se impõe.


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- Da nulidade da sentença por falta de fundamentação

Alegam os arguidos e ora recorrentes - que a sentença que por eles agora vem posta em crise “ está totalmente deserta de qualquer fundamentação de facto …

Não existe um ‘padrão’ e também não existem ‘fórmulas’ para o cumprimento da fundamentação da decisão ( sentença ou acórdão ), a qual, como é evidente, variará em função de factores tão diversos como a complexidade do thema probandum, a extensão dos meios de prova produzidos, a sua relevância ou irrelevância, a maior ou menor capacidade de síntese e de expressão do julgador. Porém, o que, em qualquer caso, é imprescindível é a sua aptidão para assegurar a função primordial supra referida, a plena compreensão da decisão, a total compreensão do que se decidiu e por que razão assim se decidiu.

A motivação exarada na sentença recorrida permite apreender o juízo de valoração e de apreciação da prova que permitiu ao julgador da primeira instância sustentar a factualidade que nele se considerou provada e não provada.

Poderá concordar-se ou discordar-se, e os recorrentes discordam da valoração feita pelo tribunal recorrido relativamente aos meios de prova em que este se ancorou para sufragar a sua convicção em relação à versão da pronúncia deduzida nos autos contra os arguidos atinente à factualidade constante das alíneas E), F) e J) do elenco factual provado, razão pela qual pretendem, também, através do presente recurso a modificação da matéria de facto que nela veio a ser considerada provada e que se mostra vertida nas citadas alíneas, mas esta divergência de perspectivas não significa, nunca, a verificação da nulidade da sentença por falta ou insuficiência de fundamentação com a abrangência normativa que o citado preceito legal comporta.

Em suma, a sentença recorrida cumpre as exigências do art. 374º, nº 2 do C. Processo Penal, não enfermando da nulidade que lhe vem assacada, prevista na alínea a) do nº 1 do art. 379º do mesmo diploma.

Soçobrando, assim, neste segmento o recurso interposto pelos recorrentes.


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- Da nulidade da notificação da arguida para o pagamento integral dos montantes de quotizações retidas e não entregues à Segurança Social no prazo de 30 dias, por ter sido feita por quem não tinha competência funcional para o acto e por não indicar o valor exacto em dívida, acrescido de juros

Em sede de motivação do recurso, alegam os recorrentes que “o ato de notificar o sujeito passivo, é um ato da competência exclusiva do Diretor da Unidade de Prestações e Contribuições do Centro Distrital da Segurança Social de ...; …

Com a arguição da nulidade da referida notificação, visam os recorrentes que se considere que a sociedade arguida não foi notificada nos termos e para os efeitos do artigo 105º, nº4 do RGIT, e, que, por isso, faltando uma condição objetiva de punibilidade, devem ser absolvidos do crime que lhe vem imputado, conforme resumo contido nas Conclusões 10ª a 12ª.

A argumentação dos recorrentes em sede recursiva a respeito da notificação dos arguidos, para efeito do disposto no art. 105º, nº4 alínea b) do RGIT, apresenta-se dúbia em relação a qual das notificações levadas a cabo nos autos para esse efeito os mesmos se referem, não só porque, no corpo da motivação do recurso se limitam a alegar que a competência para a mesma é exclusiva do Director da Unidade de Prestações e Contribuições do Centro Distrital da Segurança Social da ... e que essa competência não foi delegada “ na visada Sra. Directora do Núcleo de Contribuições” – dando, assim a entender que pretendem referir-se às notificações que constam dos autos a fls. 11 e vª e 12 e vº- já a menção feita, na Conclusão 7ª, à data de “19.03.2019 “ como tendo sido a data em que foi...

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