Acórdão nº 463/22.3PAVRS.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-05-25

Data de Julgamento25 Maio 2023
Ano2023
Número Acordão463/22.3PAVRS.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal da Relação de Évora:

A - Relatório

Nos autos de Processo Sumário supra numerados que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro - Juízo de Competência Genérica de Vila Real de Santo António, J 2 - o Digno Magistrado do Ministério Público acusou

AA, solteiro, pedreiro, nascido a 15/04/1984, filho de (…), residente (…), Vila Real de Santo António,

imputando-lhe a prática, em autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime de Violação de Proibições, p. e p. pelo art.º 353.º do Código Penal.


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A final, por sentença de 07-12-2022, decidiu o tribunal recorrido julgar a acusação deduzida pelo Ministério Público totalmente procedente, por provada, pelo que :

a) Condenou o arguido AA, pela prática de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, p. e p. pelo artº. 353º do CP, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, á taxa diária de 8 (oito) Euros, o que perfaz o montante global de 1.200,00 € (mil e duzentos euros);
b) Condenou o mesmo arguido em 2 UC’s de taxa de justiça, bem como nos encargos do processo.

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Inconformado o arguido interpôs recurso da sentença, com as seguintes conclusões:

1ª – Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida em 7/12/2022 que condenou o recorrente pela prática de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições p. e p. pelo artº 353º do CP, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de 8 Euros, no total de 1.200€ e na taxa de justiça de 2UC e demais encargos do processo;
2ª- Foi dado como provado que no dia 17/10/2022, pelas 13h 30m, o arguido conduzia o veículo de matrícula XX-XX-XX na Avenida Fernando Salgueiro Maia, já fora dos limites territoriais da cidade de Vila Real de Santo António e foi sujeito a acção de fiscalização efectuada por agentes da PSP;
3ª- Sucede que em 24/10/2022 (Referência 10589544) foi suscitada a nulidade dos actos praticados pelos dois elementos policiais da PSP, BB e CC, no dia 17/10/2022 pelas 13h 30m, no que respeita a acção de fiscalização que efectuaram ao recorrente e a elaboração do Auto de Notícia de fls. 4 e 5 destes autos;
4ª- Resulta do próprio Auto de Notícia de fls 4 e 5, que foi elaborado na qualidade de Autuante por BB, elemento da PSP, com a matrícula nº 153180, que encontrava-se acompanhada pelo elemento da PSP CC, com a matrícula nº 1143005, na qualidade de testemunha da ocorrência e da intercepção do recorrente e que ambos procederam a uma fiscalização ao condutor do veículo, o ora recorrente;
5ª- Na douta sentença recorrida foi considerado como provado que o local dos factos já estava fora dos limites territoriais da cidade de Vila Real de Santo António (vide nº 1 dos factos provados
6ª- E reconheceu-se que: "Por força da entrada em vigor da Portaria 340-A/2007, de 30/03, designadamente o seu Anexo 1, a GNR passou a ter competência territorial para o policiamento das freguesias de Monte Gordo. E, assim, seja a investigação criminal, seja a manutenção da ordem e tranquilidade públicas, são, actualmente, da competência da GNR nas referidas freguesias. Logo, concluindo, nestas matérias haverá que observar as regras de competência territorial de intervenção legalmente estabelecidas" ;
7ª- Com base nesta fundamentação e na referida disposição legal, o Tribunal "A Quo" devia ter concluído em sentido contrário de que a acção de fiscalização levada a cabo por tais elementos da PSP constitui um acto de manutenção da ordem e tranquilidade pública da competência da GNR na freguesia de Monte Gordo e, portanto, estava fora da sua alçada de competência territorial e, em consequência, ter declarado a nulidade da acção de fiscalização e do Auto de Notícia;
8ª- Ao decidir como foi plasmado na douta sentença, com os devidos respeitos, o Tribunal fez uma interpretação menos correcta da supra mencionada Portaria;
9ª- Foi também invocado (nºs 21º a 28º do requerimento supra transcrito e que aqui se dá por reproduzido), que os dois mencionados elementos da PSP estavam impedidos de praticar os actos que realizaram em relação ao recorrente;
10ª- Porquanto é do conhecimento público e oficioso do Tribunal “ A Quo” os referidos policiais BB e CC são casados e actuaram em conjunto na realização na intercepção e na fiscalização do recorrente e na elaboração do Auto de Notícia de fls. 4 e 5, em que intervêm respectivamente na qualidade de autuante e de testemunha da ocorrência;
11ª- Segundo estabelece o artº 8º, nº 2 do DL 243/2015, de 19/10, do Estatuto da Polícia de Segurança Pública, o regime de impedimentos previsto no Código de Processo Penal é também aplicável, com as devidas adaptações, aos Polícias;
12ª- Transpondo para o presente caso o disposto no nº 3 do artº 39º do CPP, os referidos Polícias BB e CC não podiam exercer funções, a qualquer título, no mesmo caso e, portanto, não podiam ter actuado juntos no mesmo veículo da PSP e ter realizado conjuntamente a acção de intercepção e de fiscalização do recorrente e elaborado o Auto de Notícia;
13ª- Ressalvados os devidos respeitos, o Tribunal fez uma incorrecta interpretação e aplicação de tais normativos e ao concluir que os impedimentos referidos pelo recorrente têm carácter intra-processual e que se dirigem a processos internos da PSP;
14ª - O Estatuto da Polícia de Segurança Pública manda aplicar o regime dos impedimentos consagrado no Código de Processo Penal aos Polícias e não criou um regime próprio e específico de impedimentos;
15ª- E sendo os impedimentos previstos no Código de Processo Penal aplicáveis aos Polícias têm de sê-lo em relação aos actos e funções por eles prestadas e praticadas enquanto Polícias;
16ª- A Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, Lei nº 35/2014, de 20/6, prevê no artº 24º, nº 4, alínea a) idêntica proibição para funcionários públicos que sejam cônjuges ou que vivam em união de facto;
17ª- Mesmo que fosse entendido que tais impedimentos só têm aplicação no âmbito de um processo, não podemos deixar de referir que o Auto de Notícia em cuja elaboração participaram os referidos elementos policiais representa o primeiro elemento processual que dá início a um processo crime e, por isso, estaria abrangido pelos impedimentos do artº 39º, nº 3 do CPP;
18ª- Assim, transpondo e fazendo as adaptações necessários do disposto no artº 41º, nº 3 do CPP, os actos praticados por Polícias impedidos são nulos e neste sentido devia ter sido proferida a douta sentença;
19ª- O recorrente invocou ainda que o referido Auto de Notícia, pelas declarações da Autuante nele inseridas e por constar como testemunha da ocorrência e da intercepção o seu cônjuge e pela forma conjunta como procederam à sua fiscalização, consubstancia um meio proibido de prova face ao disposto nos artigos 125º e 126º, nº 1 e nº 3 do CPP, por eventualmente atentar contra os direitos de defesa e contra a liberdade de determinação e a reserva da vida privada do arguido;
20ª- O Tribunal recorrido não apreciou nem decidiu este fundamento, de meio proibido de prova, embora tenha sido reconhecido na douta sentença que: “É meridianamente claro que o depoimento de dois agentes da PSP, casados entre si, intervenientes na mesma situação, oferecidos como testemunhas em processo penal, deve ser encarado com cautela, uma vez que será forte a tendência para a convergência de depoimentos”;
21ª- O Tribunal entendeu aplicar a taxa diária de 8€ em função das apuradas condições familiares e económicas do arguido e considerou por justo, adequado e proporcional esta taxa, sem indicar mais fundamentações, mas salvo melhor opinião, a taxa diária aplicada ao arguido revela-se elevada atentas as circunstâncias concretas do caso;
22ª- Nestes termos e nos que vierem a ser doutamente supridos, deverá ser concedido provimento ao presente recurso e serem declarados nulos os actos praticados pelos elementos policiais em causa e ser revogada a douta sentença recorrida com as demais consequências legais, como é de sã Justiça.

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A Exmª Procuradora apresentou resposta com as seguintes conclusões:

1.ª – O arguido AA recorre da douta sentença que o condenou, entre o mais, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 8,00 (= € 1.200,00) pela autoria material de um crime de Violação de Proibições, p.e p. pelo art.º 353.ºdo Código Penal;
2.ª – A motivação do recurso reitera os fundamentos do requerimento apresentado pelo arguido em sede de Contestação, no dia 24-10-2022, com a referência Citius n.º 10589544, no qual invoca a nulidade do acto de fiscalização praticado pelos Agentes da Polícia de Segurança Pública autuante e testemunha que o fiscalizaram, relativamente à qual o Ministério Público tomou posição no dia 04-11-2022, na Promoção com a referência Citius n.º 126052745, e que o douto Tribunal «a quo» relegou o respectivo conhecimento e decisão para o momento da prolação da...

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