Acórdão nº 461/22.7T9OLH-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2024-04-15

Data de Julgamento15 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão461/22.7T9OLH-A.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Processo n.º 461/22.7T9OLH-A.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo de Competência Genérica de Olhão - Juiz 2
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I – Relatório:
O Ministério Público veio reclamar do despacho de não admissão do recurso por si interposto, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 405.º do Código de Processo Penal.
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Iniciaram-se os presentes autos executivos com requerimento executivo apresentado pelo Ministério Público para cobrança de coima devida ao Município de Olhão.
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O Tribunal a quo declarou-se absolutamente incompetente, em razão da matéria, para executar coimas aplicadas por entidades administrativas.
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Foi interposto recurso dessa decisão e o Juízo de Competência Genérica de Olhão não admitiu a impugnação por via recursal, invocando, para tanto, a alteração legislativa promovida pela Lei n.º 27/2019, de 28 de Março, apoiando-se ainda no Parecer do Ministério Publico n.º 27/2020, de 04/10.
Concluindo que, em sede de regime contra-ordenacional, o legislador quis concentrar na administração tributária toda a cobrança de valores pecuniários, com excepção da quantia relativa à pena de multa ou indemnização arbitrada em processo penal.
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Com base no disposto no artigo 73.°[1] do Regime do Ilícito de Ordenação Social, a Meritíssima Juíza de Direito declarou que «ali se não prevê o recurso dos despachos jurisdicionais que nesta fase menor do processo (menor apenas por não estar já em causa a condenação ou a absolvição referente ao ilícito) declarem a incompetência absoluta do Tribunal».
A incompetência absoluta em razão da matéria verificada constitui excepção dilatória, de conhecimento oficioso e a todo o tempo, e importa a absolvição do Executado da instância, nos termos do disposto nos artigos 65.º, 97.º, 98º, 99.º e 577.º, alínea a), do Código de Processo Civil».
Em função disso, o recuso interposto foi rejeitado, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 420.°[2] do Código de Processo Civil.
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O Ministério Público apresentou reclamação da não admissão do recurso.
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II – Dos factos com interesse para a decisão:
Os factos com interesse para a justa decisão do litígio são os que constam do relatório inicial.
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III – Enquadramento jurídico:
A Meritíssima Juíza de Direito sustenta a posição que a competência para proceder à cobrança de coimas aplicadas por entidades administrativas está deferida à Administração Tributária e decidiu não admitir o presente recurso.
No Tribunal da Relação de Évora existe uma linha jurisprudencial que sustenta que, face à redação dos artigos 35.º do Regulamento das Custas Processuais e 148.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Tributário, advinda da Lei n.º 27/2019, de 28 de Março, conjugado com o plasmado nos artigos 131.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, 469.º e 491.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, à Administração Tributária é conferida a competência para cobrança coerciva de coimas e custas fixadas na fase administrativa do processo de mera ordenação social[3].
Neste domínio, pode ser visualizada outra corrente jurisprudencial que sufraga a posição que «é da competência dos tribunais criminais o processamento das acções executivas para cobrança de quantia certa fundadas em condenação administrativa não impugnada que tenha condenado o arguido em coima, não tendo a entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de 28 de Março, alterado esse paradigma.
A Lei n.º 27/2019, de 28 de Março, no que se refere à cobrança coerciva de custas, veio inverter o paradigma preexistente, remetendo para a execução fiscal a cobrança coerciva das custas fixadas em processo judicial, competindo à Administração Tributária proceder à sua cobrança coerciva»[4] [5].
Porém, a questão controvertida não é esta e nesta sede não cumpre avaliar se para efeitos do artigo 35.º do Regulamento das Custas Processuais as expressões “multa” e “coima” tem o mesmo significado e a quem compete a respectiva cobrança. Na realidade, a apreciação do mérito extravasa claramente o thema decidendum da presente reclamação, que apenas visa apurar se estão reunidos pressupostos habilitantes para ser admitido (ou não) o recurso interposto pelo Ministério Público.
Vejamos.
Do despacho que não admitir ou que retiver o recurso, o recorrente pode reclamar para o presidente do Tribunal a que o recurso se dirige, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 405.º[6] do Código de Processo Penal.
Estamos num domínio onde é aplicável o Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro e nesse diploma as decisões judiciais que admitem recurso estão elencadas no artigo 73.º do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas.
Todavia, não estamos em sede de absolvição ou arquivamento em casos em que a autoridade administrativa tenha aplicado uma coima superior a (euro) 249,40 € ou em que tal coima tenha sido reclamada pelo Ministério Público, dado que somos confrontados com uma decisão tornada definitiva e cuja execução se pretende. Por outras palavras, não está em causa o recurso de uma condenação em coima com valor inferior a € 249,40, mas sim apurar se o despacho de indeferimento liminar admite recurso.
Esta situação exige que exista uma conciliação com as regras relacionadas com a admissão de recurso em sede de processo civil, aplicáveis subsidiariamente[7] [8], ex vi do artigo 491.º[9] do Código de Processo Penal e 61.º[10], 88.º[11] e 89.º[12] do Regime de Ilícito de Mera Ordenação Social, na relação dinâmica com a norma do artigo 35.º[13] do Regulamento das Custas Processuais, na medida em que estamos perante uma decisão de indeferimento liminar fundada tanto na incompetência do Tribunal como no valor da coima.
De harmonia com o disposto na alínea a) do n.º 2 e alínea c) do n.º 3 do artigo 629.º[14] do Código de Processo Penal, com referência aos artigos 644.º[15], n.º 2, alínea b) e 853.º[16] do mesmo diploma,
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