Acórdão nº 366/22.1PHAMD.L1-3 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-01-11

Ano2023
Número Acordão366/22.1PHAMD.L1-3
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. - RELATÓRIO
1.1 - No processo sumário que, sob o n.º 366/22.1PHAMD, corre termos no Juízo Local Criminal da Amadora - Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, foi deduzido despacho de acusação contra os arguidos AB, NC e AD, melhor identificados nos autos, com fundamento nos factos ali descritos, no qual se conclui que aqueles incorreram “na prática, em coautoria e na forma consumada, cada um, de um [crime] de roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal…”
Submetidos os arguidos a julgamento, foi, a final, proferida oralmente a sentença e ditado o respetivo dispositivo nos termos que constam da ata da audiência de julgamento [transcrição[1]]:
«O Tribunal decide julgar a acusação procedente, por provada e, em consequência:
a) Condenar o arguido, AB, pela prática, em autoria material e na forma consumada em 02-05-2022, pelas 19:15 horas, de um crime de roubo, p. e p. pelo art.º 210 nº 1 do C.P., na pena de 15 (quinze) meses de prisão suspensa na sua execução por igual período sujeita a regime de prova.
b) Condenar o arguido, NC, pela prática, em autoria material e na forma consumada em 02-05-2022, pelas 19:15 horas, de um crime de roubo, p. e p. pelo art.º 210 nº 1 do C.P., na pena de 15 (quinze) meses de prisão suspensa na sua execução por igual período sujeita a regime de prova.
c) Condenar o arguido, AD, pela prática, em autoria material e na forma consumada em 02-05-2022, pelas 19:15 horas, de um crime de roubo, p. e p. pelo art.º 210 nº 1 do C.P., na pena de 15 (quinze) meses de prisão suspensa na sua execução por igual período sujeita a regime de prova.
d) Condenar os arguidos no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC [(cf. Art.º 344.º, n.º 2, 513º e 514º, n.º 1 todos do Código de Processo Penal, e art.º 8º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais, com referência à Tabela III a este anexa)], sem prejuízo de eventual apoio judiciário que venha a requerer.
e) Consignar, para os devidos efeitos, que após trânsito em julgado do presente acto decisório, a medida de coação a que o arguido se encontra sujeito de termo de identidade e residência mantém-se até à extinção da pena, nos termos do disposto nos artigos 196º, n.º 3 al. e) e 214º, n.º 1, e) (à contrário), ambos do Código de Processo Penal.
Notifique.
Cumpra o disposto no art.º 372º, n.º 5, do Código de Processo Penal
1.2- Mediante despacho proferido em 23.09.2022, foi determinada a retificação do transcrito dispositivo nos seguintes termos:
«Compulsado o teor da sentença gravada, proferida oralmente, consta que a pena é especialmente atenuada, o que não resulta do dispositivo, tal como não consta a condenação em co-autoria.
Rectifique no local próprio.»
2. - Inconformado com a sentença proferida, dela veio o Ex.mo Sr. Procurador junto da 1.ª instância interpor recurso, nos termos que constam do respetivo requerimento e que aqui se dão por integralmente reproduzidos, sendo que, no termo da motivação, formulou as seguintes conclusões e petitório [transcrição]:
«1. O Ministério Público deduziu acusação contra os arguidos nos autos, mais precisamente, AB, NC e AD, imputando-lhes a seguinte factualidade:
“…1. No dia 02/05/2022, pelas 19h15, os arguidos AB, NC e AD viram os ofendidos RR, RG e DR na Avenida Alexandre Sanes, junto ao n.º 19, Amadora, quando os mesmos se dirigiam na via pública para a estação ferroviária da Reboleira.
2. Ato contínuo, os arguidos abordaram os ofendidos a quem solicitaram que se aproximassem, ao que estes acederam.
3. E, de imediato, cada um dos arguidos aproximou-se e abordou um dos ofendidos a quem ordenou a entrega do seu telemóvel.
4. Assim, o arguido AD abordou DR a quem ordenou a entrega do seu telemóvel, ao que este recusou e negou ter na sua posse qualquer telemóvel, sendo que, ato contínuo, o arguido disse ao ofendido que caso não acedesse ao solicitado iria sacar da "shot”.
5. Perante as palavras proferidas pelo arguido, o ofendido DR afirmou que não iria proceder à entrega do seu telemóvel e entregou a quantia de 5€ (cinco euros), em numerário, que trazia consigo.
6. Do mesmo modo, o arguido NC aproximou-se e abordou, ao mesmo tempo, o ofendido RR, a quem ordenou a entrega do seu telemóvel sem oferecer muita resistência uma vez que a qualquer momento poderia aparecer a polícia, ao que este acedeu, tendo procedido à entrega de um telemóvel Samsung A50, com o valor aproximado de 150€ (cento e cinquenta euros), sua propriedade, ao arguido.
7. Do mesmo modo, o arguido AB aproximou-se e abordou o ofendido RG a quem ordenou a entrega do seu telemóvel, ao que este acedeu, tendo procedido à entrega ao arguido de um telemóvel Iphone 6S, no valor aproximado de 400€ (quatrocentos euros), sua propriedade.
8. Os arguidos atuaram em conjugação de esforços e intentos, na concretização de um plano previamente elaborado, com o propósito deliberado de fazer seus os telemóveis ou outros bens que os ofendidos tivessem consigo, os quais perfaziam um valor total não inferior a 555€ (quinhentos e cinquenta e cinco euros), o que quiseram e lograram concretizar, sabendo que estes lhes não pertenciam e que estavam a agir contra a vontade dos seus legítimos proprietários.
9. Para conseguir esse objetivo, os arguidos não hesitaram em intimidar os ofendidos, utilizando a ameaça de violência descrita, visando assim anular qualquer resistência por parte destes às suas ilegítimas pretensões.
10. Agiram os arguidos de modo livre, voluntário e consciente, bem sabendo que a sua conduta era prevista e punida por lei criminal.
Das circunstâncias relevantes para a atenuação especial das penas que devem ser aplicadas aos arguidos:
1. À data dos factos o arguido AB tinha 16 anos de idade.
2. O arguido AB integra o agregado familiar da progenitora, com quem reside e duas irmãs.
3. O arguido AB tem o 10.º ano de escolaridade.
4. O arguido AB não tem antecedentes criminais.
5. À data dos factos o arguido AD tinha 17 anos de idade.
6. O arguido AD integra o agregado familiar dos progenitores, com quem reside juntamente com duas irmãs e um tio.
7. O arguido AD tem o 9.º ano de escolaridade.
8. O arguido AD não tem antecedentes criminais.
9. À data dos factos o arguido NC tinha 17 anos de idade.
10. O arguido NC integra o agregado familiar da progenitora, com quem reside juntamente com cinco irmãos.
11. O arguido NC tem o 9.º ano de escolaridade.
12. O arguido NC não tem antecedentes criminais.
Ao agir do modo descrito os arguidos, incorreram na prática, em coautoria e na forma consumada, cada um, de um roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal…”
2. Na diligência de audiência de julgamento, mais concretamente após a produção e análise de toda a prova, o Ministério Público, após ter-lhe sido dada voz para alegações orais, requereu, antes de mais, por considerar ter existido um lapso de escrita no despacho de acusação, mais precisamente, no que se refere aos crimes imputados aos arguidos, que o erro fosse corrigido, nos termos do art.º 380.º, n.º 1, al. b) do Código Processo Penal, e por conseguinte, que fosse comunicado aos mesmos, nos termos do art.º 358.º n.º 3 ex vi n.º 1, igualmente, do Código Processo Penal, que a factualidade que lhes foi imputada era susceptível de integrar a prática, em co-autoria material e na forma consumada, de 3 (três) crimes de roubo, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 1 do Código Penal e não na prática, em co-autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime de roubo, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 1 do Código Penal, conforme vinha referenciado no despacho de acusação, e por conseguinte, que lhes fosse concedido o tempo estritamente necessário para a preparação das suas defesas, caso os mesmos o solicitassem.
3. Não obstante o exposto, a Meritíssima Juiz de Direito do Tribunal a quo apesar, por um lado, ter dado como provados todos os factos imputados no despacho de acusação, por outro, ter concluído que os arguidos na execução daqueles, actuaram em co-autoria material e na forma consumada, e por fim, que as condutas ou comportamentos ilícitos atingiram três vítimas ou ofendidos, em nosso entendimento incorrectamente, de forma injustificada e totalmente infundamentada, condenou cada um dos arguidos, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de apenas 1 (um) crime de roubo, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º1 do Código Penal.
4. No entanto, o crime de roubo consiste num crime complexo uma vez que a sua execução o agente atinge ou ofende bens de natureza patrimonial, bem como, bens eminentemente pessoais, nomeadamente a integridade física, liberdade pessoal e, em alguns casos, até da vida dos ofendidos.
5. O art.º 30.º, n.º 3 do Código Penal, que foi aditado pela Lei 59/07, de 04-09, exclui a possibilidade de qualificação de uma pluralidade de factos como integrantes de continuação criminosa ou de crime único quando os bens atingidos forem eminentemente pessoais, sendo que, o crime de roubo, enquanto crime complexo que é, ofende bens jurídicos patrimoniais e bens jurídicos pessoais, designadamente a liberdade individual de decisão e de acção e a integridade física, razão pela qual, tem sido entendimento jurisprudencial e doutrinário pacifico que “…Haverá assim tantos crimes de roubo quantas as pessoas coagidas pelo agente a entregar a coisa…”, vide, entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.09.2019, proc. 813/17.4SFLSB, relator Maia Costa, disponível em www.dgsi.pt.
6. Ora, no caso em apreço, tendo por base os factos dados como provados na sentença condenatória, conclui-se, necessariamente, que os arguidos executaram os factos ilícitos ora em análise, materializando um acordo de vontades previamente estabelecido para o efeito, comum entre todos, ou seja, cumprindo uma predisposição
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT