Acórdão nº 331/21.6GBFND.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 12-07-2023

Data de Julgamento12 Julho 2023
Ano2023
Número Acordão331/21.6GBFND.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO – JUÍZO LOCAL CRIMINAL DO FUNDÃO)

Acordam, em conferência, na 5ª secção, do Tribunal da Relação de Coimbra


I–RELATÓRIO


1. Por despacho datado de 07.11.2022 foi decidido rejeitar por inadmissibilidade legal, nos termos dos (cf. os artigos 283.º, n.º 3, alíneas b) e c), e 287.º, n.ºs 1, alínea b), 2 e 3, do Código de Processo Penal) o requerimento para abertura de instrução apresentado pelo assistente …

2. Inconformado, recorreu o assistente apresentando as seguintes conclusões

«…

2. Considera o Recorrente que o despacho recorrido denuncia, por um lado, um erro de julgamento – particularmente quanto à falta de observação e constatação dos factos constitutivos das infrações penais descritas no requerimento de abertura de instrução - e, por outro lado, por errada subsunção dos factos ao direito, in casu cabendo a admissibilidade legal da abertura da fase de instrução, gerando, igualmente, a nulidade do despacho por deficiente fundamentação da decisão.

4. Apresentou assim o Recorrente, o seu requerimento de abertura de instrução:

IV. DOS FACTOS

34.

No dia 24 de Junho de 2021, sensivelmente pelas 09:30, deslocou-se o Ofendido à dependência da Caixa Geral de Depósitos no ..., sita na Rua ... naquela cidade.

35.

Tendo efetuado, ao balcão, o levantamento do montante de 5.000,00€ (cinco mil euros), sendo-lhe entregues 100 (cem) do Banco Central Europeu, com o valor facial de 50,00€ (cinquenta euros).

36.

Após tal levantamento e tendo saído da agência da CGD, o Ofendido dirigiu-se para o seu veículo automóvel, estacionado na Rua ..., onde colocou o envelope contendo o montante levantado em cima do tablier, tendo, naquele momento, sido abordado pela Arguida.

37.

Tal abordagem foi feita através de gestos e pancadas no vidro da sua viatura, tendo o Ofendido ouvido a Arguida dizer, numa pronúncia que identificou como não sendo portuguesa, as expressões “dinheiro, dinheiro”.

38.

Razão pela qual o Ofendido saiu da viatura, deixando a porta desta aberta e ao ver a indicação da Arguida para a parte traseira do veículo, ali se deslocou, constatando existirem diversas notas caídas no chão.

39.

Em consequência, inclinou-se para recolher as notas caídas, tendo posteriormente constatado que a Arguida já não se encontrava no local.

40.

Ao entrar, de novo, no seu veículo verificou que o envelope que ali tinha deixado, contendo a quantia levantada pouco antes, tinha sido furtado pela Arguida.

41.

Alarmado com a situação, percorreu aquela rua com vista a alcançar a Arguida, não logrando o objetivo, porquanto a mesma já se havia posto em fuga.

42.

Nesse mesmo dia, dirigiu-se por duas ocasiões ao Posto Territorial ..., sito na Rua ..., no ..., a primeira para efectuar a competente denuncia, a segunda para questionar se já havia sido recuperado o seu dinheiro.

45.

Como consequência direta e necessária da conduta da Arguida, AA, acima descrita, o Ofendido, BB ficou despojado do montante de 5.000,00€.

46.

Como consequência direta e necessária da atuação do arguido, o Ofendido ficou com o seu património diminuído em valor equivalente ao montante subtraído pela Arguida.

47.

Com toda a sua conduta, supra descrita, a Arguida agiu sempre com o propósito de ludibriar para se apropriar indevidamente do montante de 5.000,00€ pertença do Ofendido, o que conseguiu.

48.

A arguida agiu sempre de forma livre, deliberada e consciente, sabendo, ainda, que a sua conduta era proibida e criminalmente punida.

49.

Procedendo do modo anteriormente descrito, cometeu a arguida, o crime de furto qualificado, p. e p. art.º 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, al. b) do Código Penal.”

6. Sucede que para o Tribunal a quo tal descrição circunscrita, mas objetiva dos factos, leva a considerar que “(...) não se vislumbra um só facto objetivo integrador do tipo ilícito de que ora tratamos”.

7. A rejeição do Rai do recorrente pelo Tribunal a quo fundou-se na inadmissibilidade legal da instrução, decorrente do não preenchimento pela referida peça processual dos requisitos exigidos pelas disposições conjugadas do n.º 1, al. s), 2 e 3 do art. 287º e do n.º 3 do art. 283º, ou seja, por não conter a descrição dos factos pelos quais o assistente pretende que a arguida seja pronunciado, mais concretamente a factualidade integradora do tipo objetivo do crime.

10. Percorrendo integralmente o RAI, não só a segunda parte em que a assistente redige uma acusação alternativa, mas também a primeira em que discorre sobre as razões de discordância relativamente ao despacho de arquivamento, constata-se que nele são descritos.

11. Elemento objetivo: apropriação ou subtração ilegítima de coisa móvel alheia. O que foi logrado pelo furto da Arguida, descrito pelo recorrente, ali assistente.

13. Isto porque através do estrábico olhar com que foi analisado o RAI, faz o Tribunal a quo incorrer numa parca e deficiente fundamentação do despacho.

14. Manifesto nas motivações do presente recurso, entende o ora Recorrente que não se cumpriu o disposto no artigo 607.º, n.º 4, do Código Processo Civil, …

15. O Recorrente não poderia censurar mais o despacho recorrido por vício de nulidade nos termos do art. 615 º,nº 1, alínea b) do CPC, por omissa na referência às razões que, à luz dos princípios legais aplicáveis justificaram a não admissão do RAI apresentado.

16. Entende o Recorrente que a decisão vertida no despacho de que se recorre não só está inquinada, como, de resto, se resume a esta justificação:

“Ora percorrido o requerimento para abertura de instrução, não se vislumbra um só facto objetivo integrador do tipo ilícito de que ora tratamos”

17. E nada mais diz o Sr. Juiz de Instrução sobre a alegada ausência.

18. E é tal atropelo à Lei e às normas aplicáveis que deve ser, para além do mais, considerada nula tal decisão por falta de fundamentação que originou a decisão recorrida.

3. O Ministério Público, respondendo ao recurso, pugnou pela sua improcedência.

4. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de que o recurso deve ser julgado procedente, procedendo-se à requerida instrução.

5. Cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o arguido não exerceu o seu direito de resposta.

6. Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido a conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.

7. Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objeto do recurso:

De acordo com as conclusões da motivação do recurso interposto nestes autos, é a seguinte a questão a que cabe dar resposta:

- Do requerimento para abertura de instrução constam os elementos objetivos do crime imputado?

II. Despacho recorrido (transcrito na parte ora relevante)

«…, veio o mesmo requerer a sua constituição como assistente, bem como a abertura de instrução …

Para tanto alegou, em suma, que «[b]astaria socorrer-se o Ofendido do despacho de arquivamento (...) para que na óptica do Assistente as diligência de investigação perseguidas pelo OPC, fossem consideradas razoáveis e sem qualquer dúvida suficientes, para que com segurança pudesse o Ministério Público lavrar a devida e imposta acusação».

E é por isso que se impõe tecer algumas...

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