Acórdão nº 2887/22.7T8VFR.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-07-12

Ano2023
Número Acordão2887/22.7T8VFR.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. Nº 2887/22.7T8VFR.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo do Trabalho de Santa Maria da Feira - Juiz 1

Recorrente: Ministério Público
Recorrida: A..., S.A.



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto


I - RELATÓRIO
A..., S.A., pessoa colectiva n.º ..., com sede na Rua ..., ... Porto, notificada da decisão administrativa proferida pela ACT – Centro Local de Entre Douro e Vouga, veio interpor recurso de impugnação da referida decisão, que aplicou a coima de 27 UC, pela prática da contra-ordenação leve, prevista e punível pelo artigo 521.º, n.º 3, do Código do Trabalho e nos termos do artigo 551.º, n.º 3, do Código do Trabalho e responsabilizou, solidariamente, pelo pagamento da coima o representante legal da arguida, AA.
Fundamentou a sua impugnação alegando, em síntese, que o conteúdo funcional do trabalho desenvolvido pelos seus trabalhadores BB e CC não é subsumível à categoria de operador informático prevista no CCT alegadamente aplicável à relação laboral em causa. O seu trabalho consistia exclusivamente na prestação de auxílio informático ao utilizador de computador do cliente e apenas residualmente competia-lhes instalar e configurar impressoras, computadores e respectivo software. O trabalhador DD, por sua vez, apenas recebeu formação para o efeito, mas não chegou a desempenhar tais funções.
Mais, alegou que, por outro lado, a actividade principal da recorrente prende-se com a consultoria em tecnologias de informação, a qual não se insere no âmbito do sector económico de aplicação da CCT. Por isso, o CCT tido em conta na decisão administrativa não é aplicável à relação laboral que se discute. Acrescendo que, não existia qualquer diferenciação funcional, designadamente em termos de complexidade, entre os trabalhadores em causa, pelo que não se concebe o motivo pelo qual os diferenciais apurados que constam do mapa anexo ao auto de notícia tiveram como pressuposto que todos teriam a categoria de operador informático principal e no mapa de apuramento elaborado também não foi considerado o valor da retribuição base auferida pelos trabalhadores EE e DD desde Abril de 2021.
Por fim, alega que, mesmo que assim não se entenda, a coima sempre deverá ser especialmente atenuada, por a recorrente ter agido convicta de que cumpria a lei.
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Recebida no Tribunal, ora, recorrido foi admitida a impugnação com efeito suspensivo, face à caução prestada e realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença, de cujo dispositivo consta, a seguinte:DECISÃO.
Nestes termos, julgo procedente o presente recurso de impugnação judicial e, em consequência, revogo a decisão da Autoridade para as Condições do Trabalho – Centro Local de Entre Douro e Vouga, que aplicou a A..., S.A. a coima de 27 UC’s, correspondente a €2.754,00, pela prática da contra-ordenação, prevista e punível pelo artigo 521.º, n.º 3, do Código do Trabalho, absolvendo a arguida da mesma.
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Sem custas (cfr. artigos 513.º, n.º 1 a contrario, e 514.º, n.º 1 a contrario, ambos do Código de Processo Penal, e artigos 93.º, n.º 3 e 4 a contrario e 94.º, n.º 3 a contrario, ambos do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27-10).
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Notifique.
Cumpra o disposto no artigo 45.º, n.º 3, da Lei n.º 107/2009, de 14-09.
Proceda ao depósito (artigo 372.º, n.º 5, do Código de Processo Penal ex vi do artigo 41.º, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27/10).”.
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Inconformada com esta decisão a Magistrada do Ministério Público, junto do Tribunal recorrido interpôs recurso, nos termos da motivação junta que terminou com as seguintes: “C O N C L U S Õ E S
A CTT publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 19, 22/5/2019 aplicável ao presente caso define no Anexo I, ponto 1.1 o conteúdo das funções do operador informático.
"Operador(a) informático(a) - Desempenha uma ou ambas as funções:
a) De computador - receciona os elementos necessários à execução dos trabalhos no computador, controla a execução conforme o programa de exploração, regista as ocorrências e reúne os elementos resultantes. Prepara, opera e controla o computador através da consola.
b) De periféricos - prepara, opera e controla os órgãos periféricos do computador”.
O Tribunal a quo considerou que os trabalhadores preparavam, operavam e controlavam o computador ou periféricos (verificada a alínea b) do CTT da categoria de operador informático).
Mas apenas o faziam como meio de prestar apoio utilizador, ou seja, não executavam trabalhos no computador nem trabalhavam nos periféricos, pelo que não permite reconhecer-lhes a categoria de operador informático.
Da leitura do conteúdo funcional da categoria de operador informático não é mencionada a tarefa “execução de trabalhos no computador ou periféricos”, mas sim a receção dos elementos necessário à execução.
Na verdade, tal exigência consignada pela Mmº Juiz na douta sentença para a categoria de operador informático, de execução de trabalhos no computador e periféricos, está prevista no CTT mas para a categoria profissional de programador informático, que estuda as especificações, codifica, testa, corrige, faz manutenção e documenta os módulos de utilização geral. Pesquisa as causas de incidentes de exploração.
Resulta dos factos provados e da fundamentação da douta sentença que os trabalhadores em causa preparavam, operavam e controlavam o computador ou periféricos e realizavam essa atividade, na prossecução das atividades administrativas da empresa, para a qual a atividade de operador informático, tal como é descrita no CTT, se mostra direcionada.
Estão, assim, verificadas as duas funções que caracterizam a categoria de operador informático.
A douta sentença em recurso não submeteu a matéria fáctica provada a correto tratamento jurídico, fazendo uma errónea interpretação dos preceitos legais aplicáveis.
10º
A sentença recorrida padece do vício consignados no 410, nº2, alínea b) do CPP ex vi do do 60º da Lei 107/2009, de 14.09, e 41º, nº 1, do DL 433/82, de 27.19, na redacção do DL 244/95, de 14.09, contradição insanável da fundamentação e entre a fundamentação e a decisão.
11ª
Na sua decisão a Mmº Juiz a quo violou, o disposto no artigo 521.º, do Código do Trabalho, a Convenção Colectiva do Trabalho publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 19, 22/5/2019, clausulas aplicável ao presente caso define no Anexo I, ponto 1.1
12ª
Deve assim revogar-se o douto despacho em recurso e substituir-se por outro que julgue improcedente o recurso de impugnação judicial apresentado pela arguida mantendo-se a decisão administrativa que a condenou na prática da contraordenação p.p. pelo artigo 521.º, n.º 3, do Código do Trabalho
Porém, Vossas Excelências, Senhores Juízes Desembargadores
Decidirão, como sempre, fazendo J U S T I Ç A.”.
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Admitido o recurso, com efeito suspensivo, respondeu a arguida pedindo ainda a ampliação das questões que enformam o objecto do recurso, nos termos do disposto no art.º 636 do CPC, aplicável ex vide art.º 4 do CPP, apresentando contra-alegações, que finalizou com as seguintes: Conclusões:
1.º Funda, o recurso interposto, no depoimento da testemunha FF, mencionando que seria suficiente para dar como provado que os trabalhadores em causa executavam trabalhos no computador, ao contrário do facto que veio a ser dado como provado pelo Tribunal ad quo descrito no ponto 41 dos factos provados.
Porém, entende-se que não lhe assiste razão.
Na verdade, decorre da fundamentação dos factos dados por provados, em particular do depoimento de GG, do próprio depoimento de FF onde foi claro que competia aos trabalhadores prestar apoio (“dar suporte”) aos utilizadores, tal como também o disseram os trabalhadores em causa que depuseram, que todas as testemunhas em uníssono afirmaram que o cerne das funções desempenhadas pelos trabalhadores BB e CC (e do DD, ainda que, na B..., apenas tenha estado em formação) era a prestação de auxílio/apoio aos utilizadores de computadores (trabalhadores da B...). Por conseguinte, não efectuavam reparações de equipamento/hardware, ou executavam trabalhos no computador.
2.º Assim é claro que da prova produzida, os trabalhadores em causa, embora tivessem de preparar, operar e controlar o computador ou periféricos, apenas o faziam como meio de prestar apoio ao utilizador, ou seja, não executavam trabalhos no computador nem trabalhavam nos periféricos, de acordo com o facto descrito no ponto 41 da matéria de facto dada por provada não sendo de modo algum contraditório com este.
Assim nesta parte deverá improceder o recurso interposto.
3.º E, quanto suficiência ou não dos factos dados por provados para os integrar na categoria de operador informático, temos para nós que também aqui não assiste razão ao recorrente.
De facto, no caso concreto, ficou demonstrado que os trabalhadores BB e CC prestavam auxílio informático ao utilizador de computador, mediante um pedido para o efeito apresentado, ou seja, desempenhavam funções de “help desk/service desk”, procurando, numa primeira fase, resolver o problema/anomalia de forma remota, apenas se deslocando ao local de trabalho do utilizador, caso tal não fosse possível.
4.º Se assim é, como inequivocamente é, não prestavam os trabalhadores em causa assistência às redes informáticas, manutenção de sistemas informáticos ou atualização e manutenção do software. O núcleo das suas funções residia, pois, na prestação de apoio ao utilizador de computador.
5.º Ora, a categoria de operador informático, insere-se no grupo de profissionais administrativos, referenciada à realização de «operações com diferentes tipos de máquinas de escritório ou de informática».
Trata-se de uma vertente profissional direcionada para a realização de tarefas de natureza administrativa, onde se articula com duas outras categorias profissionais, a dos analistas informáticos e a dos programadores informáticos.
Daí que na sua matriz, o operador informático seja o
...

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