Acórdão nº 20989/20.2T8LSB-A.L1-1 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-02-28

Ano2023
Número Acordão20989/20.2T8LSB-A.L1-1
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

I – Relatório
1- “P… (UK) Limited”, sociedade de Direito Inglês, instaurou a presente providência cautelar de Suspensão de Deliberações Sociais contra “G… SGPS, S.A.”, pedindo a suspensão das seguintes deliberações :
-Designação como Fiscal Único efectivo da Sociedade “A… – Sociedade de Revisores Oficiais de Contas”, representada pelo senhor J.E.L.S.Q., e como Fiscal Único suplente o Sr. Dr. A.G.S., até ao final do corrente mandato (2018/2020).
-Ratificação da designação feita por decisão do Fiscal Único de 01.07.2020 de Senhora A.M.M.F.D.T.C. como Administradora Única para o mandato corrente correspondente ao triénio 2018/2020, com dispensa de caução e sem remuneração.
-Designação como membros da Mesa da Assembleia Geral para o corrente mandato (2018/2020), como Presidente: M.F.M. ; como Secretário: R.F.M.S.G..
Para fundamentar tal pretensão alega a Requerente, em síntese, que é accionista única da sociedade Requerida, cujo capital social no valor de 50.000€, se encontra dividido em 10.000 acções ao portador, com o valor nominal de 5€.
A administração da sociedade foi exercida por T.T.C., seu Administrador Único, até 2/11/2019, data em que faleceu.
No dia 17/8/2020, foram tomadas, em Assembleia Geral da Requerida, as deliberações acima indicadas.
Refere que as deliberações em causa são nulas, porquanto foram tomadas por quem não possui competência para o efeito e porque foram tomadas por quem não tem a qualidade de accionista da sociedade, o que causou danos, que elenca, à sociedade.
2- A Requerida deduziu oposição, pugnando pela improcedência do procedimento.
3- Realizou-se o julgamento com observância do legal formalismo.
4- Posteriormente, foi proferida Sentença que julgou o procedimento cautelar improcedente, constando da sua parcela decisória:
“Pelo exposto, o Tribunal julga o presente procedimento improcedente e, consequentemente, indefere a pretensão de suspensão da deliberação social consubstanciada
-Pela designação como fiscal único efetivo da sociedade o Senhor “A… – Sociedade de Revisores Oficiais de Contas”, representado pelo senhor J.E.L.S.Q., e como fiscal único suplente o Sr. Dr. A.G.S., até ao final do corrente mandato (2018/2020);
-Pela ratificação da designação feita por decisão do Fiscal Único de 01.07.2020 de Senhora A.M.M.F.D.T.C. como Administradora Única para o mandato corrente correspondente ao triénio 2018/2020, com dispensa de caução e sem remuneração.
-Pela designação como membros da mesa da assembleia geral para o corrente mandato (2018/2020), como Presidente: M.F.M.; como Secretário: R.F.M.S.G..
**
A taxa de justiça paga pelas partes será atendida a final na acção principal, nos termos do artigo 539º, nº 2 do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.
Após trânsito, comunique para efeitos do disposto na alínea h) do artigo 9.º do Código do Registo Comercial.
Valor: €30.000,01 (artº 304º do CPC)”.
5- De tal decisão interpôs a Requerente recurso de apelação, juntando a sua alegação, na qual apresentou as seguintes conclusões:
“A – A apelante P… (UK) Limited, apresentou providência cautelar de suspensão de deliberações sociais nos termos e para os efeitos dos artigos 380º e seguintes do Código de Processo Civil contra G… SGPS, S.A.,
B – As deliberações em causa no requerimento inicial, tomadas a 17 de Agosto de 2020 eram as seguintes:
- designação como fiscal único efectivo da sociedade o Senhor “A… – Sociedade de Revisores Oficiais de Contas”, representado pelo Senhor J.E.L.S.Q., e como fiscal único suplente o Sr. Dr. A.G.S., até ao final do corrente mandato (2018/2020);
-ractificação da designação feita por decisão do fiscal único de 01 de Julho de 2020 de nomear a Senhora A.M.M.F.D.T.C. como Administradora Única para o mandato corrente correspondente ao triénio 2018/2020, com dispensa de caução e sem remuneração;
-designação como membros da mesa da assembleia geral para o corrente mandato (2018/2020), como Presidente: M.F.M.; como Secretário: R.F.M.S.G..
C – A apelada, é uma sociedade gestora de participações sócia, formando com as participadas, um grupo societário.
D – Em Novembro de 2019 faleceu, T.T.C., o administrador do fundador e que alienou à aqui apelante há mais de quatro anos, as acções das mesmas.
E – E após o referido óbito, parte dos seus herdeiros, à revelia do legítimo accionista desse grupo societário (aqui apelante), fazendo absoluta tábua dos seus direitos de propriedade e direitos sociais procuraram apropriar-se da apelada.
F – E em prejuízo da própria sociedade ora apelada e das sociedades que esta detém e gere, que têm presentemente a sua actividade totalmente bloqueada e se encontram a ser geridas por quem é completamente alheio à sua actividade, ao seu normal funcionamento, interesses e subsistência, com perigo manifesto e evidente de dissipação do seu património por quem, não esconde, que dele se pretende apropriar, adoptando as deliberações acima referidas e que se visava suspender com o procedimento cautelar requerido.
G – O falecido T.T.C., exerceu funções de Administrador Único da sociedade G… – SGPS, S.A., até à data da sua morte em 02 de Novembro de 2019.
H – Sucederam, por morte, a T.T.C., sua mulher – A.M.M.F.D.T.C. e os seus dois filhos, R.M.D.T.C. e M.M.D.T.C., exercendo a primeira o cargo de cabeça de casal.
I – Após o falecimento de T.T.C., a apelada ficou sem administração, situação que se manteve até recentemente.
J – No dia 01.07.2020, à revelia da ora apelante, a sociedade A… – S.R.O.C., representada por J.E.L.S.Q., arrogando-se a qualidade de Fiscal Único da Requerida, procedeu à nomeação de A.M.M.F.D.T.C. como Administradora Única da sociedade.
K - O que fez, alegadamente, na qualidade de Fiscal Único da sociedade e ao abrigo do disposto da alínea c) do nº 3 do artigo 393º do Código das Sociedades Comerciais.
L – Deliberação que se visava ratificar com a Assembleia Geral que se realizou a 17 de Agosto de 2020
Bem como,
M – A designação do fiscal único até ao fim do mandato de 2018/2020.
E,
N –A designação dos membros da mesma da Assembleia Geral para o mesmo mandato.
O – A convocação pelo Fiscal Único J.E.Q., seria nula porque adoptada por quem não tinha legitimidade para o efeito, pois por força do artigo 423º-A do CSC, não havendo Conselho Fiscal, as referências que lhe são feitas devem considerar-se relativas ao Fiscal Único.
P – Nos termos do nº 3 do artigo 415º do CSC, os membros efectivos do conselho fiscal cujas funções tenham cessado são substituídos pelo suplente.
Q – Assim, por força do artigo 423º-A do CSC, cessando o mandato do Fiscal Único, o mesmo será substituído pelo seu suplente e nos termos do nº 4 do artigo 415º do CSC, o suplente que substitua o membro efectivo cujas funções tenham cessado mantém-se em funções até à primeira assembleia anual, que procederá ao preenchimento das vagas.
R – Pelo que, a sociedade A… – S.R.O.C. não possuía competência para convocar a referida Assembleia Geral.
S – Razão pela qual, a convocatória do alegado Fiscal Único da apelada se encontra ferida de nulidade, por ter sido efectuada por quem não tinha competência para o efeito.
T – Verifica-se igualmente nulidade da sentença por omissão de pronúncia, porquanto a sentença a quo, não reconhece sequer à aqui apelante a qualidade de sócia da apelada.
Para tal,
U – Faz apelo à decisão de 21 de Junho de 2020, proferida no âmbito de procedimento cautelar com o Proc.º n.º 11269/20.4T8LSB do Juiz 3, considerando que a decisão aí tomada vincula os demais processos judiciais.
E,
V – Nesse procedimento cautelar foi entendido que as acções da apelada seriam tituladas pela cabeça de casal de T.T.C. e da herança deste, representada também por aquela.
W – A referida providência cautelar requerida foi decretada sem a inquirição prévia da apelante, que nem sequer é parte.
X – De acordo com o art.º 619º nº 1 do C.P.C. a decisão sobre a relação material controvertida tem, uma vez transitada em julgado, força obrigatória dentro e fora do processo, constituindo assim caso julgado material.
Y – As providências cautelares são fundadas na mera probabilidade de existência do direito que se pretende acautelar, no periculum mora, tendo por isso uma relação de instrumentalidade hipotética com o processo de que dependem.
Z – O efeito do caso julgado é próprio de uma decisão de mérito, enquanto que o juízo sobre a probabilidade da existência do direito no procedimento cautelar, afasta a ideia de definitividade que o caso julgado pressupõe
AA – Ao não o fazer, a decisão final ora recorrida, é nula por omissão de pronúncia, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 615º nº 1 do C.P.C..
BB – Sendo a apelante alheia ao referido procedimento cautelar, e tendo esta feito prova da titularidade das acções da apelada, não poderia o Tribunal a quo, sem mais, fazer apelo à referida sentença, para não reconhecer por si só à apelante a qualidade de sócia.
Termos em que, dando integral provimento ao presente recurso deve revogando-se a Douta Sentença Recorrida, substituindo-a por Acórdão que, conhecendo do presente recurso, ordene a suspensão das deliberações objecto dos presentes autos.
Assim decidindo, farão V. Exas. o que é de inteira Justiça”.
6- A Requerida apresentou contra-alegações com as seguintes conclusões:
“A. Vem a Recorrente sustentar que, ao contrário do decidido na Douta sentença ora recorrida, o referido J.E.Q., na qualidade de “Fiscal Único” nos autos em causa já tinha, àquela data, cessado as suas funções, dado que só havia sido eleito para o Triénio 2015/2017, pelo que as deliberações sociais tomadas pela Assembleia Geral da G… em 17.08.2020 são nulas dado que o Fiscal Único não poderia ter procedido à convocatória da Assembleia Geral.
B. O argumento da Recorrente não colhe para dar como preenchido o requisito do artigo 380º, nº 1 do CPC de ilegalidade da deliberação cuja
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