Acórdão nº 1971/23.4T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-11-23

Ano2023
Número Acordão1971/23.4T8PTM.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

No Juízo do Trabalho de Portimão, EGEO – Tecnologia e Ambiente, S.A., deduziu impugnação judicial da decisão da Autoridade Para as Condições do Trabalho que a condenou na coima de € 9.500,00, por uma contra-ordenação muito grave, p.p. pelos arts. 4.º n.º 1 e 14.º n.º 3 al. a) do DL 237/2007, de 19 de Junho (não utilização de suporte de registo do número de horas de trabalho prestadas por trabalhador móvel).
A mesma decisão declarou solidariamente responsável o administrador da arguida, AA.
Recebida a impugnação judicial, realizou-se julgamento, após o que foi proferida sentença julgando procedente a impugnação e absolvendo a arguida.

O Digno Magistrado do Ministério Público interpôs recurso e concluiu:
1. A ACT – Unidade Local de Portimão decidiu, em 29 de Março de 2023, condenar a Arguida EGEO – Tecnologia e Ambiente, S.A., na coima de 9.500,00 € pela prática de uma contra-ordenação laboral, por violação do disposto nos artigos 4.º, n.ºs 1 e 2 e 14.º, n.º 3, alínea a), do Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de Junho, em conjugação com os artigos 1.º, n.ºs 1 e 3, 2.º e 3.º, da Portaria n.º 983/2007, de 27 de Agosto, condenado ainda no pagamento da referida coima, como responsável solidário, o administrador daquela sociedade, AA.
2. A Arguida impugnou judicialmente aquela decisão e, com a douta sentença de 05.07.2023, o Tribunal decidiu julgar procedente aquela impugnação, revogando a decisão recorrida e absolvendo a Arguida/recorrente da contra-ordenação cuja prática lhe havia sido imputada.
3. No essencial, a factualidade que estava na base da decisão da autoridade administrativa, com base na qual foi imputada à Arguida a responsabilidade pela prática da referida contra-ordenação, provou-se no julgamento, ficando designadamente assente que: (…)
4. A Arguida não pôs em causa que os referidos factos tinham ocorrido, opondo-se sim a que, tendo em consideração as funções que o seu trabalhador BB exercia, a ACT tivesse considerado que ele era um “trabalhador móvel” para efeitos do disposto no Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de Junho, estando, por isso, obrigado a fazer-se acompanhar do livrete individual de controlo (LIC).
5. Por isso, a Arguida sustentou que não praticou a infracção que lhe foi imputada, apelando ainda a que, mesmo que assim não se entendesse, se devia ter em consideração que, entretanto, a portaria n.º 983/2007, de 27 de Agosto, foi revogada pela portaria n.º 7/2022, de 4 de Janeiro, tendo sido eliminada a obrigação de utilização de livrete individual de controlo.
6. Na sua douta sentença, o Tribunal concordou com a argumentação da Arguida, e considerando que o trabalhador fiscalizado tem a categoria profissional de “operador de movimentação de resíduos” e que a Arguida desenvolve a actividade económica principal de tratamento e eliminação de resíduos perigosos, fabricação de chapas, folhas, tubos e perfis de plástico, tendo decidido que não se deve considerar que aquele colaborador da Arguida era um “trabalhador móvel” nos termos previstos na alínea d), do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de Junho, concedendo total provimento ao recurso interposto e absolvendo a Arguida da prática da contra-ordenação imputada.
7. Não concordamos com esta decisão do Tribunal “a quo”, pois entendemos que o trabalhador BB, que acompanhava o motorista CC quando o veículo que este conduzia foi fiscalizado pela GNR no dia 23.08.2021, deve ser considerado um “trabalhador móvel” nos termos e para os efeitos previstos no referido do Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de Junho.
8. Embora a Arguida utilize o veículo fiscalizado para transporte rodoviário de resíduos para tratamento e eliminação e não para efectuar transporte rodoviário de mercadorias, os motoristas daquela viatura não deixam de estar sujeitos à obrigação de uso de um aparelho de controlo no domínio dos transportes rodoviários, vulgarmente designado por tacógrafo.
9. O trabalhador BB tinha a categoria profissional de «operador de movimentação de resíduos» e não exercia as funções de ajudante de motorista (não auxiliava o motorista na identificação de rotas e trajectos, na confirmação da documentação de transporte (guias, facturas, etc.,) ou na manutenção e limpeza do veículo), limitando-se à execução de tarefas de movimentação de resíduos, carregar resíduos e colaborar nas operações de descarga dos veículos, pelo que o Tribunal considerou que, apesar de o mesmo acompanhar o referido motorista e ajudar a carregar os resíduos que o veículo transportava, não se podia considerar como um “trabalhador móvel”.
10. Porém, o artigo 1.º da Portaria n.º 983/07, de 27 de Agosto, regulamentava não só as condições de publicidade dos horários de trabalho do pessoal afecto à exploração de veículos automóveis propriedade de empresas de transportes (não sujeitos ao tacógrafo – cf. n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 237/2007), mas também as condições de publicidade dos horários de trabalho de pessoal privativo de outras entidades sujeitas às disposições do Código do Trabalho, em conformidade com o n.º 3 do artigo 179.º do Cód. do Trabalho de 2003 (actual n.º 4 do artigo 216.º do Código do Trabalho) ao abrigo do qual foi produzida a referida Portaria.
11. Portanto, mesmo que se concluísse que o referido trabalhador da Arguida não era um “trabalhador móvel” para efeitos do disposto no Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de Junho, ainda assim devia ter-se em consideração que o registo do seu tempo de trabalho devia ser feito através do LIC previsto no artigo 3.º da Portaria n.º 983/2007.
12. Acresce que entendemos que, apesar de o trabalhador BB ter a categoria profissional de «operador de movimentação de resíduos», uma vez que lhe competia acompanhar o motorista e verificar, carregar e acomodar no veículo os resíduos recolhidos, não se pode deixar de considerar que o mesmo era “trabalhador móvel” para os efeitos previstos na Portaria n.º 983/2007, de 27 de Agosto, uma vez que era um trabalhador integrante do pessoal viajante que acompanhava o condutor.
13. Por isso, atenta a sua mobilidade para recolha dos referidos resíduos, o controle do número de horas de trabalho prestadas pelo mesmo devia ser realizado através do LIC, livrete esse que visa permitir a verificação dos tempos de trabalho, de disponibilidade e de descanso que o trabalhador efectivamente observou, de modo a permitir apurar o número de horas de trabalho prestadas, adaptando ao trabalhador móvel não sujeito a controlo por tacógrafo o disposto no artigo 202.º do Código do Trabalho.
14. Outra questão que a Arguida veio invocar na sua douta impugnação da decisão administrativa (questão que o Tribunal não chegou a abordar na douta sentença recorrida, mas que se torna relevante se se considerar que o colaborador da Arguida BB era um “trabalhador móvel”), é se, com a revogação da Portaria n.º 983/2007, de 27 de Agosto, pela Portaria n.º 7/2022, de 4 de Janeiro, foi eliminada a obrigação de utilização de livrete individual de controlo.
15. Socorrendo-nos do que recentemente foi decidido pela Relação do Porto no recente acórdão de 05.06.2023 (processo n.º 1597/22.0T8MTS.P1, relatora RITA ROMEIRA), concluímos que, com a revogação da Portaria n.º 983/2007, de 27 de Agosto, pela Portaria n.º 7/2022, de 4 de Janeiro, não foi eliminada a obrigação de utilização do LIC e que, consequentemente, não ocorreu despenalização da contra-ordenação em causa nos autos.
16. Por isso, se se considerar que o LIC era obrigatório para o referido trabalhador da Arguida, temos que, ao contrário do que foi decidido na douta sentença recorrida, a não apresentação daquele livrete quando ocorreu a fiscalização cujo auto de notícia deu origem aos presentes autos, integrava (e continua a integrar) a prática de uma contra-ordenação prevista nas disposições conjugadas dos artigos 4.º, n.ºs 1 e 2 e 14.º, n.º 3, alínea a), do Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de Junho, e dos artigos 1.º, n.ºs 1 e 3, 2.º e 3.º, da Portaria n.º 983/2007, de 27 de Agosto.
17. Por outro lado, conforme resulta do n.º 1 do artigo 551.º do Código do Trabalho, quando as contra-ordenações são praticadas pelos seus trabalhadores no exercício das respectivas funções, a responsabilidade é do empregador, e só assim não será, se existir uma norma que permita excluir essa responsabilidade, o que não é o caso.
18. Assim sendo, tendo em consideração os factos considerados como provados, o Tribunal devia ter concluído no sentido de que a Arguida cometeu a infracção de
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT