Acórdão nº 195/20.7T8ALQ-B.L1-9 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-03-07

Ano2024
Número Acordão195/20.7T8ALQ-B.L1-9
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordaram, em conferência, os Juízes Desembargadores da 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO
AA, por apenso aos autos de execução comum para pagamento de quantia certa que sob o n.º 195/20.7T8ALQ-A correm termos pelo Juízo Local Criminal de Alenquer, da Comarca de Lisboa Norte, em que figura como executada, e em que é exequente o Ministério Público naquela Comarca, deduziu oposição por embargos à execução, invocando como fundamento a prescrição do procedimento contraordenacional, pedindo a extinção da execução.
Notificado nos termos e para os efeitos previstos pelo artigo 732.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, o Exequente contestou, pugnando pela improcedência dos embargos.
Em 30.07.2023, foi proferida sentença que julgou totalmente improcedentes os embargos deduzidos e determinou o prosseguimento da execução.
Inconformada, em 06.10.2023, a embargante veio interpor recurso de apelação, com os fundamentos explanados na respectiva alegação, que condensou nas seguintes conclusões (transcrição):
«I A decisão objeto de recurso enferma de nulidade, de erro na apreciação da matéria de facto e de erro na apreciação da matéria de direito, ao ter afirmado que a prescrição só ocorreria em 1.04.2022, quando o trânsito em julgado da decisão ocorreu em 28.03.2022.
II – O prazo de prescrição do procedimento aqui em apreço verificou-se em 01.10.2021.
III – Não pode ao prazo ocorrido em 01.10.2021, aplica-se um novo período de suspensão de 6 meses, porquanto não se verificou qualquer situação para o efeito.
IV - A entender-se de outra forma seria beneficiar e premiar a inercia de quem tem a obrigação legal de decidir.
V – Pelo que, no caso concreto verificou e consumou-se a prescrição do procedimento, sendo por isso nula a decisão aqui sob recurso.
VI – A decisão sob recurso violou o 28.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, bem como o artigo 40.º, n.º 1, da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto
Termos de facto e de direto, pelos quais se requer a V.Exas. seja concedido provimento ao presente recurso, considerando-se:
- Verificada a prescrição do procedimento contraordenacional;
- E, em consequência ser julgada procedente os embargos de executados e extinta a execução.
Assim se fazendo JUSTIÇA!
*
O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos (de oposição por embargos) e com efeito devolutivo.
O Ministério Público recorrido contra-alegou, no sentido da improcedência do recurso interposto, defendendo a manutenção da sentença recorrida.
Nesta Relação o Ministério Público apôs o seu Visto.
*
Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir.
***
II. FUNDAMENTAÇÃO
A) Objecto do recurso
Conforme jurisprudência constante e assente, é pelas conclusões apresentadas pelo recorrente que se delimita o objeto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior (cf. por todos, o Acórdão do STJ, de 15/04/2010, acessível em www.dgsi.pt), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso a que alude o artigo 410º, do CPP (conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada no Acórdão nº 7/95, do STJ, in DR, Iª Série-A, de 28/12/95).
Ora, no caso vertente, de acordo com as conclusões da motivação do recurso, a questão que importa apreciar e decidir é, a de saber se à data em que foi proferida decisão nos autos principais, em primeira e segunda instância, já se encontrava prescrito o procedimento contraordenacional.
*
B) A decisão recorrida (transcrição dos segmentos com interesse para a apreciação do recurso)
«(…) II. Da prescrição do procedimento contra-ordenacional
A presente acção executiva tem como título executivo a sentença proferida no processo n.º 195/20.7T8ALQ, prolatada a 18/063/2021, mantida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão proferido a 15/03/2022, pela qual a executada foi condenada no pagamento da coima de € 6.000,00, pela prática de uma contra-ordenação ambiental grave, prevista e punida pelos artigos 48.º e 67.º, n.º 2, alínea r), do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 05/09, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 /06, sancionável nos termos no artigo 22.º, n.º 3, alínea b), da LQCOA, alterada e republicada pela Lei n.º 114/2015, de 28/08.
A questão a decidir nos presentes embargos consiste em aferir se à data em que foi proferida decisão nos autos principais, em primeira e segunda instância, já havia sido alcançado o termo do prazo de prescrição do procedimento contra-ordenacional, conforme sustenta a embargante.
Apreciando.
Por decisão proferida pela IGAMAOT, foi a ora executada AA. condenada na coima de €12.000,00, pela prática de uma contra-ordenação ambiental grave, prevista e punida pelos artigos 48.º e 67.º, n.º 2, alínea r), do Processo: 195/20.7T8ALQ-B
Decreto-Lei n.º 178/2006, de 05/09, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 /06, sancionável nos termos no artigo 22.º, n.º 3, alínea b), da LQCOA, alterada e republicada pela Lei n.º 114/2015, de 28/08.
Foi imputado à executada a inobservância da obrigação de realização de registo e preenchimento do MIRR (Mapa Integrado de Registo de Resíduos) referente ao ano de 2013.
Estabelece o artigo 48.º, n.º 1, al. b), do Decreto-Lei n.º 178/2006, que “Estão sujeitos a inscrição e a registo de dados no SIRER: (…) As pessoas singulares ou colectivas responsáveis por estabelecimentos que produzam resíduos perigosos”.
Mais dispõe o artigo 49.º-B, n.º 2, do referido diploma que “O prazo para registo anual da informação relativa aos resíduos e aos produtos colocados no mercado termina no dia 31 de Março do ano seguinte ao do ano a reportar”.
A contra-ordenação em causa é uma contra-ordenação ambiental (cfr. artigo 67.º, n.º 2, alínea r), do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 05/09) pelo que é aplicável a Lei n.º 50/2006, de 29/08, que aprovou a Lei Quadro das Contra-ordenações Ambientais.
Estabelece o artigo 6.º deste diploma que “O facto considera-se praticado no momento em que o agente atuou ou, no caso de omissão, deveria ter atuado, independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido”.
Em termos coincidentes, estatui o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, que “O facto considera-se praticado no momento em que o agente actuou ou, no caso de omissão, deveria ter actuado, independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido”.
No caso vertente, sendo imputado à ora executada (então arguida/recorrente) a falta do registo de informação, resulta inequívoco estarmos perante a comissão da infracção através de uma conduta omissiva, pelo que a infracção se considera praticada no momento em que a arguida deveria ter actuado.
Assim, estando em causa informação referente ao ano de 2013, a arguida deveria ter procedido ao respectivo registo até 31/03/2014. Não o tendo feito, entrou em incumprimento em 01/04/2014, data em que se considera consumada a prática da referida infracção.
Estabelece o artigo 40.º, n.º 1, da Lei n.º 50/2006, que “O procedimento pelas contraordenações graves e muito graves prescreve logo que sobre a prática da contraordenação haja decorrido o prazo de cinco anos, sem prejuízo das causas de interrupção e suspensão previstas no regime geral”.
O prazo de prescrição do procedimento contra-ordenacional corre desde o dia em que o facto se tiver consumado (artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 433/82), importando, porém, ter presente as causas de suspensão e da interrupção da prescrição reguladas pelos artigos 27.º-A e 28.º do Decreto-Lei n.º 433/82.
Preceitua o artigo 27.º-A do Decreto-Lei n.º 433/82:
“1 - A prescrição do procedimento por contra-ordenação suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que o procedimento:
a) Não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal;
b) Estiver pendente a partir do envio do processo ao Ministério Público até à sua devolução à autoridade administrativa, nos termos do artigo 40.º;
c) Estiver pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima, até à decisão final do recurso.
2 - Nos casos previstos nas alíneas b) e c) do número anterior, a suspensão não pode ultrapassar seis meses.”
A propósito da causa de suspensão prevista na alínea c) do n.º 1 do preceito citado, cumpre salientar que de acordo com o entendimento fixado pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2011, publicado no Diário da República, n.º 30, Série I, de 2011-02-11, “A suspensão do procedimento por contra-ordenação cuja causa está prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 27.º-A do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, inicia-se com a notificação do despacho que procede ao exame preliminar da impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa e cessa, sem prejuízo da duração máxima imposta pelo n.º 2 do mesmo artigo, com a última decisão judicial que vier a ser proferida na fase prevista no Capítulo IV da Parte II do
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