Acórdão nº 1801/22.4T8OER-B.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-02-09

Ano2023
Número Acordão1801/22.4T8OER-B.L1-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os juízes que compõem este colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório
J…, nos autos m.id., apresentou requerimento de injunção contra C…, também nos autos m.id., invocando que é advogada e nessa qualidade prestou serviços à requerida, patrocinando-a judiciariamente, no valor de €6.700,00 de honorários que a requerida não pagou, apesar de interpelada.
Conferida força executiva, veio em 28.4.2022 J… interpor execução pelo valor de 7.418,63 € (correspondente aos €6.700,00 iniciais e a juros moratórios vencidos no valor de 693,13€) acrescendo juros moratórios vincendos até efetivo e integral pagamento.
A exequente fez juntar com o requerimento executivo procuração forense (em que indicou ter domicílio profissional na Alameda … nº 21 D – 1º, … Lisboa) a favor da Drª CC, advogada estagiária (com domicílio profissional na Alameda nº 21 – 1º Andar, Escritório 6, … Lisboa) à qual conferiu os mais amplos poderes por lei permitidos, incluídos os de subestabelecer e os de confessar acções, transigir sobre o seu objecto, e desistir do pedido ou da instância.
A executada veio aos autos, por requerimento datado de 1.7.2022, nos seguintes termos:
“(…) previamente à apresentação de oposição/embargos, que oportunamente correrão por apenso a estes autos, vem expor e requerer a V. Ex.ª:
1. Tendo sido conferida força executiva ao título apresentado pela exequente, esta veio de imediato requerer a penhora de bens da aqui executada, por via do seu requerimento executivo!
2. Sucede que, como esta não poderia e/ou não deveria desconhecer, tendo o respetivo requerimento sido patrocinado e subscrito APENAS por Advogada Estagiária, esta não dispunha de competência para o patrocínio, tendo em conta que lhe está vedada a prática de atos próprios da competência dos Advogados.
3. Efetivamente, a competência dos Advogados Estagiários encontra-se disciplinada no atual art.º 196 do Estatuto da Ordem dos Advogados - EOA (Lei 145/2015, de 9 de setembro, com as alterações que lhe foram introduzidas até à Lei 79/2021, de 24 de novembro) ali se estabelecendo que:
1. Concluída a primeira fase do estágio, o advogado estagiário pode, sempre sob orientação do patrono, praticar os seguintes atos próprios da profissão:
a) Todos os atos da competência dos solicitadores;
b) Exercer a consulta jurídica.
2 - O advogado estagiário pode ainda praticar os atos próprios da profissão não incluídos no número anterior, desde que efetivamente acompanhado pelo respetivo patrono.
3. Na interpretação da referida norma do art.º 196 do EOA, importará, como se impõe, atender ao princípio essencial de que a advocacia é uma profissão de interesse de público que funciona como garante da defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e participa profundamente na administração da justiça constituindo o advogado interlocutor privilegiado, quando não exclusivo, do cidadão junto do poder judicial e da administração pública.
4. O Advogado Estagiário apenas pode atuar em tais processos, desde que efetivamente acompanhado de Advogado, pois, o legislador não lhe concedeu autonomia para atuar por si só nos processos judiciais de maior relevância atento o seu valor e/ou complexidade, antes tendo subordinado expressamente essa intervenção à tutela do patrono ou patrono-formador do Advogado Estagiário, ou seja, a quem, estando em estreita ligação funcional com aquele, possui aptidão plena – pelo menos cinco anos de exercício da profissão – para orientar, dirigir e sindicar a sua atuação.
5. Por outro lado, como resulta do disposto do art.º 40 do CPCivil, é obrigatória a constituição de advogado:
a) Nas causas de competência de tribunais com alçada, em que seja admissível recurso ordinário;
b) Nas causas em que seja sempre admissível recurso, independentemente do valor;
c) Nos recursos e nas causas propostas nos tribunais superiores.
6. Assim, das referidas normas legais resulta de forma clara e inequívoca, que o Advogado Estagiário apenas pode patrocinar ações cujo valor não ultrapasse a alçada dos Tribunais de 1.ª Instância, ou seja, €5.000,00.
7. Considerando que, a presente execução tem o valor de €7.418,63, dúvidas não subsistem de que, esse valor é superior à alçada do Tribunal de 1.ª Instância, e, portanto, não se trata de um ato da competência de solicitador, que pudesse também, ser praticado por Advogado Estagiário ao abrigo da al. a) do art.º 196 do EOA, e, naturalmente, quando o requerimento foi apresentado a Advogada Estagiária que o patrocinou e subscreveu (única) não tinha competência para o fazer!
8. É que, por outro lado, se constata, também, que a Advogada Estagiária que patrocina esta execução, o fez desacompanhada da sua Patrona, ou de outro Advogado, a quem tivessem, também, sido conferidos poderes para o patrocínio (cfr. Procuração Forense junta com a Execução).
9. O que significa, que, não estamos em face de uma mera irregularidade do mandato, mas, antes, de uma NULIDADE PROCESSUAL INSANÁVEL, que deverá, salvo melhor opinião, determinar a absolvição da executada da presente instância executiva, e simultânea e imediatamente o levantamento de todas as penhoras ordenadas aos seus bens,
10. Nulidade essa, que, desde já se invoca para todos os efeitos e consequências legais, uma vez que, as nulidades processuais que não sejam as previstas nos art.s 186, 187, 193 e 194 do Código de Processo Civil, quando praticadas na ausência da parte ou do seu mandatário, podem ser arguidas nos termos previstos no art.º 199 do mesmo Código, cabendo às partes argui-las perante o Tribunal onde as mesmas foram cometidas, devendo o Tribunal apreciá-las logo que sejam reclamadas, conforme, aliás, se dispõe no n.º 3 do art.º 200 do mesmo diploma legal.
Termos em que, se requer a V. Ex.ª se digne determinar verificada a NULIDADE processual invocada, e, consequentemente, a absolvição da executada da instância executiva, e o levantamento imediato de todas as penhoras autorizadas e registadas sobre os bens da executada”.
A exequente respondeu nos seguintes termos:
“CC…, na qualidade de advogada-estagiária e mandatária da Exequente J…, vem (…), em resposta ao requerimento de arguição de nulidade (referência n.º 21372865) apresentado pela Ilustre Mandatária da aqui Executada a 01/07/2022, dizer o seguinte:
1. ´(…)
4. Afirma assim a Ilustre Mandatária da aqui Executada, que “das referidas normas legais resulta de forma clara e inequívoca, que o Advogado-Estagiário apenas pode patrocinar ações cujo valor não ultrapasse a alçada dos Tribunais de 1ª instância, ou seja 5.000,00€.
5. Todavia, salvo melhor entendimento, assim não se entende, uma vez que a referida norma constante do artigo 40º do Código de Processo Civil, reporta-se tão só e somente à regra geral no que diz respeito à constituição obrigatória de advogado.
6. Sendo que, e estando perante processo execução, importa desde já atender ao previsto no Capitulo IV, atinente às disposições especiais sobre execuções, ressalvando-se desde já o previsto no artigo 58º do Código de Processo Civil, relativo ao patrocínio judiciário obrigatório em especial em matéria de execuções, nos termos do qual se pode ler no n.º 1 o seguinte: “As partes têm de se fazer representar por advogado nas execuções de valor superior à alçada da Relação e nas de valor igual ou inferior a esta quantia, mas superior à alçada do tribunal de 1ª instância, quando tenha lugar algum procedimento que siga os termos do processo declarativo”.
7. Contudo, e para o aqui releva, destaque-se desde já o n.º 3 do referido segmento normativo que consagra expressamente o seguinte: “As partes têm de se fazer representar por advogado, advogado-estagiário ou solicitador nas execuções de valor superior à alçada do tribunal de 1ª instância não abrangidas pelos números anteriores”.
8. O que significa desde já, que contrariamente à afirmação feita pela Ilustre Mandatária, se observa desde logo que numa primeira análise, o advogado-estagiário terá efetivamente competência para patrocinar execuções cujo valor exceda a alçada do tribunal de 1ª instância, e que não se enquadrem nas previsões anteriores da citada norma legal.
9. Assim, estando perante execução sumária, e uma vez não ter ocorrido na mesma nenhum procedimento que siga os termos do processo declarativo, considera-se que a aqui signatária, na qualidade de advogada-estagiária e mandatária da Exequente, possui competência para representação da mesma, competência esta que se insere na previsão legal constante do artigo 58º n.º 3 do Código de Processo Civil.
10. Sendo que, e só eventualmente nos casos de oposição à execução por embargos de executado, enquanto momento declarativo que corre de forma autónoma e por apenso à respetiva execução, terão as partes que proceder à constituição obrigatória de
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