Acórdão nº 157/19.7GTSTB.L1-9 de Tribunal da Relação de Lisboa, 25-05-2023

Data de Julgamento25 Maio 2023
Ano2023
Número Acordão157/19.7GTSTB.L1-9
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, em conferência, os Juízes da 9.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa



RELATÓRIO


No âmbito do Processo n.º 157/19.7GTSTB, do Juízo de Instrução Criminal do Barreiro, foi proferido despacho (em 7/11/2022) a rejeitar o pedido de abertura de instrução (feito em 20/9/2022 pelo assistente) e com fundamento em não terem sido juntos, atempadamente, os originais do referido requerimento nos seguintes termos (transcrição):
«A remessa a juízo de peças processuais através de correio electrónico é admissível nos termos do disposto no artigo 150.º, n.º 1, alínea d), e n.º 2, do Código de Processo Civil, na redacção do Decreto-Lei nº 324/2003, de 27 de Dezembro, e na Portaria n.º 642/2004, de 16 de Junho, aplicáveis por remissão do artigo 4.º do Código de Processo Penal, em conformidade com o Acórdão do STJ n.º 3/2014, de 06.03.2014, publicado no DR, 1ª Série, de 15.04.2014, e, por interpretação a contrario, do artigo 2.º da Portaria n.º 280/2013, na sua redacção vigente.
Tal jurisprudência permanece aplicável às acções excluídas da Portaria n.º 280/2013, conforme o Acórdão do STJ, de 24.01.2018, nomeadamente nas acções que se encontrem na fase de inquérito/instrução, e de acordo com o artigo 17.º, da Portaria n.º 267/2018 de 20 de Setembro.
A Portaria n.º 642/2004, de 16 de Junho regula a forma de apresentação a juízo dos actos processuais enviados através de correio electrónico, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 150.º do Código de Processo Civil.
Nos termos do artigo 3.º, n.º 1, da mencionada Portaria, o envio de peças processuais por correio electrónico equivale à remessa por via postal registada, nos termos do n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei nº 290-D/99, de 2 de Agosto, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 62/2003, de 3 de Abril, bastando para tal a aposição de assinatura electrónica avançada.
De acordo com o n.º 2 do artigo 3.º da Portaria n.º 642/2004, de 16 de Junho, a expedição da mensagem de correio electrónico deve ser cronologicamente validada, nos termos da alínea u) do artigo 2º do Decreto-Lei nº 290-D/99, de 2 de Agosto, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 62/2003, de 3 de Abril, mediante a aposição de selo temporal por uma terceira entidade idónea.
Na falta de validação cronológica, nos termos do artigo 10.º da Portaria n.º 642/2004, de 16 de Junho, “À apresentação de peças processuais por correio electrónico simples ou sem validação cronológica é aplicável, para todos os efeitos legais, o regime estabelecido para o envio através de telecópia.”.
O regime da telecópia consta do Decreto-lei n.º 28/92, de 27 de Fevereiro e no artigo 4.º, desse diploma, lê-se o seguinte:
1-As telecópias dos articulados, alegações, requerimentos e respostas, assinados pelo advogado ou solicitador, os respectivos duplicados e os demais documentos que os acompanhem, quando provenientes do aparelho com o número constante da lista oficial, presumem-se verdadeiros e exactos, salvo prova em contrário.
(...)
3-Os originais dos articulados, bem como quaisquer documentos autênticos ou autenticados apresentados pela parte, devem ser remetidos ou entregues na secretaria judicial no prazo de sete dias contado do envio por telecópia, incorporando-se nos próprios autos.”
O prazo de 7 dias deve ter-se alargado para 10 em consequência do disposto no artigo 6.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro.
No caso em apreço, constata-se que o assistente apresentou requerimento de abertura de instrução através de correio electrónico com o recurso ao servidor de correio electrónico da Ordem dos Advogados no dia 20 de Setembro de 2022.
Verifica-se ainda que, do correio electrónico não consta assinatura electrónica avançada nem a aposição de selo temporal por entidade terceira idónea e que o original do requerimento de abertura de instrução não foi remetido ao tribunal no prazo de dez dias.
Tendo enviado o requerimento de abertura de instrução através de correio electrónico o assistente estava obrigado a enviar o original no prazo máximo de 10 dias, o que foi preterido, violando-se, assim, o estatuído no artigo 4.º, n.º 3 do Decreto-lei n.º 28/92, de 27 de Fevereiro.
Neste sentido, veja-se o Acórdão proferido a 13.04.2021, do Tribunal da Relação de Évora, relatado pela Desembargadora Maria Fernanda Palma, no processo n.º 914/18.1T9ABF-B.E1.
Por fim cabe trazer à colação o argumento do carácter peremptório dos prazos processuais, ou seja, decorrido o prazo, extingue-se o direito em praticar o acto processual, nomeadamente, a apresentação em juízo dos respectivos originais, conforme se refere pertinentemente na decisão recorrida daquele aresto: “A realização de um convite por parte do Tribunal, para junção dos originais, redundaria na obnubilação de dever legalmente imposto (o previsto n.º 3 do artigo 4.º do DL 28/92) e na “implosão” do prazo peremptório de 20 dias para requerer a abertura da instrução previsto no artigo 287.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.”.
Tudo visto e ponderado, e à semelhança do mencionado aresto, impõe-se a rejeição do requerimento de abertura de instrução.
Pelo exposto, ao abrigo do disposto no artigo 287.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, rejeito o requerimento de abertura de instrução.
Custas a cargo do assistente que fixo em 2 UC.
Notifique.
Oportunamente, arquive. »

*

Inconformado com tal decisão, dela veio o assistente, A, interpor o presente recurso que termina com as seguintes conclusões e o respectivo pedido (transcrição):
«A.O Assistente apresentou, em tempo, o requerimento de abertura de Instrução via correio eletrónico junto dos serviços do Ministério Publico do DIAP do Barreiro, enviado a 20/09/2022 pelas 22:00 horas.
B.O requerimento foi legitima e tempestivamente apresentado e respeitou todos os requisitos legalmente impostos.
C.O requerimento de abertura de instrução foi remetido pelo endereço oficial emitido pela Ordem dos Advogados (OA).
D.Pelo que, o email teve validação cronológica por terceira entidade idónea,neste caso, o servidor de email da Ordem dos Advogados.
E.E os recibos de envio e de leitura rececionados, o pedido de recibo de entrega na caixa de email do destinatário, comunicação essa efetuada entre o servidor de correio eletrónico da Ordem dos Advogados e o servidor de correio eletrónico dos Tribunais são entidades idóneas.
F.O Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/2014 veio admitir a remessa a juízo de peças processuais através de correio eletrónico; “Em processo penal, é admissível a remessa a juízo de peças processuais através de correio eletrónico, nos termos do disposto no artigo 150.º, n.º 1, alínea d) e n.º 2 do Código de Processo Civil de 1961, na redação do Decreto-Lei n.º 324/2003, 27 de dezembro e na Portaria n.º 642/2004, de 16 de junho, aplicáveis conforme o disposto no artigo 4.º do Código de Processo Penal”.
G.O artigo 144.º do Código de Processo Civil elenca os casos em que devem ser apresentados a juízo os respetivos originais dos documentos submetidos via eletrónica, o qual não se aplica no caso em apreço.
H.Nos termos do Acordão proferido a 5-04-2022, do Tribunal da Relação de Évora, relatado pelo Desembargador Moreira das Neves. “o não cumprimento de uma mera formalidade secundária, sem que seja concedida uma oportunidade de comprovar a regularidade da comunicação eletrónica efetuada, convidando-o a juntar, nos moldes entendidos ajustados, o original da peça remetida por correio eletrónico, é desproporcionada.”
I.Caso o Tribunal entendesse faltar cumprir alguma formalidade, como a validação da peça processual, deveria ter notificado o assistente para este juntar os originais respetivos.
J.Entende o assistente que o Tribunal não respeitou o princípio de colaboração e de confiança.
K.Resulta do art. 287.º, n. º3 do CPP que: “O requerimento só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução”, o que não sucedeu.
L.No caso em apreço nenhum destes requisitos se encontra preenchido.
M.Pelo que, sempre se dirá, que não constitui uma causa de rejeição do Requerimento a não verificação do disposto na Portaria n.º 642/2004, de 16 de Junho, referente aos atos processuais e notificações enviados por correio eletrónico.
N.O Tribunal Constitucional, por seu turno, considerou inconstitucional a dimensão interpretativa do complexo normativo respeitante às comunicações das partes com os serviços de justiça através de correio eletrónico, sem assinatura eletrónica e validação cronológica e sequente não apresentação das peças originais, se dele resultar a preclusão de um direito processual relevante.
O.A falta de entrega dos originais no referido prazo constituiu omissão de uma formalidade, a qual, não poderá, só por si, impossibilitar o aproveitamento do acto praticado, pois tal preclusão, a mais desproporcionada, contraria o princípio do processo equitativo.
Nestes termos e nos melhores de Direito, requer o Recorrente/Assistente que seja declarado nulo o despacho de rejeição de abertura da Instrução, e que esta seja aberta com as
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