Acórdão nº 026/22 de Tribunal dos Conflitos, 18-04-2023

Data de Julgamento18 Abril 2023
Ano2023
Número Acordão026/22
ÓrgãoTribunal dos Conflitos - (CONFLITOS)
Conflito nº 26/22

Acordam no Tribunal dos Conflitos

1. Relatório
O Município de Leiria intentou no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Instância Local, Secção Cível, Juiz 1 de Leiria, acção declarativa de condenação com processo comum contra AA, pedindo a sua condenação no pagamento, a título de indemnização, de €33.814,30, pelos danos causados pelos actos praticados com preterição dos deveres contratuais, durante o exercício das suas funções enquanto administrador executivo e liquidatário da A..., EM, acrescido de juros de mora, calculados à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Em síntese, o Autor alegou que foi acionista único da A..., EM (A...), uma sociedade anónima, com um capital social de €55.600,00, integralmente detida pelo A., constituída nos termos da Lei nº 58/98, de 18/8, e, posteriormente adaptada ao regime jurídico do sector empresarial local aprovado pela Lei nº 53-F/2006, de 29/9, e depois pela Lei nº 50/2021, de 31/8.
Por deliberação de 31.08.2012, o Réu foi nomeado como administrador, com funções executivas, daquela sociedade, auferindo uma remuneração correspondente a 95% do vencimento mensal de vereador a tempo inteiro, acrescida de despesas de representação, não tendo àquela data, qualquer vínculo laboral ou de qualquer outra natureza com o Autor. E que em face dos resultados negativos apresentados, foi deliberada a dissolução da sociedade, nos termos do art. 62º, nº 1, alínea d) da Lei nº 50/2012, sendo deliberado pela Assembleia Geral da sociedade nomear o Réu como liquidatário da mesma, sendo investido de todos os poderes para dar cumprimento à liquidação, incluindo os poderes gerais de liquidação do activo e do passivo da sociedade, bem como os poderes para administrar a actividade dos estabelecimentos que a sociedade mantivesse durante o período de liquidação e, ainda, dos poderes especiais para a prática de actos de representação em juízo e de alienação de direitos sobre imóveis, incluindo os previstos no art. 152º do Código das Sociedades Comerciais, nomeadamente proceder à alienação global do património da sociedade, nos termos previstos no projecto de dissolução e liquidação. Alega o A. que o R. determinou que fossem feitos pagamentos a si próprio a título de subsídios de férias e de Natal, férias não gozadas, formação profissional, indemnização por cessação de contrato de trabalho, compensação por pré-aviso em falta [descritos nos arts. 63º, 64º, 65º da p.i.], que não lhe são devidos por não se tratar de um vínculo jurídico-laboral, cujo reembolso reclama nos presentes autos.
No entanto, a situação remuneratória do Réu manteve-se inalterada quando passou de administrador executivo da A... para liquidatário desta, pelo que inexiste qualquer vínculo laboral que justifique o pagamento das quantias descritas nos autos, uma vez que o regime jurídico da actividade empresarial local e das participações locais afasta expressamente a aplicação do regime jurídico do contrato de trabalho aos gestores das empresas locais, atento o disposto no seu art. 30º, nº 4, que manda aplicar subsidiariamente aos titulares de órgãos de gestão e de administração das empresas locais, o Estatuto do Gestor Público.
Assim, o Réu ao dar ordem de pagamento das quantias mencionadas adoptou um comportamento lesivo dos interesses financeiros do Autor, de que resultou um prejuízo no montante total de €33.814,30 de que pretende ver-se ressarcido [cfr. arts. 69º e 73º da p.i.]. Pelo que ao abrigo do disposto nos artigos 30º, nº 4 do Estatuto do Gestor das Empresas Locais. Aprovado pela Lei nº 50/2012, de 18/1, dos artigos 64º, 72º a 79º e 152º, nº 1, todos do Código das Sociedades Comerciais (CSC), deve o Réu ser condenado na devolução da indicada quantia acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal, desde a citação.

O Réu contestou por impugnação e deduziu reconvenção – cfr. fls. 137 a 143.

O Autor replicou, pugnando pela improcedência da reconvenção deduzida – cfr. fls. 154 a 160.

Em 29.03.2017, na Instância Local, Secção Cível de Leiria, Juiz 1, foi proferida sentença a julgar o tribunal incompetente em razão da matéria para apreciação e julgamento da acção intentada, absolvendo o Réu da instância e declarando competentes para dirimir o litígio os Tribunais Administrativos - cfr. 315 a 317 verso.
Remetidos os autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (TAF de Leiria), foi aí proferida sentença em 15.06.2022 a declarar a incompetência em razão da matéria para conhecer do objecto dos autos, sendo o Réu absolvido da instância principal e o Autor absolvido da instância reconvencional.
Suscitada oficiosamente a resolução do conflito negativo de jurisdição, por despacho de 26.09.2022 do TAF de Leiria foram os autos remetidos a este Tribunal dos Conflitos.
Neste...

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