Acórdão nº 0118/23.1BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelLILIANA VIEGAS CALÇADA
Data da Resolução19 de Outubro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I - RELATÓRIO 1 - AA, Procurador da República, suspenso de funções, vem requerer a suspensão de eficácia do acórdão de 17.05.2023 do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público, (CSMP) proferido no âmbito de recurso hierárquico necessário interposto de anterior acórdão de 01.02.2023, também do Plenário do CSMP, este último proferido no âmbito de recurso hierárquico necessário do acórdão de 16.11.2022 da Secção Disciplinar do CSMP, que aplicou ao Autor a pena de demissão no procedimento disciplinar n° ... por violação ilícita e culposa dos deveres funcionais de zelo, prossecução do interesse público e isenção, à data dos factos previstos e puníveis nos artºs.73º, nº 2, al. e), 73º, nº 3 e 73º, nº 2, al. b), todos da LGTFP, (Lei nº 35/2014, de 20.06) aplicável ex vi do artº 216º do Estatuto do Ministério Público (EMP), aprovado pela Lei nº 60/98, de 27.08, a que correspondem os artºs 103º, nº 1, 104º, nº 2 e 104º, nº 1 do EMP vigente, aprovado pela Lei 68/2019, de 27.08.

2 - Alegando quanto ao preenchimento dos pressupostos cautelares, invoca o Requerente, em síntese, o seguinte: - I – Quanto ao fumus boni iuris - artºs 138º a 279º da p.i. - que a deliberação do Plenário do CSMP de 17.05.2023 incorre em omissão de pronúncia, estando, por isso, ferida de nulidade, nos termos do art° 615º, n° 1 al. d) do CPC, ex vi do art° 1º do CPTA, dado que: a) a deliberação do Plenário do CSMP de 01.02.2023, reconheceu a invalidade de notificação anterior que indicara um errado prazo de impugnação, mandou repetir a notificação da deliberação da Secção Disciplinar de 16.11.2022, que aplicou a pena de demissão ao Requerente, e julgou precludidas as demais questões por si suscitadas no recurso hierárquico necessário interposto em 16.01.2023 – artºs 146º a 148º da p.i.; b) recebida a segunda notificação, o Autor interpôs em 06.04.2023 novo recurso hierárquico necessário para conhecimento das questões julgadas precludidas pela deliberação do Plenário do CSMP de 01.02.2023 e que se mantiveram subsistentes por não terem sido objecto de apreciação – artºs 149º a 170º da p.i.; c) subsistem as nulidades da deliberação da Secção Disciplinar de 16.11.2022 invocadas no segundo recurso hierárquico necessário interposto em 06.04.2023 na sequência da repetição da notificação da deliberação da Secção Disciplinar de 16.11.2022, ordenada na deliberação de 01.02.2023 do Plenário do CSMP – artºs 148º e 171º da p.i..

- II – Quanto ao periculum in mora - artºs 84º a 137º e 279º da p.i. – refere o Autor que "... o acto de demissão praticado pelo CSMP produzirá danos incomensuráveis e irreversíveis na situação pessoal e patrimonial do Requerente e indirectamente na da sua mãe não passíveis de serem eliminados ou ressarcidos por uma decisão definitiva favorável ..."-artºs 85º a 114º e 118º a 122º da p.i..

- III - Quanto ao pressuposto de ponderação de todos os interesses, públicos e privados, em presença – artºs 283º a 287º da p.i. - invoca o Requerente, em síntese, que: a) "em relação à pendência do processo-crime NUIPC ...., o requerente beneficia da presunção da sua inocência até ao trânsito em julgado da sentença condenatória” b) “o processo disciplinar (...) iniciou-se com um inquérito quando os factos já estavam todos apurados e, sem qualquer razão válida, esteve parado, sem qualquer desenvolvimento processual, por mais de 5 anos.” c) “os danos que resultarão da recusa da providência (...) serão muito superiores aos danos que podem resultar do seu decretamento.”.

Conclui o Autor deduzindo os seguintes pedidos: “

  1. Se digne admitir o presente requerimento cautelar; b) Atentos os fundamentos de especial urgência invocados, seja decretada provisoriamente a presente providência, nos termos do art° 131° do CPTA; c) Mais se requerendo a declaração de ineficácia dos actos de execução indevida, nos termos do nº 4 do art° 128º CPTA Se assim não for entendido, então, d) Que seja considerado procedente por provada a presente providência determinando a suspensão da eficácia do acto administrativo que aplicou ao Requerente a pena disciplinar de demissão.” 3 - Por despacho de 01.08.2023 (fls.3090/SITAF) foi indeferido o pedido de decretamento provisório da providência.

    4 - A Entidade Requerida juntou aos autos resolução fundamentada (fls. 3141/SITAF), mostrando-se afastado o efeito suspensivo ope legis da citação, nos termos do artº 128º, nº 1, in fine, do CPTA, conforme despacho de 14.08.2023 (fls.7736/SITAF).

    5 - Devidamente citada, a Entidade Requerida, deduziu oposição pugnando pela total improcedência da acção cautelar, por entender que “seguramente não se mostra preenchido o requisito do “fumus boni iuris” que se exige nos termos do artigo 120.º n.º 1, 2.ª parte, do CPTA”, invocando, nomeadamente, o seguinte: “(…) 85. Com efeito, conforme supra referido, pretendendo o recorrente impugnar administrativamente para o mesmo órgão a decisão por este anteriormente proferida [no Acórdão de 01.02.2023] no âmbito de um recurso necessário – que configurou um ato praticado num procedimento administrativo de segundo grau – nunca o poderia fazer através de novo recurso, por tal não ter qualquer enquadramento no previsto nos artigos 193.º e 199.º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que tal acórdão foi proferido pelo Plenário do CSMP e não por secção ou apenas por algum ou alguns dos seus membros.

    86. Como tal, não tinha o CSMP qualquer margem concreta de liberdade na prática do ato, não tendo alternativa à decisão de rejeição do recurso, nos termos do art.º 196º, n.º 1, al. a) do CPA, limitando-se a exercer os poderes vinculados que desse artigo resultavam.

    (…) 106. Conforme supra referido, rejeitado um recurso hierárquico nos termos do art.º 169º do CPA, o objeto da impugnação contenciosa é somente essa decisão de rejeição, e não a pretensão substantiva que era objeto do procedimento primário.

    107. Isto é, in casu o objeto da presente providência cautelar é apenas a deliberação de rejeição do recurso administrativo proferido pelo Plenário do CSMP em 17.05.2023 (e não a pretensão substantiva que foi objeto da deliberação da Secção Disciplinar do CSMP de 16.11.2022).(…)” 6 - O Tribunal é competente em razão da matéria, da hierarquia e do território; não há nulidades que invalidem todo o processado; as partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e mostram-se devidamente representadas em juízo, não cumprindo conhecer de quaisquer excepções, dilatórias nem peremptórias.

    7 - O estado instrutório dos autos, tendo em conta a prova documental produzida, permite decidir do pedido, sendo dispensável a produção da prova testemunhal arrolada na petição pelo Requerente.

    8 - Presentes os autos à Conferência, sem vistos atenta a natureza urgente do processo, mas com prévia divulgação do projeto do acórdão pelos Senhores Juízes Adjuntos, cumpre apreciar e decidir.

    II – FUNDAMENTAÇÃO II. 1. – De facto 9 - Com fundamento na admissão por acordo das partes no domínio dos respectivos articulados, bem como nos documentos juntos aos autos e ao procedimento administrativo, cujo teor não foi impugnado pela parte contrária ao apresentante, julgam-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão cautelar: A. O Requerente AA é magistrado do Ministério Público, com a categoria de Procurador da República.

    1. O Requerente entrou em 01.09.2012 na situação de licença sem vencimento de longa duração a seu pedido, mediante deliberação do CSMP de 18.01.2012, publicada no DR de 12.06.2012.

    2. Em 01.02.2019 o Requerente foi reintegrado na magistratura do Ministério Público e, por acórdão do CSMP de 14.02.2019 foi considerado na situação de disponibilidade e suspenso de funções até ao trânsito em julgado da decisão proferida no processo crime n° .... do Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Central Criminal - Juiz ..., em que foi constituído arguido.

    3. No Proc. nº ...., por acórdão de 07.12.2018 proferido em 1ª Instância o Requerente foi condenado conforme segmento decisório que se transcreve: “(…) b) Condenar o arguido AA da prática de um crime de corrupção passiva, na sua forma qualificada, p. e p. pelos arts. 373.°, n.° 1 e 374° A, nº 2 do Código Penal, com referência aos art°s 386°, n.° 3, alínea a) e 202, al. b) do mesmo diploma legal, na qualidade de autor material, na pena de quatro anos e seis meses de prisão.

  2. Condenar o arguido AA da prática de um crime de branqueamento p. e p. pelo art. 368° A, números 1, 2 e 3 do Código Penal, em co-autoria com o arguido BB, na pena de 5 (cinco) anos de prisão.

  3. Condenar o arguido AA da prática, em autoria material, de um crime de violação do segredo de justiça, p. e p. pelo art. 371°, n° 1 do Código Penal, na pena de um ano e dois meses dc prisão.

  4. Condenar o arguido AA da prática, em autoria material, de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo artigo 256°, n° 1, alínea d) do Código Penal, na pena de um ano e quatro meses de prisão.

  5. Apreciando em conjunto os factos e a personalidade do arguido, nos termos do artº 77º do CP, condenar o arguido AA na pena única de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de prisão.

    (…) Condenar o arguido AA na pena acessória de proibição de exercício da função por um período de cinco anos, nos termos do art0 66° do CP.

    (…) O arguido AA continua a aguardar os ulteriores termos do processo sujeito à medida de coacção de proibição de se ausentar do País (artº 200º do CPP) e TIR (196° do CPP). (..)” E. O Tribunal da Relação de Lisboa por acórdão de 24.11.2021 confirmou o acórdão de 07.12.2018 proferido em 1ª instância.

    1. Pelo Tribunal Constitucional não foi admitido o recurso interposto pelo Requerente em 06.12.2021 do acórdão de 24.11.2021 do Tribunal da Relação de Lisboa.

    2. Pelo Tribunal da Relação de Lisboa foi indeferida invocada nulidade do julgamento em 1ª instância e de todos os actos posteriores face à entrada em vigor da Lei nº 94/2021...

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