Acórdão nº 16462/21.0T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelDOMINGOS JOSÉ DE MORAIS
Data da Resolução07 de Julho de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 16462/21.0T8LSB.L1 Recurso de revista Relator: Conselheiro Domingos Morais Adjuntos: Conselheiro Mário Belo Morgado Conselheiro Júlio Gomes Acordam os Juízes na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça I.

– Relatório AA intentou acção emergente de contrato individual de trabalho com processo declarativo comum, contra Liscont – Operadores de Contentores, S.A.

, pedindo: deve a presente acção ser julgada provada e procedente e, por via disso, ser condenada a pagar ao autor a quantia de € 375.334,19 (trezentos e setenta e cinco mil trezentos e trinta e quatro euros e dezanove cêntimos), acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento, devendo o referido montante ser pago nos exactos termos em quer seria caso o autor estivesse ainda ao serviço da ré, ou seja, com retenção na fonte e pagamento por parte da ré da inerente contribuição à Segurança Social de 23%.

2.

- A Ré contestou, pedindo a absolvição do pedido formulado pelo Autor.

3.

- Na 1.ª instância foi julgada a ação parcialmente procedente e a Ré condenada a: “(P)agar ao A.: a) as diferenças salariais na retribuição de férias e no subsídio de férias e no subsidio natal até 2008 resultantes da inclusão na mesma dos valores médios por ele recebido a título de trabalho suplementar que à data da presente ação ascendem a €320.830,17; b) O descanso compensatório que não atribuiu ao A. no valor de €48.621,68.

Às quantias supra mencionadas são devidos juros de mora desde a citação até integral pagamento.”.

4.

– A Ré apelou e o Tribunal da Relação acordou: “5.1. Alterar oficiosamente o ponto 61. da decisão de facto nos termos sobreditos; 5.2 conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, alterar a douta sentença recorrida, ficando a R. Liscont Operadores de Contentores, SA. condenada a pagar ao A. AA: a) a quantia a apurar em liquidação de sentença correspondente às diferenças resultantes da inclusão dos valores médios recebidos pelo A. a título de trabalho suplementar nos anos de 1994 a 2008 e 2015 a 2018, na retribuição de férias e dos subsídios de férias vencidas no dia um de Janeiro de cada ano imediatamente subsequente aos identificados anos; b) A quantia a apurar em liquidação de sentença correspondente às diferenças salariais nos subsídios de Natal vencidos nos dias 15 de dezembro dos anos de 1994 a 2008, inclusive, resultantes da inclusão nos mesmos dos valores médios por ele recebidos a título de trabalho suplementar nesses anos.

No mais pedido que não se mostra como contemplado na condenação constante do presente acórdão vai a R. recorrente absolvida.” 5.

– A Ré interpôs recurso de revista, concluindo, em síntese: - A pretensão do A. foi acolhida em sede de primeira instância, com o fundamento de as cláusulas das Convenções Colectivas de Trabalho constituírem tratamento mais desfavorável ao trabalhador e assim, conjugadas com o Código do Trabalho, ter o trabalhador direito a ver integrado na sua remuneração de férias, subsídio de férias e de Natal, a média anual do trabalho suplementar entre os anos de 1994 a 2019.

- O douto Acórdão ora recorrido, e ao contrário da sentença proferida em sede de primeira instância, interpretou corretamente o que está em causa nos presentes autos, e transcreve-se: “Não cremos que a questão deva perspetivar-se ao nível do princípio da irredutibilidade da retribuição – atualmente previsto no artigo 129.º, n.º 1, alínea d) do Código do Trabalho – pois que não se trata de saber se, a partir de determinado momento, a retribuição paga a título de trabalho suplementar pode, ou não, ser reduzida.” - Os factos em discussão nos presentes autos reportam-se a um período temporal com início de produção de efeitos em 1994, pelo que há que ter em conta o Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, o Código do Trabalho aprovado pela Lei 99/2003, de 27/08, até 16 de Fevereiro de 2009, e, a partir desta data, o Código do Trabalho aprovado pela Lei 7/2009, de 12/02.

- O contrato de trabalho com o Autor estava abrangido pelo Contrato Colectivo de Trabalho celebrado entre a AOPL – Associação de Operadores do Porto de Lisboa e outra, e o Sindicato dos Conferentes de Cargas Marítimas de Importação e Exportação dos Distritos de Lisboa e Setúbal e outros, publicado no BTE nº 6, de 15-02-1994, cuja caducidade ocorreu em Novembro de 2014; e pelo Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a AOPL – Associação de Operadores do Porto de Lisboa e outras e o Sindicato dos Estivadores, Trabalhadores do Tráfego e Conferentes Marítimos do Centro e Sul de Portugal, publicado no BTE nº 37, de 08-01-2016.

- Sendo a recorrente uma operadora portuária, a quem se aplica igualmente o Regime Jurídico do Trabalho Portuário, aprovado pelo Decreto-Lei 280/93 de 13 de Agosto, qualquer análise sobre matérias relativas a trabalho portuário não pode deixar de considerar e atentar às especificidades deste setor de atividade e respetivo regime legal.

- Estabelecia o nº 3 da cláusula 39ª do CCT publicado em 15/2/1994: “Em face das especificidades do trabalho portuário e da organização do trabalho vigente, o regime do trabalho suplementar é o previsto neste CCT, não tendo aplicação o disposto na lei geral a este respeito”.

- Nos termos do nº 8 da cláusula 40ª daquele mesmo CCT: “Em caso algum a prestação de trabalho suplementar pode justificar a exigência de qualquer compensação ou retribuição adicional em relação ao previsto neste contrato”.

- No que respeita aos pedidos em apreciação nos presentes autos, estabelecia a cláusula 47.ª que o trabalhador tinha direito à actualização salarial do ano a que se vence o direito a férias e a receber a retribuição.

- No que respeita ao subsídio de férias, estabelecia a cláusula 62ª daquele mesmo CCT: “Os trabalhadores têm direito anualmente a um subsídio de férias correspondente à retribuição do respectivo período”.

- A cláusula 133ª desta CCT referia que as partes aceitavam o carácter de maior favorabilidade daquela Convenção Colectiva.

- No CCT publicado em 8/10/2016, pode-se ler no nº 8 da cláusula 29ª: “A prestação de trabalho suplementar será paga nos termos exclusivamente previstos neste CCT”.

- Na cláusula 29.º, n.º 9, pode-se também ler: “Só serão contabilizados como tempo de trabalho suplementar os períodos que tenham efetivamente sido prestados como tal pelos trabalhadores”.

- O que interessa para a boa decisão da causa é saber se os Contratos Coletivos podem definir o método de apuramento da remuneração de férias e dos subsídios de férias e de Natal (de forma eventualmente diferente da prevista na lei geral), sendo que, e como bem decidiu o Acórdão ora recorrido, pouco importa a natureza das diferentes verbas que integram ou não o conceito de retribuição certa.

- O douto Tribunal da Relação de Lisboa, no que se refere ao pagamento das médias do trabalho suplementar na retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal, considerou que apenas assiste razão à Recorrente, no sentido das aludidas médias não serem devidas, no período que medeia entre a entrada em vigor do Código de Trabalho de 2009 e a caducidade da CCT celebrada em 1994, que ocorreu em novembro de 2014.

- No que respeita ao período anterior à entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, entendeu o douto Tribunal da Relação de Lisboa não assistir razão à ora recorrente em virtude do estabelecido naquelas cláusulas, violar lei imperativa e constituir tratamento mais desfavorável para o trabalhador.

- O regime da Lei do contrato de trabalho, no que concerne às questões em discussão nos presentes autos, tem de ser complementada pela Lei do Trabalho Suplementar aprovada pelo Decreto-Lei 421/83 de 2 de Dezembro, pela Lei das Férias, Feriados e Faltas, aprovada pelo Decreto-Lei 874/76 de 28 de Dezembro, pela Lei do Subsídio de Natal aprovada pelo Decreto-Lei 88/96 de 3 de Julho e pela Lei dos Instrumentos de Regulamentação Coletiva de Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei 519-C1/79, de 29 de Dezembro.

- No trabalho portuário, atentas as especificidades da laboração, estabeleceu-se um regime especial de prestação de trabalho suplementar.

- Este regime de trabalho suplementar, pressupunha várias adaptações regulamentares, que as CCT aplicáveis consagraram, nomeadamente no que respeita à não integração do valor pago a título de trabalho suplementar na retribuição de férias, no subsídio de férias e no subsídio de Natal.

- Importa assim aferir se as regras dos IRCT aplicáveis, constituíam ou não uma violação do princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador.

- No entender da recorrente o regime especial das CCT deve prevalecer sobre as regras gerais, ao artigo da permissão expressa constante do artigo 6º do diploma de aprovação da LCT, então vigente.

- E também de acordo com a entrada em vigor do Regime Jurídico do Trabalho Portuário, em 13 de Agosto de 1993, que despoletou a celebração da CCT de 1994.

- Conforme resulta provado nos presentes autos, o valor pago pela recorrente aos trabalhadores não atende ao número de horas efetivas de prestação desse trabalho, mas sim ao pagamento de um turno inteiro de oito horas, independentemente do trabalhador ter prestado trabalho suplementar em apenas parte desse turno.

- O que leva a que os trabalhadores, aufiram mensalmente a título de trabalho suplementar, valores muito superiores quando comparados ao da sua retribuição pelo trabalho prestado em horário normal.

- Entende a recorrente que nada tem a pagar de médias de trabalho suplementar na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, nos anos de 1994 até à entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003.

- Como também entende a ora recorrente, nada dever ao recorrido a tais títulos no período compreendido entre a entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003 até à entrada em vigor do Código do Trabalho de 2009, e após a caducidade do IRCT de 1994 conforme decidido pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.

- Não foi devidamente apreciado na...

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