Acórdão nº 1715/18.2T8STR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA TRIGO
Data da Resolução06 de Julho de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1. AA e mulher BB intentaram a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra Banco BIC Português, S.A.

alegando, em síntese, o seguinte: - Em 10 de Novembro de 2008, os AA. celebraram, com o Banco Português de Negócios, S.A., adquirido por fusão por incorporação pelo R. Banco BIC Português, S.A., um contrato de intermediação financeira que não foi reduzido a escrito; - Os AA. aceitaram investir a quantia de €50.000,00 em obrigações “SLN 2006”, tendo-lhes o gerente do balcão do Banco Português de Negócios, S.A. asseverado que se tratava de uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido pelo Banco e com rentabilidade assegurada, circunstâncias que se mostraram determinantes na sua decisão de contratarem; - Nunca lhes foi explicado o conteúdo de qualquer contrato, não lhes tendo sido entregues cópias do mesmo que contivessem cláusulas sobre obrigações subordinadas SLN ou que contivessem prazos de resolução unilateral; - Em Novembro de 2015, o Banco deixou de pagar juros e, em Maio de 2016, não restituiu aos AA. o capital investido na referida obrigação subordinada, situação que lhes causou também danos não patrimoniais.

Concluem os autores, pedindo:

  1. Que seja declarado nulo, por falta de forma, o contrato de intermediação financeira celebrado entre os AA. e o Banco R., e, em consequência, seja reposta a situação anterior, condenando-se o Banco R. a restituir o montante de €50.000,00 aos AA., que indevidamente foram aplicados em obrigações SLN 2006, acrescido dos juros de mora até efectivo pagamento; b) A título subsidiário, que seja o R. condenado a pagar aos AA. o capital e os juros vencidos e garantidos, que, à data, perfazem a quantia de €57.000,00, bem como os juros vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento; c) A título subsidiário, que seja declarado nulo qualquer eventual contrato de adesão que o R. invoque para ter aplicado os €50.000,00 que os AA. entregaram ao R. em obrigações subordinadas SLN 2006; d) Que seja declarada ineficaz em relação aos AA. a aplicação que o R. tenha feito desses montantes; e) Que se condene o R. a restituir aos AA. €57.000,00, que ainda não receberam dos montantes que entregaram ao R. e de juros vencidos à taxa contratada, acrescidos de juros legais vincendos, desde a data da citação até efectivo e integral cumprimento; f) Que o R. seja condenado a pagar aos AA. a quantia de €3.000,00, a título de dano não patrimonial.

    O R. apresentou contestação, deduzindo excepção dilatória de incompetência relativa em razão do território, que foi julgada improcedente, e excepção peremptória de prescrição do direito invocado; e impugnou a matéria alegada pelos AA., declinando a sua responsabilidade.

    1. Foi proferida sentença com a seguinte decisão: «Em face ao exposto, julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência: i. Condeno o réu pagar ao autor a quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros), acrescida de juros moratórios, à taxa legal, atualmente de 4% (artigo 806.°/2 do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril de 2003), vencidos desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento; ii. Absolvo o réu do demais peticionado.».

    2. Inconformado, interpôs o R. recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, pedindo a alteração da decisão relativa à matéria de facto e a reapreciação da decisão de direito. Veio a ser proferido acórdão que julgou o recurso improcedente mantendo a decisão recorrida.

    3. Veio o R. interpor recurso de revista, por via excepcional, o qual foi admitido por acórdão da Formação prevista no n.º 3 do art. 672.º do Código de Processo Civil.

    4. Por despacho da relatora de 06.01.2020, foi, além do mais, exarado o seguinte: «Verifica-se que a decisão de condenação vem fundada na responsabilidade civil do R. enquanto intermediário financeiro e que as questões objecto do recurso respeitam ao alegado preenchimento dos pressupostos dessa responsabilidade, em particular ao pressuposto da ilicitude e ao pressuposto do nexo de causalidade.

      Ora, considerando que: (i) Por decisão de 29 de Março de 2019, proferida neste Supremo Tribunal no Processo nº 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, foi admitido recurso para uniformização de jurisprudência sobre a questão da densificação do pressuposto da ilicitude por violação dos deveres de informação por parte de banco que actua como intermediário financeiro e sobre a questão da aferição do nexo de causalidade entre a conduta do intermediário financeiro e o dano sofrido pelos autores; (ii) Por decisão de 2 de Abril de 2019, proferida neste Supremo Tribunal no Processo nº 6295/16.0T8LSB.L1.S1-A, foi admitido recurso para uniformização de jurisprudência sobre a questão da aferição do nexo de causalidade entre a conduta do intermediário financeiro e o dano sofrido pelos autores; (iii) Por decisão de 7 de Maio de 2019, proferida neste Supremo Tribunal no Processo nº 2406/16.4T8LRA.C2.S1-A, foi admitido recurso para uniformização de jurisprudência sobre a questão da densificação do pressuposto da ilicitude por violação dos deveres de informação por parte de banco que actua como intermediário financeiro e sobre a questão da aferição do nexo de causalidade entre a conduta do intermediário financeiro e o dano sofrido pelos autores; (iv) Por decisão de 30 de Julho de 2019, proferida neste Supremo Tribunal no Processo nº 2547/16.8T8LRA.C2.S1, foi admitido recurso para uniformização de jurisprudência sobre a questão da densificação do pressuposto da ilicitude por violação dos deveres de informação por parte de banco que actua como intermediário financeiro, sobre a questão da aferição do nexo de causalidade entre a conduta do intermediário financeiro e o dano sofrido pelos autores e ainda sobre o pressuposto do dano indemnizável; Entende-se que a apreciação do objecto do presente recurso está dependente da decisão ou decisões que o Pleno das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça vier a proferir nos supra indicados recursos extraordinários para uniformização de jurisprudência pelo que, nos termos do art. 272º, nº 1, do Código de Processo Civil, se suspende a instância até que tais recursos sejam julgados.».

    5. Entretanto, no Processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, foi proferido Acórdão de Uniformização de Jurisprudência, transitado em julgado em 19.09.2022, e publicado no Diário da República, Iª Série, de 03.11.2022, pelo qual se uniformizou jurisprudência nos seguintes termos: «1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.º, nº 1, 312º nº 1, alínea a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, e 342.º, nº 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.

    6. Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”), sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º1, do CVM.

    7. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

    8. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir.».

      [negritos nossos] 7.

      Em 20.10.2022, foi proferido despacho da relatora, no qual, para o que ora importa, se exarou o seguinte: «2. A decisão uniformizadora supra transcrita reporta-se, como expresso no respectivo n.º 1, ao Código dos Valores Mobiliários, na redacção anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro.

      Ora, nos presentes autos, a subscrição do produto financeiro pela autora teve lugar no ano 2008, em data posterior, portanto, à data da entrada em vigor (1 de Novembro de 2007) da reforma do Código dos Valores Mobiliários realizada pelo referido Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro, conforme previsto no art. 21.º deste diploma legal. Razão pela qual o AUJ proferido no Processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A não permite, por si só, resolver as questões objecto do recurso de revista dos presentes autos.

      Verificando-se que, nos autos do Processo n.º 6295/16.0T8LSB.L1.S1-A, os produtos financeiros em causa foram, em parte, subscritos no ano 2008, após ter entrado em vigor a referida reforma do Código de Valores Mobiliários, a apreciação do objecto do presente recurso de revista está dependente da decisão que o Pleno das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça vier a proferir no recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência admitido em tal Processo.

    9. Pelo exposto, ao abrigo do disposto no art. 272º, nº 1, do Código de Processo Civil, mantém-se a suspensão da instância até que o recurso para uniformização de jurisprudência admitido nos autos do Processo n.º 6295/16.0T8LSB.L1.S1-A seja julgado.».

    10. No Processo n.º 6295/16.0T8LSB.L1.S1-A foi recentemente proferido Acórdão do Pleno das Secções Cíveis deste Supremo Tribunal, que transitou em julgado em 01.06.2023, e pelo qual se decidiu: «Termos em que, confirmando o teor da decisão singular do Juiz Conselheiro relator proferida em 2 de janeiro de 2023, decidem em conferência, ao abrigo do...

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