Acórdão nº 233/22.9GARSD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Junho de 2023

Magistrado ResponsávelHELENA BOLIEIRO
Data da Resolução29 de Junho de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: … Realizada a audiência de julgamento, … a 1.ª instância proferiu sentença em que decidiu: A. CONDENAR o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de desobediência, previsto e punido pelos artigos 348.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, e 152.º, n.º 1, alínea a), e 3, do Código da Estrada, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de 5,50€ …; B. CONDENAR o arguido AA na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de qualquer categoria pelo período de 4 (quatro) meses, nos termos do disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal; 2.

Inconformado, o arguido … veio interpor recurso da sentença, tendo no termo da respectiva motivação formulado as seguintes conclusões (transcrição): “… e) O recorrente pretende ver dado como provado que o arguido pretendeu efectuar o teste de pesquisa de álcool no sangue por ar expirado no aparelho que saísse um talão/comprovativo, pretendendo com tanto significar que queria ser submetido ao teste em aparelho quantitativo.

f) Tal matéria de facto surge inequívoca, quer do depoimento de todas as testemunhas que se achavam presentes no local no momento da “acção de fiscalização”, sejam da douta acusação pública, sejam as indicadas pelo próprio arguido.

… k) O arguido, no acto fiscalizador, referiu espontaneamente ao agente da GNR que havia ingerido bebidas alcoólicas antes de iniciar a condução da viatura identificada nos presentes autos, manifestando-se, assim, absolutamente desnecessário e dispensável ser submetido ao teste qualitativo, cuja única função é indiciar a presença de álcool no sangue.

… o) O legislador nunca condicionou a realização do teste quantitativo à prévia submissão dos condutores ao teste qualitativo, não tendo seguido, neste particular, o critério utilizado para a análise ao sangue.

… q) O Tribunal entendeu, em critério que o arguido não aceita nem compreende, que, no método de fiscalização, se está perante actividade vinculada, que estipula a necessidade de submissão a teste qualitativo para depois ser submetido a teste quantitativo.

r) Se é certo que o artigo 2º do citado regulamento nos oferece um método de fiscalização, não resulta da mesma norma que a submissão ao teste quantitativo está dependente ou condicionado à prévia submissão ao qualitativo.

s) Daí que se entenda que o arguido não incorreu no cometimento do crime imputado e pelo qual foi condenado.

…”.

  1. Admitido o recurso, o Ministério Público veio apresentar resposta em que pugna pelo seu não provimento … 4.

    Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que alude o artigo 416.º do Código de Processo Penal (doravante CPP), emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso … 5.

    Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do CPP, não foi apresentada qualquer resposta.

  2. Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos, foram os autos à conferência.

    Cumpre agora decidir.

    * II – Fundamentação 1.

    …[1] …[2].

    Atentas as conclusões apresentadas, que traduzem de forma condensada as razões de divergência do recorrente com a decisão impugnada, são as seguintes as questões suscitadas no recurso: - A incorrecta decisão proferida sobre a matéria de facto provada, a consequente modificação da decisão e necessária absolvição do arguido AA quanto ao imputado crime de desobediência.

    - Não preenchimento de todos os pressupostos do imputado crime de desobediência.

    * 2.

    A sentença recorrida.

    2.1.

    Na sentença proferida pelo tribunal a quo foram dados como provados os seguintes factos (transcrição): “Da acusação: 1.

    No dia 01.11.2022, pelas 02h25, o arguido conduzia o veículo ligeiro de mercadorias, com a matrícula RC-..-.., na Avenida ..., em ....

  3. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido foi interceptado por militares da GNR, que se encontravam uniformizados e no exercício de funções.

  4. Aquando de tal abordagem policial foi solicitado ao arguido que se submetesse ao teste qualitativo de pesquisa de álcool no ar expirado, ao que este recusou.

  5. Perante tal recusa, os militares da GNR advertiram o arguido que se mantivesse tal recusa cometia um crime de desobediência.

  6. Não obstante ter ficado ciente das consequências, o arguido manteve a recusa em efectuar o mencionado teste.

  7. O arguido agiu de forma livre e com o propósito concretizado de desobedecer a ordem de paragem emanada pela autoridade policial, bem sabendo que, enquanto condutor de veículo na via pública, sobre si impendia o dever de efectuar o teste supra descrito.

  8. O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

    Mais se provou: …”.

    2.2.

    … 2.3.

    A sentença recorrida apresenta a seguinte motivação da decisão sobre a matéria de facto (transcrição): “… No que concerne às circunstâncias de tempo, lugar e presença de uns e outros, que o arguido se encontrava a conduzir o veículo em causa, na via pública, quando lhe foi dada ordem de paragem pela patrulha da GNR e ordenada a realização do teste de pesquisa de álcool no sangue por ar expirado, tal foi confirmado pelo arguido, além de ter sido referido, de forma coincidente, pelas testemunhas inquiridas (com excepção da testemunha BB, que apenas compareceu no local posteriormente ao sucedido).

    Mais resultou claro que o arguido percebeu perfeitamente a ordem que lhe estava a ser dada e se recusou a efectuar o teste de pesquisa de álcool no sangue por ar expirado nos termos ordenados, procurando, com a versão que apresentou em audiência, justificar essa sua actuação.

    … Tal actuação reflecte que sabia perfeitamente que o teste que lhe estava a ser solicitado efectuar era o teste no aparelho qualitativo, em que não sai qualquer talão - conhecimento que se mostra reforçado pelo facto de, conforme referiu, já ter sido fiscalizado, pelo menos, 3/4 vezes, em aparelho que não emitiu qualquer talão -, pelo que, pretendendo realizar o teste no outro aparelho em que sai o comprovativo/ticket, estava, naturalmente, a recusar-se a cumprir com o ordenado pela autoridade policial, sem qualquer motivo justificativo – dado que as alegadas outras fiscalizações que refere que lhe foram efectuadas nada têm a ver com esta e das quais não teve, segundo diz, qualquer consequência, pelo que se pressupõe que tudo decorreu dentro da normalidade.

    … Neste particular, esta testemunha referiu ainda que o arguido foi devidamente esclarecido dos procedimentos e trâmites legais (que, em primeiro lugar, tinha que realizar o teste em aparelho qualitativo e apenas, posteriormente, o teste em aparelho quantitativo, ao que o arguido manteve a recusa), relatando o ocorrido de forma espontânea, sem que, do seu depoimento, se denotasse qualquer intenção em prejudicar o arguido (tanto mais que, nesta parte, tal depoimento corroborou parte das declarações do arguido) ou procurar omitir quaisquer pormenores do sucedido.

    … Sempre se dirá que, mesmo que o arguido pudesse estar convencido que se poderia recusar a fazer o teste em aparelho qualitativo por pretender fazer o teste em aparelho quantitativo (que emite o respectivo talão) e, assim, escolher a forma de efectuar o teste de pesquisa de álcool no sangue, tal convencimento sempre teria que cessar com a advertência que lhe foi efectuada de cometimento do crime de desobediência.

    …”.

    * 3.

    Apreciando.

    3.1.

    Alega-se no recurso que o tribunal a quo fixou de forma insuficiente parte da factualidade relevante, pois devia ter dado como provado que o arguido AA pretendeu efectuar o teste de pesquisa de álcool no sangue por ar expirado no aparelho em que saísse um talão/comprovativo, pretendendo com isso significar que queria ser submetido ao teste em aparelho quantitativo.

    … O que...

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