Acórdão nº 036/21.8BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelARAGÃO SEIA
Data da Resolução24 de Maio de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A..., SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA., com o número único de matrícula e de identificação fiscal ...00, com sede na Rua ..., ... Lisboa, Requerente no processo arbitral n.º 827/2019-T, que correu seus termos junto do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), vem, nos termos e para os efeitos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 25.º(1) do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro e, bem assim, nos termos do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), com as devidas adaptações à luz das especificidades do processo arbitral, interpor recurso para o Supremo Tribunal Administrativo com fundamento na oposição entre a decisão arbitral proferida nos autos acima identificados e a decisão arbitral proferida no processo n.º 680/2016-T do mesmo CAAD.

Alegou, tendo concluído: (a) O presente recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, admissível à luz do n.º 2 do artigo 25.º do RJAT, é interposto, simultaneamente, com a impugnação da mesma decisão junto do Tribunal Central Administrativo Sul (admissível à luz do artigo 27.º do RJAT), por estarem em causa dois meios impugnatórios distintos cuja cumulação, no seio do mesmo expediente processual, é impossível, sendo admissível, porém, a sua interposição simultânea de acordo com a jurisprudência lavrada por este Supremo Tribunal Administrativo.

(b) O presente recurso tem por objeto o acórdão arbitral proferido em 03.02.2021, no âmbito do processo n.º 827/2019-T, no qual a aqui Recorrente peticionou a anulação da liquidação adicional de IRC n.º ...31 e demonstração de acerto de contas n.º ...26, referentes ao exercício de 2015 e, bem assim, da liquidação adicional de IRC n.º ...45 e demonstração de acerto de contas n.º ...48, referentes ao exercício de 2016, tendo o seu pedido arbitral sido julgado improcedente, pugnando o tribunal arbitral pela manutenção das liquidações em causa.

(c) Discutia-se, no referido processo arbitral, a dedutibilidade dos encargos financeiros contraídos pela Recorrente através de dois financiamentos obtidos com a finalidade de adquirir 70% do capital social da B... respeitantes aos exercícios de 2015 e 2016.

(d) Na decisão recorrida, entendeu o tribunal arbitral que a questão decidenda no processo era precisamente a da verificação, ou não, do preenchimento, por parte dos encargos suportados pela aqui Recorrente, com os financiamentos obtidos para adquirir a referida participação na B... dos requisitos plasmados no n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, designadamente da sua indispensabilidade face ao objeto social da Recorrente, tendo concluído - não obstante a declaração de voto vencido do árbitro ... - que os referidos gastos, objeto do litígio, não se revelam enquadráveis face ao disposto no n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, sufragando uma interpretação do referido preceito legal frontalmente oposta àquela defendida numa outra decisão arbitral, nomeadamente naquela emanada no âmbito do processo n.º 680/2016-T.

(e) Em ambas as decisões arbitrais em antinomia são escrutinados os gastos associados aos dois financiamentos contraídos para aquisição da participação social de 70% da sociedade B... embora um e outro digam respeito a diferentes exercícios: o acórdão impugnado respeita aos encargos referentes a 2015 e 2016, ao passo que o acórdão fundamento se refere aos encargos referentes a 2012.

(f) No acórdão arbitral de 05.09.2017, proferido no processo n.º 680/2016-T, foi discutida a mesma questão fundamental de direito, designadamente a dedutibilidade, para efeitos fiscais, dos encargos financeiros à luz do artigo 23.º do Código do IRC - sendo que a operação em causa, à qual estavam associados os referidos encargos, é exatamente a mesma em causa no acórdão impugnado, apenas diferindo o exercício fiscal a que se referem os mencionados encargos -, tendo o tribunal arbitral pugnado pela aceitação dos gastos, em razão de os financiamentos que os originaram terem sido contraídos no interesse da Recorrente, verificando-se os pressupostos plasmados no n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

(g) Face à decisão do acórdão impugnado - em que o tribunal arbitral pugnou pela não aceitação dos gastos, indeferindo a pretensão da Recorrente - e à decisão do acórdão fundamento – em que o tribunal arbitral pugnou pela aceitação dos gastos, deferindo a pretensão da Recorrente -, observa-se uma patente contradição no que respeita à mesma questão fundamental de direito, i.e., à interpretação e aplicação do referido normativo face à natureza dos gastos em crise.

(h) É, também, visível, não só a identidade do quadro regulador aplicável, porquanto a norma jurídica convocada (ou convocável) é a mesma (in casu, a aplicação e interpretação do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC), mas também a identidade das situações fáticas, porquanto em causa está a mesma operação, realizada pela mesma entidade - a ora Recorrente.

(i) O acórdão impugnado colide, ainda, com o acórdão arbitral proferido em 23.05.2016, no âmbito do processo n.º 614/2015-T - em que está em causa a mesma questão fundamental de facto -, tanto no que respeita à indagação da (in)dispensabilidade dos custos associados à operação de financiamento, como, quanto à alegada duplicação de encargos financeiros, pelo que, ainda que a título meramente subsidiário, é também patente e inarredável a desconformidade entre o acórdão impugnado e este último, proferido em 23.05.2016, no âmbito do processo arbitral n.º 614/2015-T.

(j) O tribunal arbitral incorreu, por isso, num flagrante erro judiciário, consubstanciado numa interpretação errónea do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC face ao circunstancialismo em causa no caso vertente, tendo inclusive extravasado o núcleo essencial da questão decidenda, desenvolvido arbitrariamente outro raciocínio, sem que tal tenha sido adequadamente suscitado, semelhante àquele que apenas caberia se se estivesse diante da aplicação da cláusula geral anti-abuso ou das regras relativas aos preços de transferência, não curando de saber, tão-só, se os encargos financeiros foram contraídos / suportados no interesse exclusivo da Recorrente, à luz do seu objeto social.

(k) Deve, pois, o acórdão impugnado ser revogado por este Supremo Tribunal Administrativo, sendo substituído por outro, nos termos legalmente devidos, que atenda à pretensão da Recorrente, porquanto é forçoso concluir pela dedutibilidade, in casu, como se fez no Acórdão fundamento, dos encargos financeiros incorridos pela Recorrente com os financiamentos contraídos para a aquisição de 70% do capital social da B... nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, designadamente por estar verificado o necessário nexo de causalidade entre a operação que a eles deu origem e o objeto social da Recorrente.

Nestes termos, e nos mais de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser dado como procedente, por provado, e em consequência ser anulada a decisão recorrida, por ilegal, e substituída por outra que determine a ilegalidade da decisão perfilhada pelo tribunal arbitral no âmbito do processo n.º 827/2019-T, dando-se provimento ao peticionado pela ora Recorrente, uniformizando-se a Jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo no sentido da decisão fundamento ora invocada, tudo com as legais consequências.

Em virtude de o valor da causa ser superior a € 275.000,00, requer-se a V. Exa. se digne, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, determinar a dispensa de pagamento das custas acima do referido valor.

Contra-alegou a Autoridade Tributária e Aduaneira pugnando pela inexistência de contradição e/ou improcedência: 1) No presente recurso não se verificam os pressupostos, contemplados nos arts. 25º nº2 do RJAT, 152º nº 2 do CPTA e 27º nº 1, al.b) do ETAF, que permitam a apreciação de recurso para uniformização de jurisprudência interposto por A..., SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA.

2) Diga-se, antes de mais, que as conclusões do presente recurso não se adequam ao meio processual utilizado configurando, antes de mais, um mero recurso, em segundo grau de jurisdição, para reapreciação da matéria de facto o que determina, liminarmente, a não admissibilidade do presente recurso.

3) No caso em concreto, a recorrente pretende que o STA proceda a uma reapreciação da matéria de facto, o que está claramente fora do âmbito do presente recurso para uniformização de jurisprudência.

4) Na verdade, os sentidos das decisões, recorrida e fundamento, assentam em diferente valoração da prova produzida nos respetivos processos, no âmbito do exercício do poder de livre apreciação que ao tribunal é conferido (art.607º, nº 5 CCivil), na esteira do Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 27.06.2018, proferido no Recurso n.º 165/18 (Em sentido idêntico se pronunciaram os Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 06.06.2106, recurso 63/16 e de 14.12.2016, recurso 535/16), «as questões de valoração da prova não podem servir de fundamento ao recurso para uniformização de jurisprudência. A oposição entre os arestos situa-se num plano simplesmente de facto (…).Essa discrepância verifica-se em sede de julgamento de facto, pelo que não pode afirmar-se que as decisões em confronto tenham decidido a mesma questão fundamental de direito em sentido divergente, divergência essa que poderia servir de fundamento ao presente recurso para uniformização de jurisprudência.» 5) Assim, a diferente solução a que se chegou nos Acórdão recorrido e fundamento, verifica-se em sede de julgamento da matéria de facto, pelo que, inexiste qualquer oposição sobre a questão fundamental de direito, uma vez que não há qualquer divergência sobre a interpretação da norma em confronto, art. 23º do CIRC.

6) Donde, constata-se que os Acórdãos, recorrido e fundamento, não perfilharam...

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