Acórdão nº 789/22.6GCVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelROSA PINTO
Data da Resolução12 de Abril de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.

A – Relatório … 2.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, a 24.11.2022, decidindo-se: a) Condenar o arguido AA pela prática, nos dias 5/11/2022 e 19/11/2022, de dois crimes de condução de veículo em estado de embriaguez p.p nos termos dos arts. 292º nº 1 e 69º nº 1 al. a), ambos do C.P., nas penas de 80 (oitenta) dias de multa e de 90 (noventa) dias, no quantitativo diário de € 6,00 (seis euros) - em cúmulo jurídico na pena única de 120 (cento e vinte) dias, no quantitativo diário de € 6,00 (seis euros), o que perfaz a quantia de € 720,00 (setecentos e vinte euros), bem como, nos termos do artigo 69.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal, nas penas acessórias de 5 (cinco) meses de proibição de conduzir veículos com motor e 6 (seis) meses de proibição de conduzir veículos com motor - em cúmulo jurídico na pena acessória única de 8 (oito) meses de proibição de conduzir veículos com motor; b) Condenar o arguido no pagamento das custas do processo, que se fixam em 1,5 UC, já reduzida a metade atenta a confissão - artº 8º, nº 5, da Tabela III do Regulamento das Custas Processuais”.

  1. Inconformado com a douta sentença, veio o arguido interpor recurso da mesma, terminando a motivação com as seguintes conclusões: … II. A sentença recorrida violou entre outros os art.40 n.º 2, 69º, 71º, 77º, nº1, e 292º, todos do Código Penal e art.374º, nº2, do Código Processo Penal.

    … IX. No caso concreto, as exigências de prevenção especial são reduzidas, pois, como provado, o arguido confessou integralmente e sem reservas todos os factos, revelou consciência critica em relação aos mesmos, desde o primeiro momento colaborou com as autoridades e a descoberta da verdade, mostrando arrependimento.

    X. Tanto mais que o arguido não tem antecedentes criminais e encontra-se social, familiar e profissionalmente inserido.

    XI. Por essa exata razão, o Tribunal a quo considerou que a pena não detentiva prevista na lei, é a mais adequada à situação em apreço, satisfazendo as necessidades de prevenção especial, aqui mínimas, tendo em consideração, na escolha da pena principal, precisamente aquelas circunstâncias atenuantes.

    XII. Também a culpa do arguido revelada nos factos se mostra reduzida em qualquer dos crimes, pois não sendo elevada a taxa de álcool apresentada em qualquer das situações, certo é que nenhum acidente, risco concreto acrescido, perigo concreto ou resultado danoso emergiu da sua conduta.

    XIII. O arguido não pode ser duplamente penalizado por força da mesma circunstância geral agravante traduzidas nas exigências de prevenção geral e perigosidade abstrata da conduta refletida na moldura legal da punição.

    … XVI. As penas concretamente aplicadas ao arguido situam-se bem acima de metade da moldura prevista.

    XVII. O que poderia indiciar um elevado grau de culpa e necessidade de prevenção especial, que, salvo o devido respeito, não se comprovou, não bastando atentar apenas na taxa de álcool apresentada.

    XVIII. Não foram provados factos que elevem as necessidades de prevenção especial ou reforcem a culpabilidade do arguido, de forma a justificar a punição dos factos com 80 dias e 90 dias de multa.

    XIX. No caso concreto as exigências de prevenção especial e culpa do arguido são diminutas, pelo que deveria o arguido ter sido condenado numa multa próxima do seu limite mínimo, entendendo-se como justa e adequada a pena de 40 dias de multa para ambos os crimes, atenta a gravidade similar das condutas.

    … XXII. Ao arguido foram impostas as penas de proibição de conduzir de 5 (cinco) meses e 6 (seis) meses, sendo que o mínimo previsto na lei é de três meses – cfr. artigo 69º, nº1, al. a) do Código Penal.

    XXIII. É um facto que as exigências de prevenção geral são prementes, mas também aqui a moldura abstrata da pena acessória, com o limite mínimo de três meses, cumpre com o desiderato de dar satisfação a essa premência, não podendo o arguido ser duplamente sancionado por essa circunstância.

    XXIV. Valendo aqui as considerações supra sobre as concretas circunstâncias atenuantes que relevam na determinação da pena concreta de multa, as quais se dão como reproduzidas, as exigências de prevenção especial e a culpa do arguido são reduzidas.

    XXV. Atento o grau de ilicitude dos factos e as referidas exigências de prevenção, sem descurar a culpa do arguido neles revelada, a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 3 meses, é adequada e suficiente para fazer interiorizar a necessidade de conformação da conduta posterior do arguido à vigência da norma e servirá, certamente, como efeito redentor da conduta assumida, capacitando o arguido da necessidade de refrear qualquer impulso de ingestão de bebidas alcoólicas sempre que tenha que conduzir.

    … XXVII. As penas acessórias aplicadas não são congruentes com os critérios previstos nos arts. 40º e 71º do Código Penal, não exigindo a situação concreta uma pena superior ao limite mínimo da moldura correspondente, dada a concreta repercussão que no caso representa no comportamento pessoal e profissional do arguido.

    XXVIII. Em cúmulo jurídico de qualquer das referidas penas parcelares o arguido foi condenado na pena única de 120 (cento e vinte) dias de multa e na pena acessória única de 8 (oito) meses de proibição de conduzir veículos com motor.

    XXIX. Contudo, quanto à determinação das penas únicas de multa e acessória de proibição de conduzir, a sentença encontra-se ferida de nulidade, por falta de fundamentação, nos termos do art.374º, nº2, ex vi art. 379º, nº1, al. a), ambos do Código Processo Penal, nulidade que se invoca.

    … XXXIII. Ora, a sentença recorrida, na determinação da pena única de multa e da pena única acessória, não espelha essa visão de conjunto, a totalidade dos factos como se de um facto global se tratasse, para assim avaliar a gravidade do ilícito global, por referência à personalidade do agente.

    XXXIV. Nenhuma referência é feita ao circunstanciado conjunto dos factos com vista a percecionar a ligação ou tipo de conexão que intercede entre eles, encarados numa perspetiva global, e a sua relação com a personalidade do arguido, cujas características, nomeadamente ao tempo da prática dos mesmos, a motivação da sua actuação delituosa e bem assim a inserção familiar, social e profissional que deverá emergir dos factos provados.

    … XXXVIII. Sendo assim, não é necessário, adequado nem proporcional atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta, tanto mais que no caso o arguido, delinquente primário, cometeu apenas dois crimes, com a mesma natureza, em datas temporalmente muito próximas.

    … 4.

    O Ministério Público respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pela sua improcedência e manutenção integral da sentença recorrida … 5.

    … a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu Parecer no sentido do não provimento do mesmo e da manutenção da sentença recorrida, aderindo à resposta do Ministério Público junto da 1ª instância … 6.

    Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, não tendo o arguido respondido ao douto parecer.

  2. Respeitando as formalidades aplicáveis, após o exame preliminar e depois de colhidos os vistos, o processo foi à conferência.

  3. Dos trabalhos desta resultou a presente apreciação e decisão.

    * B - Fundamentação 1. O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, face ao disposto no artigo 412º, nº 1, do Código de Processo Penal … 2. No caso dos autos, face às conclusões da motivação apresentadas pelo arguido, as questões a decidir são as seguintes: - se, no que respeita à determinação das penas únicas de multa e inibição de conduzir, a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação; - se as penas parcelares de 80 dias de multa e de 90 dias de multa, bem como as penas acessórias de 5 e 6 meses de proibição de conduzir veículos com motor, são excessivas, desnecessárias e desadequadas; - se a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 40º, nº 2, 69º, 71º, 77º, nº1, e 292º, todos do Código Penal e artigo 374º, nº2, do Código Processo Penal.

  4. Para decidir das questões supra enunciadas, esta Relação ouviu a sentença proferida oralmente em sede de audiência de julgamento.

    Vejamos então a factualidade da sentença recorrida.

    O tribunal a quo deu como provados os seguintes factos: 1. No dia 5.11.2022, pelas 4h20m, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros, da marca ...”, com a matrícula ..-..-KD, na via pública, concretamente na Rotunda ..., em ..., após ter ingerido bebidas alcoólicas, apresentando uma taxa de álcool no sangue (TAS) de, pelo menos, 1,568g/l, correspondente a uma TAS registada de 1,65 g/l, deduzido o valor do erro máximo admissível.

  5. O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que conduzia o veículo automóvel na via pública com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l devido à ingestão de bebidas alcoólicas.

  6. O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei e que incorria em responsabilidade criminal.

  7. No dia 19 de novembro de 2022, pelas 02h10m, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros, da marca ...”, com a matrícula ..-..-KD, na via pública, concretamente na Avenida ..., em ..., após ter ingerido bebidas alcoólicas, apresentando uma taxa de álcool no sangue (TAS) de, pelo menos, 1,711 g/l, correspondente a uma TAS registada de 1,86 g/l, deduzido o valor do erro máximo admissível.

  8. O arguido sabia que havia ingerido bebidas alcoólicas em momento anterior ao ato de condução, em quantidade que o impedia de conduzir veículos na via pública e, não obstante, quis conduzir o referido veículo, o que efetivamente fez.

  9. O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

  10. O arguido não tem antecedentes criminais.

  11. O arguido beneficiou...

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