Acórdão nº 00230/22.4BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução20 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo: I.RELATÓRIO 1.1.

J..., Lda.

, com NIF ... e sede na Rua ..., ... ..., movem a presente ação de contencioso pré-contratual contra o Município ...

, com NIF ... e sede no Largo ..., ... ..., pedindo a anulação do ato de adjudicação impugnado e que o contrato de prestação de serviços para manutenção dos espaços verdes e do sistema de rega dos espaços públicos da cidade ... lhe seja adjudicado.

Indica como contrainteressadas as seguintes sociedades comerciais: (i)C..., Lda, com sede na Rua ..., ... ...;A..., Lda.

, com sede na Rua ..., ... ...; e (iii) S..., Lda.

, com sede na Rua ..., ..., ... ....

Como fundamento da sua pretensão, alega, em síntese que, a admissão da proposta da «C..., Lda»,é ilegal, devendo a decisão de adjudicação ser anulada, desde logo, porque o objeto social da mesma não é compatível com o objeto do contrato concursado, porquanto aquela empresa não dispõe de qualquer CAE, seja principal ou secundário, que abranja a atividade de manutenção de espaços verdes e sistema de rega dos espaços públicos, devendo ser excluída nos termos do art.º 70º, n.º 2, alíneas f) e g) do CCP; Ademais, a «C..., Lda» não dispõe de formação nem de autorização pela Direção Regional de Agricultura e Pescas (DRAP) para aplicação de produtos fitofarmacêuticos, o que a impede de dar cumprimento à cláusula 4ª, n.º 7 do Caderno de Encargos, apenas tendo juntado como documento de habilitação uma cópia de um documento de habilitação de aplicador sem apresentação de qualquer declaração nos termos do n.º 2 do art.º 2º da Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro, razão pela qual a sua proposta deveria ter sido excluída; Mais alega que, do teor do certificado do registo criminal apresentado pela «C..., Lda» resulta que o seu representante legal foi condenado por vários crimes, designadamente de abuso de confiança fiscal e de descaminho de objetos confiados ao poder público, pelo que deveria ser excluída do concurso nos termos do disposto nos art.

os 55º, n.º 1, alínea b) e 70º, n.º 2, alínea f) do CCP, bem como do art.º 280º do Código Civil e dos art.

os 3º, 4º, 8º e 9º do Código do Procedimento Administrativo (CPA).

Por fim, entende que ocorre um vício de procedimento, consubstanciado na omissão de notificação aos demais concorrentes e de disponibilização na plataforma eletrónica em que tramitou o concurso ora sub specie das comunicações estabelecidas entre o Júri e a «C..., Lda» na fase de audiência prévia e do pedido de esclarecimentos que aquele dirigiu a esta, bem como dos documentos que esta concorrente apresentou como resposta a esse pedido de esclarecimentos.

Com esse comportamento, foram violados “os princípios estabelecidos no artigo 1º-A do CCP”.

Termina, peticionado a procedência da ação.

1.2.

Citado, o R. contestou, defendendo-se por impugnação, alegando em síntese, que não assiste razão à Autora, devendo manter-se o ato de adjudicação por não enfermar de qualquer das invalidades que lhe são assacadas.

Conclui, pugnando pela improcedência da presente ação.

1.3.

Citadas, nenhuma das contrainteressadas contestaram a ação.

1.4.

Dispensou-se a realização de diligências de prova adicionais por se considerar a prova documenta junta aos autos bastante para conhecer do mérito da ação e considerando que a audiência prévia a realizar nos presentes autos apenas teria a finalidade prevista na alínea d) do n.º 1 do art.º 87º-A do CPTA, dispensou-se a sua realização por se revelar desnecessária ao fim do presente processo, à luz do disposto no art.º 87º-B, n.º 1, do mesmo Código, aplicável no domínio do contencioso pré-contratual ex vi art.º 102º, n.º 1 do CPTA. Fixou-se o valor da ação em e EUR 94.890,00 (noventa e quatro mil oitocentos e noventa euros), e proferiu-se despacho saneador tabelar, e não sendo admissíveis alegações nos presentes autos, os autos prosseguiram para imediata prolação de sentença.

1.5.

Em 24/09/2022 o TAF de Aveiro, proferiu decisão que julgou improcedente a ação, constando da mesma o seguinte dispositivo: «Em face de tudo quanto antecede, julgo improcedente a presente ação e, consequentemente, absolvo o R. dos pedidos.

Custas pela A..

Registe e notifique.

» 1.6.

Inconformada com a decisão assim proferida, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, que conclui nos seguintes termos: «i. A Recorrente entende que, salvo o muito e devido respeito, não se decidiu de acordo com a lei, incorrendo claramente em erro de julgamento, como se procurará mostrar.

ii. A douta sentença a quo julgou improcedentes todos os vícios alegados pela Recorrente, subvertendo totalmente, o espírito da Lei e a vontade do legislador.

iii. No caso em questão, o objeto social da contrainteressada é a construção de edifícios e construções diversas, quando o objeto da prestação de serviços concursada, é a atividade de serviços para manutenção dos Espaços verdes e do sistema de rega dos espaços públicos.

iv. Tal questão foi suscitada pela Recorrente em audiência prévia, e só aí, o júri percebeu que a empresa não tinha a qualificação necessária para se apresentar a concurso.

v. A par desta, também não cumpria a exigência prevista na cláusula 4º, ponto 7, no que obrigada o prestador de serviços a dar integral cumprimento à Lei n.º 26/2013, de 11.04..

vi. A pedido do júri, a concorrente «C..., Lda», apresenta pronúncia escrita alegando que alterou o seu objeto social, alteração essa vertida em ata, e juntou uma declaração de frequência em formação de aplicação de produtos fitofarmacêuticos.

vii. O júri, bem assim, a entidade adjudicante, fizeram tábua rasa das regras que impõe a obrigatoriedade de registo do pacto social, e aceitaram como verdadeira, uma ata que a concorrente «C..., Lda» sequer fez prova de ter sido registada, que certamente, não terá sido, uma vez que tal não consta da certidão permanente apresentada no procedimento de concurso.

viii. Devia, pois, a proposta ser excluída, por violação de uma vinculação legal aplicável, a saber, o artigo 70º, n.º 2, alíneas f) e g) do CCP, uma vez que não foi objeto de registo a ata de deliberação da Assembleia Geral, por meio da qual os sócios (alegadamente) terão alterado o objeto social da sociedade, aditando a atividade objeto da prestação de serviços pretendida.

ix. Quanto à certificação exigida para a aplicação de produtos fitofarmacêuticos, e após nova notificação por parte do júri, a concorrente «C..., Lda», já não se escuda com a formação que disse estar a ser feita por si, enquanto sócio-gerente e outro individuo, mas informa que irá subcontratar os serviços.

x. No momento da apresentação dos documentos de habilitação, a referida concorrente envia uma simples cópia de um documento de um cartão de aplicador de produtos fitofarmacêuticos, sem indicação da relação profissional que esta pessoa teria com a empresa.

xi. Pese embora esse facto, atendendo à última informação prestada ao júri, o indivíduo, aplicador certificado, seria um subcontratado da concorrente, pelo que, haveria a obrigação de apresentação da declaração a que se refere o n.º 2, do artigo 2 da Portaria n.º 372/2017, de 2017.

xii. Contrariamente ao que vaticina a douta sentença recorrida, não era à aqui Recorrente a quem competia fazer prova de que o dito aplicador de produtos, era um subcontratado, pois isto seria subverter totalmente os papeis, além de que não é à recorrente a quem compete assegurar o cumprimento da legalidade, e dos princípios da transparência, da concorrência, da seriedade, da tutela da confiança e da boa administração, que são princípios estruturantes e fundamentais da relação jurídica da contratação pública.

xiii. Por outro lado, do registo criminal do representante em exercício de funções, da concorrente «C..., Lda» constam, essencialmente, crime contra o Estado, e colocam em causa a honorabilidade profissional deste (requisito constante da al. b) do n.º 1 do artigo 55º do CCP).

xiv. A douta decisão recorrida entende que o sócio e gerente em funções da concorrente em questão, já se encontra reabilitado por força do decurso do prazo previsto na lei, razão pela qual não está impedido de participar no concurso.

xv. Sucede que, com todo o devido respeito, esta análise não pode ser tão superficial, pois, por maioria de razão, um gerente em exercício de funções, representante de uma concorrente, a quem é adjudicado um contrato público, que haja praticado crimes contra o estado, ainda que haja decorrido o cumprimento das respetivas penas, afeta a sua honorabilidade profissional, o que, por razões éticas na contratação pública e de idoneidade profissional sempre levaria à não adjudicação do contrato.

xvi. Pretende-se que na contratação pública participem apenas concorrentes responsáveis, como forma de proteção da Administração Pública adjudicante.

xvii. Pese embora o Douto Tribunal a quo admita, a douta sentença recorrida, a violação clara do disposto no n.º 5 do artigo 72º do CCP (de acordo com o qual devem todos os concorrentes ser imediatamente notificados dos esclarecimentos disponibilizados na plataforma eletrónica), o facto de ter julgado improcedentes todos os vícios suscitados pela Recorrente, faz com que dê por preenchidos os requisitos constantes das alíneas a) e c) do n.º 5 do artigo 163º do CPA, ou seja, que mesmo sem o vício formal em causa, o ato de adjudicação teria sido praticado com o mesmo conteúdo, uma vez que a concorrente «C..., Lda» apresentou a proposta com o preço mais baixo, único critério de adjudicação adotado pelo Recorrido para o concurso em apreço.

xviii. Sucede que, ao verificar-se a existência dos vícios conforme alegações supra, necessariamente, também terá de se concluir pela existência do vício do procedimento, sendo este invalidante, o que determina a nulidade do ato de adjudicação, com base nas ilegalidades apontadas pela Recorrente.

xix. Em face de todo o supra exposto, os factos aqui alegados, não poderão deixar de ser atendidos...

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